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Art. 6 – Se é necessário retribuirmos mais do que o benefício recebido.

O sexto discute–se assim. – Parece que não é necessário retribuirmos mais do que o benefício recebido.

1. – Pois, aos nossos pais não podemos fazer retribuição condigna, como diz o Filósofo. Ora, a virtude não busca o impossível. Logo, não devemos retribuir mais do que o benefício recebido.

2. Demais. – Quem retribui mais do que o recebido como benefício, por isso mesmo faz um como novo benefício. Ora, esse novo benefício há a obrigação de retribui–la. Logo o primeiro benfeitor está obrigado a uma retribuição maior que o benefício que por sua vez recebeu; e assim ao infinito. Ora, a virtude não pode proceder ao infinito, porque o infinito faz desaparecer a natureza do bem, como diz Aristóteles. Logo, a retribuição não deve exceder o benefício recebido.

3. Demais. – A justiça supõe a igualdade. Ora, o mais é um excesso sobre a igualdade. Logo, sendo o excesso um vício, em relação a qualquer virtude, parece que dar maior retribuição que o benefício recebido é vicioso e oposto à justiça.

Mas, em contrário, o Filósofo diz: Devemos pagar o débito do benefício e ainda tornar a pagar, e isso fazemos quando damos uma retribuição maior. Logo, pela retribuição devemos pagar mais do que o benefício recebido.

SOLUÇÃO. – Como dissemos, a retribuição do benefício deve levar em conta a vontade do benfeitor, o qual, sobretudo é digno de reconhecimento por ter feito gratuitamente um benefício a que não estava obrigado. Por onde, quem recebeu o benefício tem o dever imposto pela sua honorabilidade de, do mesmo modo, lhe fazer alguma coisa de graça. Ora, só podemos fazer ao benfeitor, de graça, o que exceda quantitativamente o benefício dele recebido; pois, retribuindo–lhe menos ou com igualdade, nada faremos de graça mas apenas lhe pagaremos o recebido. Logo, a retribuição do benefício leva–nos sempre a dar mais do que o recebido.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – Como se disse, ao retribuir o benefício devemos levar em conta antes o afeto do benfeitor j do que a sua obra. Se, pois, considerarmos o feito do benefício, que o filho recebeu do pai – a existência e a vida, o filho não pode lhe retribuir com igualdade, como diz o Filósofo. Mas, se considerarmos a vontade mesma do que dá e do que retribui, então pode o filho dar ao pai maior retribuição do que o benefício recebido, como diz Séneca. Mas, se o não puder, a gratidão se contenta com a vontade de retribuir.

RESPOSTA À SEGUNDA. – O débito da gratidão deriva da caridade, que, quanto mais paga, tanto mais deve, conforme ao dito do Apóstolo: A ninguém devais coisa alguma, se não é o amor com que vos ameis uns aos outros. Logo, não há inconveniente em ser interminável a obrigação da gratidão.

RESPOSTA À TERCEIRA. – Assim como a justiça, que é uma virtude cardeal, implica a igualdade das causas; assim, a gratidão, a igualdade das vontades. De modo que, assim como, pela presteza com que age, o benfeitora faz o a que não estava obrigado, assim também, o beneficiado deve retribuir mais do que é de seu dever.

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