Skip to content

Artigo 3: A consagração à Maria

Em seu Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem, São Luís Grignion de Montfort distingue acertadamente vários graus da verdadeira devoção à Mãe de Deus. Não fala mais que rapidamente, no capítulo III, das formas da falsa devoção, que é totalmente exterior, presunçosa, inconstante, hipócrita ou interesseira; considera principalmente a verdadeira devoção.

Assim como as outras virtudes, essa devoção cresce em nós com a caridade, que constitui primeiro o grau dos iniciantes, depois dos que estão progredindo e, por fim, dos perfeitos. 

O primeiro grau da verdadeira devoção a Maria consiste em rezar-lhe regularmente com recolhimento, dizendo, por exemplo, a oração do Angelus de forma adequada, quando tocar o sino. No segundo grau, se iniciam os sentimentos mais perfeitos de estima, veneração, confiança e amor que levam, por exemplo, a recitar devotamente o Terço ou o Rosário a cada dia. O terceiro grau leva à doação completa à Santíssima Virgem, consagrando-se a Ela para ser completamente de Nosso Senhor, por meio de Maria 1.

 

Em quê consiste essa consagração?

Consiste em prometer a Maria de recorrer filial e constantemente a ela e de viver uma habitual dependência a seu respeito, para chegar a uma união mais íntima com Nosso Senhor e, por seu intermédio, com a Santíssima Trindade que habita em nós.

A razão é diz o Santo 2 que Deus quer servir-se de Maria na santificação das almas, depois de ter se servido dela na Sua Encarnação, e acrescenta: “Nem creio que uma pessoa possa adquirir uma união íntima com Nosso Senhor e uma perfeita fidelidade ao Espírito Santo, sem uma grande união com a Santíssima Virgem e uma grande dependência de seu socorro... Maria era cheia de graça quando o arcanjo Gabriel a saudou e a graça superabundou quando o Espírito Santo a cobriu com sua sombra inefável. E de tal modo ela aumentou essa dupla plenitude, de dia a dia, de momento a momento, que chegou a um ponto imenso e inconcebível de graça, de sorte que o Altíssimo a fez tesoureira de todos os seus bens, dispensadora de suas graças, para enobrecer, elevar e enriquecer a quem ela quiser, para fazer entrar quem ela quiser no caminho estreito do Céu... Jesus é em toda parte e sempre o fruto e o Filho de Maria; e Maria é em toda parte a verdadeira árvore que dá o fruto da vida, e a verdadeira mãe que o produz”. 

No mesmo capítulo 3, diz também o Santo: “Pode-se ainda aplicar-lhe, com mais propriedade que São Paulo aplica a si próprio, as palavras: “Quos iterum parturio, donec formetur Christus in vobis” (Gl 4, 19): Dou à luz todos os dias os filhos de Deus, até que Jesus Cristo seja neles formado em toda a plenitude de sua idade. Santo Agostinho, sobrepujando a si mesmo, e tudo o que acabo de dizer, confirma que todos os predestinados, para serem conformes à imagem do Filho de Deus, são, neste mundo, ocultos no seio da Santíssima Virgem, e aí guardados, alimentados, mantidos e engrandecidos por essa boa Mãe, até que ela os dê à glória, depois da morte, que é propriamente o dia de seu nascimento, como qualifica a Igreja a morte dos justos. Ó mistério de graça, que os réprobos desconhecem e os predestinados conhecem muito pouco”.

Maria é, com efeito, sua mãe espiritual, os dá à luz espiritualmente, e seu nascimento espiritual definitivo é, após sua morte, a sua entrada na glória.

Concebe-se, é claro, que seria uma falta de humildade não recorrer freqüentemente à Medianeira universal que a Providência nos deu como uma verdadeira Mãe espiritual para formar o Cristo em nós, ou para formar-nos espiritualmente à imagem e semelhança do Filho de Deus.

A Teologia não pode deixar de reconhecer a perfeita legitimidade dessa consagração 4, legitimidade essa baseada nos dois títulos de Maria: o de Mãe de todos os homens e de Rainha.

Essa forma mais elevada de devoção à Santíssima Virgem, que é um reconhecimento prático da sua mediação universal, é uma garantia de sua particular proteção. Predispõe-nos a recorrer filial e perpetuamente a ela, à contemplação e à imitação das suas virtudes e de sua perfeita união a Nosso Senhor.

