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Art. 3 – Se pode haver pecado nos divertimentos excessivos.

O terceiro discute–se assim. – Parece que não pode haver pecado nos divertimentos excessivos.

1. – Pois, o que escusa do pecado parece não ser pecado. Ora, o divertimento às vezes escusa do pecado; pois, muitos atos que praticados seriamente seriam pecados graves, feitos como divertimento, não são pecados ou só levemente o são. Logo, parece que no excessivo divertimento não há pecado.

2. Demais. – Todos os demais vícios se reduzem aos sete capitais, como diz Gregório. Ora, o excesso nos divertimentos não parece reduzir­se a nenhum dos vícios capitais. Logo, parece não haver nele pecado.

3. Demais. – Sobretudo os histriões é que se consideram como os que entregam ao excessivo divertimento, pois, ordenam toda a vida às diversões. Se, pois, o excesso nos divertimentos fosse pecado, então todos os histriões viveriam em estado de pecado. E também pecariam todos os que lhes empregam o ministério, ou os que lhes fazem liberalidades, como fautores do pecado. Ora, tal é falso. Pois, como se lê nas Vidas dos Padres, a S. Pafúncio foi revelado, que um hístríão haveria de ser o seu conserte, na vida futura.

Mas, em contrário, àquilo da Escritura – O riso está misturado com a dor e aos fins do gozo sucede a tristeza – diz a Glosa: o choro perpétuo. Ora, no excessivo divertimento ha risos desordenados e desordenada alegria. Logo, ha nele pecado mortal, o só digno do pranto perpétuo.

SOLUÇÃO. – Em toda matéria susceptível de ser dirigida pela razão, excessivo se chama o que lhe ultrapassa a regras, e mesquinha o que fica aquém da regra racional. Ora, como dissemos, as palavras ou ato lúdicros ou jocosos são dirigíveis pela razão. Por onde, divertimento excessivo é o que ultrapassa a regra racional. O que de dois modos pode dar–se. – Primeiro, pela espécie mesma dos atos diversivos; e esse gênero de divertimento se chama, segundo Túlio, indecoroso, impudente, flagicioso, obsceno; a saber, quando se empregam, como divertimentos, palavras ou atos torpes, ou redundam em prejuízo para o próximo, e que, em si mesmos, são pecados mortais. – De outro modo, pode haver excesso no divertimento, por falta das circunstâncias devidas; por exemplo, quando se buscam os divertimentos em tempos ou lugares impróprios, ou fora da conveniência da matéria ou da pessoa. E isto pode às vezes ser pecado mortal, por causa da veemência do afeto neles posto, e o prazer do qual se prefere ao amor de Deus, de modo que não se evita o gozo de tais prazeres contrários aos preceitos de Deus ou da Igreja. Outras vezes, porém, é pecado venial; por exemplo, quando não nos afeiçoamos aos divertimentos a ponto de querermos praticar atos contrários a Deus.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – Certos atos são pecado só pela intenção, isto é, por serem praticados em detrimento de outrem; e essa intenção exclui o divertimento, o qual buscamos com o fito no prazer e não no mal do próximo. Ora, em tais casos, o divertimento escusa do pecado ou o diminui. Outros atos, porém, são especificamente pecaminosos; tais, o homicídio, a fornicação e semelhantes. E esses não se escusam pelo divertimento; ao contrário, o divertimento deles oriundo torna–se flagicioso e obsceno.

RESPOSTA À SEGUNDA. – O excesso nos divertimentos constitui a alegria fátua, que Gregório considera filha da gula. Donde o dito da Escritura: O povo se assentou a compor e beber, e depois se levantaram a brincar.

RESPOSTA À TERCEIRA. – Como dissemos, o divertimento é necessário para a conversação da vida humana. Ora, tudo o que é útil à conversação humana pode fazer o objeto de certas profissões lícitas. Por onde, também o ofício dos histriões, ordenado a distrair os homens, não é em si mesmo ilícito; nem vivem eles em estado de pecado, se provocam moderadamente ao divertimento, isto é, se não recorrem a nenhumas palavras ou ações ilícitas para divertir e se não suscitam diversões em matéria, ou tempos impróprios. E embora, na ordem das coisas humanas, não tenham nenhum outro ofício como o têm os outros homens, contudo, pelo que a eles mesmos respeita e a Deus, vivem reta e virtuosamente, por exemplo, quando oram, quando regulam racionalmente suas paixões e obras; e às vezes dão também esmolas aos pobres. Por isso, os que moderadamente os auxiliam não pecam, mas procedem com justiça, dando–lhes uma paga pelo ministério deles. Mas, quem dispender os seus bens superfluamente com eles, ou ainda sustentar os histriões que promovem divertimentos ilícitos, pecam, quase pelos provocarem ao pecado. Por isso, diz Agostinho, que por dos seus bens aos histriões é enorme vício. Salvo ao histrião posto em extrema necessidade, caso em que se lhe deve socorrer; pois, adverte Ambrósio: Dá de comer ao que morre de fome. Pois, quem puder salvar a vida a outrem, dando–lhe de comer, e não o fizer, mata–o.

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