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Introdução

Conforme o testemunho de seus contemporâneos, entre os quais se contam muitos de seus irmãos de ordem, sabemos que um ano antes de sua morte, isto é, desde o Domingo da Sexagésima, 12 de fevereiro de 1273, até o dia da Páscoa, 9. de abril, Santo Tomás se consagrou, com todo o cuidado, à instrução dos fiéis, na igreja conventual de São Domingos, em Nápoles.

Fez ali sermões, sucessivamente sobre o Símbolo dos Apóstolos, a Oração Dominical, a Saudação Angélica, sobre os dois preceitos gerais da caridade e os dez mandamentos da lei.
 
Não se vê, à primeira vista, o que une esses diferentes assuntos, mas o santo Doutor teve o cuidado de mostrá-lo aos seus ouvintes:
 
«Três coisas são necessárias ao homem para a sua salvação. A primeira é o conhecimento daquilo que se deve crer; a segunda, conhecer o que se deve desejar e a terceira, conhecer o que se deve realizar. O homem tem o primeiro desses conhecimentos no Símbolo dos Apóstolos; a Oração Dominical o instrui sobre o que se deve desejar; e os dois preceitos da caridade e os dez mandamentos da lei mostram o que se deve pôr em prática».
 
O conjunto desses sermões constitui uma verdadeira catequese pré-batismal. Padre Toco, dominicano, que assistia às práticas, afirma que cada dia aumentava mais o número de assistentes; a multidão escutava o Bem-aventurado com veneração, como se a palavra viesse diretamente de Deus. Somente o aspecto físico de Santo Tomás, já causava uma impressão profunda. Segundo João Blasio, juiz de Nápoles, Santo Tomás fez os dois sermões sobre a Saudação Angélica, de olhos fechados ou elevados para o céu, o ar extático.
 
Os numerosos ouvintes do santo, nessa quaresma de 1273, pertenciam a todas as classes sociais e Santo Tomás dirigia-se a eles em italiano, não em latim. Os textos latinos que chegaram até nós, não são, pois, textos originais, mas apenas um resumo destes. Não é certo que o Santo os tenha escrito de sua própria mão nem mesmo que ele os tenha revisto. No entanto, todos os autores que falaram sobre esses textos (Mandonnet, Michelitisch, Grabinan, Walz) são unânimes em afirmar sua autenticidade. Todos asseguram que eles exprimem fielmente o pensamento do Santo Doutor.
 
A origem dos textos explica porque algumas vezes são encontradas obscuridades na expressão e porque nem sempre se discerne perfeitamente o elo que une alguns pensamentos. As citações das Sagradas Escrituras são muito numerosas, mas nem sempre a relação das citações com o contexto é muito clara.
 
Para tornar a leitura da tradução mais corrente, não hesitamos em suprimir algumas destas citações, quando a relação destas com o contexto não era perceptível. Pela mesma razão, todas as vezes em que isso pareceu necessário, procuramos exprimir explicitamente o pensamento de Santo Tomás, seja desenvolvendo o que a concisão do texto latino apenas sugeria, seja modificando a ordem material das proposições.
 
É certo que o homem não pode fazer nada maior, nem mais necessário à sua salvação, do que elevar sua alma a Deus para ligá-la a Sua Majestade. Ora, é pela oração que o homem se eleva a Deus e a Ele se une. E quanto mais perfeita for sua oração, maior será sua união com Deus.
 
Mas qual será, no mundo, a oração mais perfeita e mais santificante, senão aquela que o Filho de Deus, Deus Ele mesmo, compôs para nos dar?
 
Sendo assim, é da maior importância compreender bem esta sublime oração, em todos os seus pedidos, para fazê-la inteiramente nossa. Possa a leitura atenta das explicações de Santo Tomás sobre a Oração Dominical ajudar-nos a penetrar melhor no sentido profundo das diferentes partes desta prece divina.
 
Falando sobre a Saudação Angélica, em seu Tratado sobre a verdadeira devoção à Santíssima Virgem, São Luiz-Maria Grignion de Montfort escreve (§ 252, 253):
 
«A Ave-Maria é a mais bela de todas as orações, depois do Pai Nosso: É a saudação mais perfeita, que podeis fazer a Maria, pois é a saudação que o Altíssimo lhe fez por meio de um Arcanjo, para ganhar o coração da Virgem de Nazaré. E tão poderosas foram aquelas palavras, pelo encanto secreto que contêm, que Maria deu seu pleno consentimento para a Encarnação do Verbo, apesar de sua profunda humildade. É por esta saudação que também vós ganhareis infalivelmente seu coração, contanto que a digais como deveis... isto é, com atenção, devoção e modéstia».
 
Poderemos acrescentar: com inteligência, o que nos obriga a um esforço para compreendermos melhor o sentido profundo das palavras que pronunciamos. A leitura das explicações do Doutor Angélico nos ajudará muito nisto.
 
Segundo a opinião mais aceita, atribui-se ao papa Urbano VIII a introdução do nome de Jesus na Saudação Angélica. Este pontífice reinou de 1261 a 1264. Santo Tomás, no entanto, em sua explicação da Ave-Maria, composta em 1273, não faz menção do nome de Jesus. Mas o fez, por diversas vezes, especialmente na Suma Teológica (IIIa, q. 37, a. 2, c.). Parece também não ter conhecido a segunda parte da Ave-Maria, que se foi formando pouco a pouco. No século XII encontra-se um esboço dela, num hino atribuído a Gottschalk, capelão do imperador Henrique IV. No século XV, São Bernardino de
 
Sena conhecia um resumo desta segunda parte: Santa Maria, rogai por nós, pobres pecadores. A fórmula atual foi posta em uso no século XVI; e consagrada oficialmente por sua inserção, no breviário de São Pio V, em 1568.
 
Como muitos escolásticos do século XIII, Santo Tomás pensava, e pensou até o fim de sua vida, que a Santa Virgem tinha contraído o pecado original e que tinha sido purificada por uma graça especial, desde o seio de sua mãe. Ele o diz por duas vezes na explicação da Saudação Angélica (n° 6 e 7). Nestes dois pontos, nossa tradução, propositadamente, não é uma tradução; pois não exprime o sentido do texto latino, mas o que é de fé, para a Santa Igreja e o que hoje contempla o Santo Doutor na visão beatífica, a saber, a Imaculada Conceição da Bem-aventurada Virgem Maria.
 
Um monge de Fontgombault

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