Na prática dessa dependência total com respeito à Virgem Maria, pode-se incluir, como indica o Santo de Montfort, o abandono e a entrega à Santíssima Virgem de tudo o que há de comunicável às outras almas em nossas boas obras, para que ela disponha segundo a vontade de seu divino Filho e para Sua maior glória. Aconselha, de fato, esta fórmula de consagração 5: “Escolho-vos neste dia, ó Maria Santíssima, em presença de toda a corte celeste, por minha Mãe e Senhora. Entrego-vos e consagro-vos, como escravo, meu corpo e minha alma, meus bens interiores e exteriores, e até o valor de minhas boas obras passadas, presentes e futuras, deixando-vos um pleno e inteiro direito de dispor de mim e de tudo o que me pertence, sem exceção, segundo vosso beneplácito, para a maior glória de Deus, no tempo e na eternidade”.

Esse abandono é, na realidade, a prática do que se tem chamado ato heróico, sem que exista aqui um voto, mas apenas uma promessa feita à Virgem 6.

Somos assim aconselhados a entregar a Maria nossos bens exteriores, se os temos, para que ela nos preserve de todo apego às coisas terrenas e nos inspire a fazer o melhor uso deles. Convém que lhe consagremos nosso corpo e nossos sentidos, para que ela os conserve em perfeita pureza, e convém também que lhe entreguemos nossa alma, nossas faculdades, nossos bens espirituais, virtudes e méritos e todas as nossas boas obras passadas, presentes e futuras.

Como entregaremos nossos méritos à Santíssima Virgem para que ela os disponha em benefício das outras almas na Terra ou no Purgatório? A Teologia explica isso facilmente, distinguindo em nossas boas obras o que há de incomunicável aos outros e o que há de comunicável.

 

O que há de comunicável em nossas boas obras?

Em primeiro lugar, o que há nelas de incomunicável é o mérito de condigno, que constitui, em justiça, um direito a um aumento de graça e à vida eterna. Esse mérito, estritamente pessoal, é incomunicável; difere nisso dos méritos de Nosso Senhor, que, em justiça, nos tem comunicado os seus méritos, porque foi constituído cabeça da humanidade 7.

Se, portanto, oferecemos a Maria nossos méritos de condigno, não é para que ela os comunique a outras almas, mas para que os conserve para nós, ajude-nos a fazê-los frutificar e, se tivermos a desgraça de perdê-los por um pecado mortal, para que nos obtenha a graça de uma contrição verdadeiramente fervorosa, que nos faça recobrar, não só o estado de graça, mas o grau de graça perdido 8.

Mas em nossas boas obras existe algo de comunicável às outras almas da Terra ou do Purgatório 9. Primeiro, o mérito de conveniência, de congruo proprie, que é também, como vimos antes 10, um mérito propriamente dito, baseado in jure amicabili, nos direitos de amizade que unem Deus à alma em estado de graça. Assim, uma mãe cristã, por sua vida virtuosa, pode merecer por um mérito de conveniência, como Santa Mônica, a conversão de seu filho. Deus, tendo presentes as intenções puras e as boas obras dessa excelente mãe, que Lhe está unida pela caridade, deu a seu filho, por causa dela, a graça da conversão 11.

Do mesmo modo, podemos e devemos rezar pelo próximo, pela sua conversão e aperfeiçoamento, pelos agonizantes e pelas almas do Purgatório. Aqui, ao valor impetratório da oração acrescenta-se o mérito de que falamos.

Podemos satisfazer, por fim, com uma satisfação de conveniência, de congruo, pelos outros, aceitar as contrariedades cotidianas para ajudá-los a expiar as suas faltas; podemos até mesmo, se recebermos a inspiração, aceitar voluntariamente a pena merecida pelos seus pecados, como a Virgem Maria fez por nós ao pé da Cruz, e alcançar-lhes, desse modo, a misericórdia de Deus 12. Os santos têm feito isso freqüentemente: Santa Catarina de Sena, por exemplo, disse a um jovem senense que tinha o coração cheio de ódio contra seus adversários políticos: “Pedro, eu tomo sobre mim os teus pecados e farei penitência em teu lugar, mas conceda-me uma graça: confessa-te”. “Eu o fiz recentemente”, disse o jovem. “Não é verdade, respondeu a santa, pois há sete anos não te confessas”, e começou a enumerar-lhe todas as faltas de sua vida. Aturdido e surpreso, ele arrependeu-se e perdoou os seus inimigos. Sem termos uma tão grande generosidade quanto a de uma Santa Catarina de Sena, podemos aceitar as penas diárias que se apresentam para ajudar outras almas a pagar suas dívidas à justiça divina.

