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Art. 4 – Se a profecia supõe a pureza de costumes.

O quarto discute–se assim. – Parece que a profecia supõe a pureza de costumes.

1. – Pois, diz a Escritura, que a sabedoria de Deus pelas nações se transfunde nas almas santas, forma os amigos de Deus e os profetas. Ora, a santidade não pode existir sem a pureza de costumes e sem a graça gratuita. Logo, a profecia supõe a pureza de costumes e a graça santificante.

2. Demais. – Só aos amigos se revelam os segredos, segundo o Evangelho: Chamei–os amigos, porque vos descobri tudo quanto ouvi de meu Pai. Ora. Deus revela os seus segredos aos projetas, no dizer da Escritura. Logo, parece que os profetas são amigos de Deus, e isso não é possível sem a caridade. Logo, parece que a profecia não pode existir sem a caridade, a qual também não existe sem a graça santificante.

3. Demais – O Evangelho diz: Guardai–vos rios falsos profetas, que vêm a vós com vestidos de ovelhas e dentro são lobos roubadores. Ora, parece que todos os desprovidos da graça interior são lobos roubadores. Logo, todos são falsos profetas. Portanto, só é verdadeiro profeta o que a graça tornou bom.

4. Demais. – O Filósofo diz, que se a adivinhação dos sonhos vem de Deus é inconveniente concedê–la a todos os homens, devendo sê–lo só nós os melhores. Ora, o dom da profecia provém de Deus. Logo, o dom da profecia só é dado aos melhores.

Mas, em contrário, no Evangelho, aos que perguntavam – Senhor, não é assim que profetizámos em teu nome? – responde–se: Nunca vós conheci. Pois, no dizer do Apóstolo, O Senhor conhece aos que são dê/e. Logo, podem profetizar os que não são de Deus, pela graça.

SOLUÇÃO. – A pureza dos costumes pode ser considerada a dupla luz: Na sua raiz interior, que é a graça santificante; e quanto às paixões interiores da alma e aos atos externos. Ora, a graça santificante é dada principalmente para unir a nossa alma a Deus, pela caridade. Por isso, diz Agostinho: Ninguém será transferido da esquerda para a direita se não lhe for dado o Espírito Santo, que o faça amar a Deus e ao próximo. Por onde, tudo o que pode existir sem a caridade também o pode sem a graça santificante e, por consequência, sem a pureza de costumes. Ora, a profecia pode existir sem a caridade, o que de dois modos se prova. – Primeiro, pelo ato de uma e de outra; pois, a profecia concerne ao intelecto, cujo ato precede o da vontade, aperfeiçoada pela caridade. Por isso, o Apóstolo enumera a profecia entre o mais, que pertence ao intelecto e que pode existir sem a caridade. – Segundo, pelo fim de ambas; pois, a profecia é dada, com as outras graças santificantes, para a utilidade da Igreja, segundo o Apóstolo: E a cada um é dada a manifestação do Espírito Santo para proveito. Mas, a profecia não se ordena diretamente a unir a Deus os afetos mesmos do profeta, como o faz a caridade. – Logo, a profecia pode existir sem a pureza de costumes, quanto à raiz primeira dessa pureza. Considerada, porém, a pureza de costumes relativamente às paixões da alma e aos atos externos, então a impureza dos costumes é um obstáculo à profecia. Pois, a profecia supõe a elevação máxima da mente, para a contemplação espiritual, e essa fica impedida pela veemência das paixões e pela preocupação desordenada corri as coisas externas. Por isso, diz a Escritura, que os filhos dos profetas habitavam com Eliseu, quase levando vida solitária, afim de não serem impedidos de profetizar, ocupados com as coisas do mundo.

DONDE A RESP0STA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – O dom da profecia às vezes é dado ao homem tanto para a utilidade dos outros como para a ilustração da mente mesma do profeta. E estes são aqueles nas almas dos quais a sabedoria divina habita pela graça santificante, tornando–os amigos de Deus e profetas. Outros, porém, recebem o dom da profecia só para a utilidade de terceiros, que são quase instrumentos da ação divina. Donde o dizer Jerônimo: Profetizar, fazer prodígios, expulsar os demônios não implica, às vezes, nenhum mérito naquele, que assim age; mas, se o faz, é por invocação do nome de Cristo, ou para condenação dos que o invocam e utilidade do que veem e ouvem é que tal dom lhe é concedido.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Gregório, expondo o lugar aduzido, ensina: Amando os bens celestes supernos, de que ouvimos falar, já os conhecemos, porque o mesmo amor é um conhecimento. Assim, tornou–lhes tudo conhecido, porque, arrancados aos desejos terrestres, ardiam no fogo do sumo amor. E deste modo nem sempre os segredos são revelados aos profetas.

RESPOSTA À TERCEIRA. – Todos os maus não são lobos rapazes, mas só os que visam fazer mal aos outros. Pois, diz Crisóstomo: Os doutores católicos, mesmo se forem pecadores, chamam–se escravos da carne, mas não, lobos rapaces, por que não têm o propósito de perder os Cristãos. Ora, ordenando–se a profecia para a utilidade dos outros, é claro que esses tais são falsos profetas, pois, para isso não foram enviados por Deus.

RESPOSTA À QUARTA. – Os dons divinos nem sempre são dados aos melhores, absolutamente falando; mas, às vezes aos melhores para receberem tais dons. Por onde, Deus confere o dom da profecia àqueles aos quais julga melhor concedê–lo.

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