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Art. 2 ― Se a alma humana é algo de subsistente.

(De Pot.,q. 3, a. 9, 11; De Spirit.Creat., a. 2 Qu. De Anima, a.1, 14; III De Anima, lect. VII).
 
O segundo discute-se assim. Parece que a alma humana não é algo de subsistente.
 
1. Pois, o que é subsistente é um determinado ser. Ora, a alma não é um determinado ser, mas um composto de corpo e alma. Logo não é ela algo de subsistente.
 
2. Demais. Tudo o que é subsistente pode ser considerado capaz de operação. Ora, a alma não é assim considerada, pois, segundo o Filósofo, dizer que a alma sente ou intelige é o mesmo que dizer alguém que ela tece ou edifica. Logo, a alma não é algo de subsistente.
 
3. Demais. Se a alma fosse algo de subsistente, alguma operação dela haveria, independente do corpo. Mas nenhuma das suas operações é assim, nem ainda o inteligir, porque não é possível inteligir sem fantasma e os fantasmas não existem sem o corpo. Logo, a alma humana não é algo de subsistente.
 
Mas, em contrário, diz Agostinho: Quem vê a natureza da mente, que é substância, mas não corpórea, vê que os que opinam ser ela corpórea erram por lhe adjungirem as fantasias dos corpos, sem as quais não podem conceber nenhuma natureza. Logo, a natureza da alma humana não só é incorpórea, mas também é substância, isto é, algo de subsistente.
 
SOLUÇÃO. Necessário é admitir-se que o princípio da operação intelectual, a que chamamos alma do homem, é um certo princípio incorpóreo e subsistente. Pois, é manifesto, pela inteligência o homem pode conhecer a natureza de todos os corpos. Ora, o que pode conhecer certas causas, necessariamente não deve ter nada delas, na sua natureza, porque a causa que a esta fosse naturalmente inerente impedir-lhe-ia o conhecimento das outras. Assim, vemos que a língua do doente, afetada de humor colérico e amargo, nada pode sentir de doce, mas tudo lhe parece amargo. Se, pois, o princípio intelectual tivesse em si a natureza de algum corpo, não poderia conhecer todos os corpos, porque cada corpo tem a sua natureza determinada. Logo, é impossível que o princípio intelectual seja corpo. E, semelhantemente, também é impossível que intelija por meio de órgão corpóreo, porque também a natureza determinada desse órgão corpóreo impediria o conhecimento de todos os corpos.
 
Assim, se uma determinada cor estivesse, não só na pupila, mas ainda num vaso de vidro, o líquido contido neste seria dessa mesma cor. Por onde, o princípio intelectual chamado alma ou intelecto, tem a sua operação própria, não comum com o corpo. Ora, só pode operar por si o que por si subsiste, pois operar só é próprio do ser atual. Por isso, uma causa opera dó mesmo modo pelo qual existe e, assim, não dizemos que o calor aquece, mas que é cálido. Logo, conclui-se que a alma humana, chamada intelecto ou mente, é algo de incorpóreo e subsistente.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. Um determinado ser pode compreender-se de duplo modo: significando qualquer subsistente, ou um subsistente completo em a natureza de alguma espécie. O primeiro modo exclui a inerência acidental e a da forma material. O segundo exclui também a imperfeição da parte. Assim, pode-se dizer que a mão é um determinado ser, no primeiro sentido, não, porém, no segundo. E, portanto, sendo a alma humana parte da espécie humana, pode chamar-se um determinado ser, segundo o primeiro modo, como algo de quase subsistente; mas não conforme o segundo, que é o em que se chama algo de determinado o composto de alma e corpo.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. Aristóteles usa dessas palavras, não para exprimirem opinião própria, mas a dos que diziam que inteligir é ser movido, como é claro pelo que afirma antes. Ou deve dizer-se que o agir por si convém ao que existe por si. Ora, o existir por si pode-se atribuir a alguma causa que não seja inerente como acidente ou como forma material, mesmo se for parte. Mas diz-se que é, propriamente, subsistente por si o que nem é inerente desse predito modo, nem é parte; e segundo este modo de dizer, o olho ou a mão não se pode considerar subsistente por si e, por conseqüência, nem como operando por si. Por onde, também as operações das partes se atribuem ao todo, por meio delas; assim dizemos que o homem vê com os olhos e apalpa com as mãos; diferentemente de quando dizemos que o cálido aquece pelo calor, pois, propriamente falando, o calor de nenhum modo aquece. Logo, pode-se dizer que a alma intelige como o olho vê; mas é mais próprio dizer-se que o homem intelige por meio da alma.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. O corpo é necessário para a ação do intelecto, não como o órgão pelo qual tal ação se exerce, mas em razão do objeto; pois os fantasmas estão para o intelecto como a cor para o sentido. Assim que, o precisar do corpo não impede, seja o intelecto subsistente; do contrário, o animal não seria algo de subsistente, por precisar dos sensíveis exteriores para sentir.

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