Podemos também lucrar indulgências para as almas do Purgatório, abrir-lhes o tesouro dos méritos e das satisfações de Cristo e dos santos, e acelerar, assim, a sua libertação.

Há, portanto, em nossas boas obras, três coisas que são comunicáveis às outras almas: o mérito de conveniência, a oração e a satisfação. Pode acontecer, além disso, que um único e mesmo ato, como uma oração unida à austeridade ou à mortificação (tal como a adoração noturna, as Matinas ditas à noite ou uma Via Crucis), tenha um tríplice valor: meritório, satisfatório e impetratório, sem falar das indulgências.

Se oferecemos assim à Virgem Maria tudo o que existe de comunicável em nossas boas obras, não nos surpreenderemos que ela nos envie cruzes proporcionadas às nossas forças auxiliadas pela graça, para fazer-nos trabalhar, assim, na salvação das almas.

A quem convém aconselhar essa consagração e esse abandono? Não seria prudente aconselhá-la àqueles que a fariam por sentimentalismo ou por orgulho espiritual e não compreenderiam o seu alcance. Mas convém sugerir às almas verdadeiramente piedosas e fervorosas que a façam, primeiramente por alguns dias, depois por um tempo maior e, quando estiverem imbuídas de seu espírito, por toda a vida.

Mas objeta-se às vezes: fazer esse abandono é espoliar-se e não poder pagar nossa própria dívida, o que aumentará o nosso tempo de Purgatório. Essa foi a objeção feita pelo demônio a Santa Brígida quando ela se dispunha a realizar essa ação. Mas Nosso Senhor fê-la compreender que era uma objeção de amor próprio, que esquece a bondade da Virgem Maria; ela não se deixará vencer em generosidade e nos ajudará muito mais. Desprendendo-nos assim de nossos bens, receberemos da Santíssima Virgem cem por um. E mesmo o amor que atesta esse ato generoso obtém-nos já a remissão de uma parte do nosso Purgatório.

Outras pessoas objetam ainda: como rezar, então, pelos nossos pais, irmãos e irmãs, por nossos amigos e conhecidos, se entregamos de uma vez por todas as nossas orações a Maria?

Isso é esquecer que Maria conhece, melhor que nós, nossos deveres de caridade, e que será a primeira a recordá-los a nós. Mas entre nossos pais e amigos na Terra ou no Purgatório, existem almas que têm necessidade urgente de orações e de satisfações, e ignoramos quem sejam essas almas, enquanto que a Santíssima Virgem as conhece e poderá assim beneficiá-las com o que é comunicável em nossas boas obras, se nós a ela tudo abandonarmos 13.

Assim concebida, essa consagração e esse abandono fazem-nos penetrar cada vez mais, sob a direção de Maria, no mistério da comunhão dos santos. Essa prática é uma perfeita renovação das promessas do batismo 14.

 

Frutos dessa consagração

Essa devoção diz o Santo de Montfort 15 nos põe inteiramente ao serviço de Deus, nos leva a imitar o exemplo dado por Jesus Cristo, que quis ser submisso com respeito à sua santa Mãe (Lc 2, 51). Ela nos proporciona a especial proteção de Maria, que purifica e embeleza nossas boas obras ao apresentá-las a Seu Filho. Conduz-nos à união com Nosso Senhor; é um caminho fácil, curto, perfeito e seguro. Dá uma grande liberdade interior, alcança grandes bens ao próximo e é um meio admirável de perseverança. No livro, cada um desses pontos é desenvolvido da forma mais prática.

Está escrito particularmente no capítulo V 16: “É um caminho fácil; é um caminho que Jesus Cristo abriu quando veio a nós, e no qual não há obstáculo que nos impeça de chegar a Ele. Pode-se, é verdade, chegar a Ele por outros caminhos; mas encontram-se muito mais cruzes e mortes estranhas, e muito mais empecilhos, que dificilmente se vencem. Será preciso passar por noites obscuras, por combates e agonias terríveis, escalar montanhas escarpadas, pisando espinhos agudos, atravessar desertos horríveis. Enquanto que pelo caminho de Maria passa-se com muito mais doçura e tranqüilidade.

“Aí se encontram, sem dúvida, rudes combates a travar, e dificuldades enormes a vencer. Mas essa boa Mãe e Senhora está sempre tão próxima e presente a seus fiéis servos, para alumiá-los em suas trevas, esclarecê-los em suas dúvidas, encorajá-los em seus receios, sustê-los em seus combates e dificuldades, que, em verdade, esse caminho virginal para chegar a Jesus Cristo é um caminho de rosas e de mel, em vista de outros caminhos”. Vê-se acrescenta pelos santos que mais particularmente têm seguido essa via: Santo Efrém, São João Damasceno, São Bernardo, São Bernardino, São Boaventura, São Francisco de Sales etc.

O piedoso escritor reconhece, um pouco mais adiante, que os servos de Maria “recebem dela as maiores graças e favores do Céu, isto é, as cruzes; mas sustento que são também os servidores de Maria que levam essas cruzes com mais facilidade, mérito e glória; e mais que, onde outro qualquer pararia mil vezes e até cairia, eles não se detêm e, ao contrário, avançam sempre”, porque são mais ajudados pela Mãe de Deus, que lhes obtém, em suas provações, a unção do puro amor. Coisa extraordinária: a Santíssima Virgem torna mais fácil levar a cruz e mais meritório; mais fácil, porque nos ampara em sua infinita mansidão e paciência; mais meritório, porque nos obtém uma imensa caridade, que é o princípio do mérito.

Pode-se dizer também que é um caminho contrário ao “arrivismo”, pela humildade que exige, e até aparenta ser um fracasso, como o observado na vida de Nosso Senhor, mas tem grandes vantagens sobrenaturais.

“É um caminho curto... Avançamos mais, em pouco tempo de submissão e dependência a Maria, do que em anos inteiros de vontade própria e contando apenas com o próprio esforço; (...) avançará a passos de gigante em direção a Jesus Cristo, pelo mesmo caminho, que, como está escrito (Sl 18,6), Jesus trilhou para vir a nós (...) em poucos anos, se atinge a plenitude da idade de Jesus Cristo” 17.

“É um caminho perfeito, escolhido pelo próprio Deus. “O Altíssimo desceu perfeita e divinamente até nós por meio da humilde Maria, sem nada perder de sua divindade e santidade; e é por Maria que os pequeninos devem subir perfeita e divinamente ao Altíssimo sem recear coisa alguma” 18.

É, finalmente, um caminho seguro, porque a Santíssima Virgem preserva das ilusões do demônio, das ilusões da fantasia e das ilusões do sentimentalismo; ela acalma e regula a nossa sensibilidade, dá a esta um objeto puríssimo e santíssimo, e a subordina plenamente à vontade vivificada pela caridade, em vista da união com Deus.

Encontra-se aqui uma grande liberdade interior, que é a recompensa da dependência completa em que a alma se colocou. Os escrúpulos são eliminados, o coração dilata-se pela confiança e pelo amor terno e filial. O Santo cita uma passagem histórica que leu na vida da Madre Inês de Langeac, dominicana, que, “sofrendo tormentos de espírito, ouviu uma voz que lhe disse que, se ela quisesse livrar-se de todos os seus sofrimentos e ser protegida contra todos os seus inimigos, se fizesse quanto antes escrava de Jesus e de Sua Mãe Santíssima... Depois desse ato, todas as suas penas e escrúpulos cessaram, e ela se achou numa grande paz e bem-estar de coração, e isso a levou a ensinar essa devoção a muitas outras pessoas... entre outros, a M. Olier, que instituiu o seminário de São Sulpício, e a muitos outros padres e eclesiásticos do mesmo seminário” 19. Nesse seminário também foi educado São Luís Grignion.

Finalmente, diz ele 20, essa devoção, que proporciona tão grandes bens ao próximo, é um meio admirável de perseverança para quem a pratica, porque “confiamos à Santíssima Virgem, fiel por excelência, tudo o que possuímos... É em sua fidelidade que confiamos... para que ela conserve e aumente nossas virtudes e méritos, a despeito do demônio, do mundo e da carne, que envidam todos os esforços para no-los arrebatar”. Reconhecemos que somos muito fracos e miseráveis para conservá-los por nós mesmos. “Embora me entendais, almas predestinadas, falo mais abertamente. Não confieis o ouro de vossa caridade, a prata de vossa pureza, as águas das graças celestes, nem os vinhos de vossos méritos e virtudes a um saco roto, a um cofre velho e quebrado, a um vaso contaminado e corrompido, como vós sois; porque sereis pilhados pelos ladrões, isto é, os demônios, que buscam e espreitam, noite e dia, o momento próprio para o ataque; estragareis, com o mau odor do amor-próprio, da confiança própria e da vontade própria, tudo o que Deus vos dá de mais puro.

“Depositai, derramai no seio e no coração de Maria todos os vossos tesouros, todas as vossas graças e virtudes. Maria é um vaso espiritual, um vaso honorífico, um vaso insigne de devoção: vas spirituale, vas honorabile, vas insigne devotionis...

“As almas, porém, que não nasceram do sangue, nem da vontade da carne (Jo 1,13), mas de Deus e de Maria, me compreendem e apreciam; e é para elas, afinal, que eu escrevo...

“Se uma alma se lhe entrega [a Maria] sem reserva, ela se dá a essa alma também sem reserva”, e a faz encontrar o caminho que conduz os predestinados à perseverança final 21.

Tais são os frutos dessa consagração; Maria ama os que a ela se confiam totalmente, preserva-os, dirige-os, defende-os, protege-os e intercede por eles 22. Convém que nos ofereçamos a ela para que ela mesma nos ofereça a seu Filho segundo a plenitude de sua prudência e de seu zelo.

A Virgem Maria também produz em seus protegidos os frutos mais elevados, que são propriamente de ordem mística, como veremos 23.

  1. 1. Por isso São Luís Grignion de Montfort diz na própria fórmula da consagração: “Consagração de si mesmo a Jesus Cristo por meio de Maria”, mas no decorrer do livro repete com freqüência e de forma mais breve: “Consagração a Maria”, subtendendo-se: a Jesus por meio dela. São Luís apresenta desde o início de sua obra esta observação (op. cit., c. I, art. 2, nº 64) que se explica numa época em que o jansenismo, inimigo da devoção a Maria, tinha adeptos em todos os lugares: “Falo, porém, dos cristãos católicos, e mesmo de doutores entre os católicos que exercem a profissão de ensinar aos outros a verdade, e no entanto não Vos conhecem, Senhor, nem a Vossa Mãe Santíssima, a não ser de um modo especulativo, seco, estéril e indiferente. Esses senhores raras vezes falam de Maria e da devoção que se lhe deve ter, porque, dizem, receiam que se abuse dessa devoção e que se Vos ofenda, honrando excessivamente Vossa Mãe Santíssima... Às vezes metem-se a falar da devoção à Vossa Mãe Santíssima, não, porém, para assentá-la e propagá-la, e sim para destruir os abusos que dela se fazem”. Acreditam que Maria é um impedimento para alcançar a união divina, quando, ao contrário, toda a sua influência não tem outra finalidade que conduzir-nos a esta. Cf. também ibid, c. III. a. 1, parágrafo 1: “Os devotos críticos” – O Santo não exagerou a característica, pois foi a época em que esses “devotos críticos” procuravam divulgar entre os fiéis o panfleto ou libelo de Windenfelt, intitulado Avisos salutares da B. V. Maria a seus indiscretos. Cf. terrien, op. Cit., IV, p. 478.

    m. boudon, pelo contrário, prelado de Evreux, morto em odor de santidade, escreveu A santa escravidão da admirável Mãe de Deus, e o cardeal de Bérulle divulgou também essa devoção com seus escritos.

  2. 2. Ibid., c. I, a. 1, nº 44.
  3. 3. Ibid., c. I, a. 1, nº 33.
  4. 4. Cf. Dictionnaire de Théol. cath., art. Marie, col. 2470. A doutrina do Tratado de são luís grignion de montfort e às vezes até suas próprias expressões foram repetidas pelo Papa Pio X em sua encíclica Ad diem illum, de 2 de fevereiro de 1904, sobre Maria, Medianeira universal. Nessa encíclica, é dito que “Maria, associada a Nosso Senhor, nos mereceu com um mérito de conveniência todas as coisas que Ele próprio nos mereceu em justiça, de condigno, e que ela é a distribuidora de todas as graças”.
  5. 5. Ibid., Apêndice.
  6. 6. Mesmo os religiosos que já tenham feito os votos solenes de pobreza, castidade e obediência podem, evidentemente, fazer essa promessa, que os levará a penetrar mais intimamente no mistério da comunhão dos santos.
  7. 7. Cf. santo tomás, Iª IIae, q. 114, a. 6: “Por mérito condigno, ninguém, salvo Cristo, pode merecer para outrem a primeira graça”.
  8. 8. Ensina, com efeito, santo tomás, com os antigos teólogos, IIIª, q. 89, a. 2: “O penitente recebe uma graça maior ou menor, segundo seja maior ou menor a sua contrição. Pode acontecer que sua contrição seja proporcional a um maior grau de graça que aquele perdido; outras vezes pode ser proporcional a uma graça igual; enfim, outras, a uma menor. Por isso o penitente ora ressurge com maior graça que primeiro tivera; ora, com graça igual; e ora, enfim, com menor. E o mesmo ocorre com as virtudes resultantes da graça habitual”.
  9. 9. Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem, cap. IV, a. 1.
  10. 10. IIª Parte, c. II, a. 2: “Maria nos mereceu com um mérito de conveniência o que Jesus Cristo nos mereceu em estrita justiça”.
  11. 11. Cf. santo tomás, Iª IIae, q. 114, a. 6: “Por mérito côngruo, porém, podemos merecer para outrem a primeira graça”.
  12. 12. Cf. santo tomás, IIIª, q. 14, a. 1; q. 48, a. 2; Suppl., q. 13, a. 2: “quando dois homens estão unidos pela caridade, um pode satisfazer por outro”.
  13. 13. Cf. grignion de montfort, Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem, c. IV. Respostas a algumas objeções – Ed. Vozes (Petrópolis), 40ª edição.
  14. 14. Cf. ibid., c. IV, a. 2.
  15. 15. Cf. ibid., c. V.
  16. 16. Ibid., c. V, a. 5, p. 146.
  17. 17. Ibid., pp. 149-151. São Francisco de Assis, certo dia, teve uma visão na qual seus filhos esforçavam-se em vão para alcançar Nosso Senhor por uma escada íngreme que subia diretamente até Ele; Jesus mostrou-lhe, então, outra escada, de inclinação mais suave, em cujo ápice estava a Virgem Maria e lhe disse: Aconselha teus filhos para que tomem a escada da minha Mãe.
  18. 18. Ibid., pp. 151-152.
  19. 19. Ibid., a. 6, pp. 164-165.
  20. 20. Ibid., a. 8, pp. 168-169.
  21. 21. Ibid., pp. 173-176.
  22. 22. Ibid., c. VI, a. 2.
  23. 23. Ibid., c. VII. - De acordo com o Santo, ibid. c. I, a. 2, parágrafo 3, a devoção à Santíssima Virgem será particularmente necessária nos últimos tempos, em que Satanás fará grandes esforços para seduzir, se pudesse, aos próprios eleitos (Mt 24, 24). “Se os predestinados iniciam-se, com a graça e a luz do Espírito Santo, na prática interior e perfeita dessa devoção, verão, portanto, claramente, tanto quanto o permite a fé, a estrela do mar, e chegarão ao porto seguro seguindo sua direção, apesar das tempestades e dos piratas. Conhecerão a magnificência dessa Rainha e se consagrarão inteiramente a seu serviço, como “súditos e escravos de amor” para combater o que São Paulo chama de “escravidão do pecado” (Rm 6, 20). Experimentarão suas doçuras e bondades maternais e amá-la-ão ternamente como seus filhos prediletos (ibid., c. I, a. 2). A fórmula “santa escravidão”, usada pelo Santo, foi algumas vezes criticada; mas não se pode esquecer que é uma escravidão de amor, a qual, longe de diminuir o caráter filial de nosso amor a Maria, o acentua. Como observou Mons. Garnier, Bispo de Luzón, numa carta pastoral de 11 de março de 1922, se existem no mundo milhares de escravos do respeito humano, da ambição, do dinheiro e de outras paixões mais vergonhosas, também há, felizmente, escravos da palavra dada, da consciência e do dever. A santa escravidão pertence a este último grupo. É apenas uma metáfora, que se opõe à escravidão do pecado.
AdaptiveThemes