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Artigo 2 - Se ao juiz é lícito julgar contra a verdade que conhece, fundado no que lhe propõem, em contrário.

O segundo discute-se assim. – Parece que ao juiz não é lícito julgar contra a verdade que conhece, fundado no que lhe propõem, em contrário.

1. – Pois, diz a Escritura. E encaminharte-ás aos sacerdotes da linhagem de Levi e ao juiz que nesse tempo for, e consultá-los-ás e eles te descobrirão a verdade do juízo. Ora, certas coisas são às vezes propostas contra a vontade, como quando se faz uma prova baseada em falsos testemunhos. Logo, não é lícito ao juiz julgar baseado no que lhe é proposto e provado, contra a verdade que conhece.

2. Demais. – O homem deve ao julgar conformar-se com o juízo divino, porque é ajuízo de Deus, como diz a Escritura. Ora, conforme ao Apóstolo, juízo de Deus é segundo a verdade. E a Escritura, noutra parte, predica, de Cristo: Não julgará segundo a vista dos olhos, nem arguirá pelo fundamento dum ouvi dizer; mas julgará os pobres com justiça e arguirá com equidade em defesa dos mansos da terra. Logo, o juiz não deve, baseado no que lhe é provado, proferir sentença em contrário ao que sabe de ciência própria.

3. Demais. – No juízo são necessárias as provas para que a verdade da coisa faça fé ao juiz; por isso, quando se trata de coisas notórias, não é necessário satisfazer a todas as exigências da justiça, segundo o Apóstolo: Os pecados de alguns homens são manifestos antes de se examinarem em juízo. Portanto, o juiz conhecedor da verdade por ciência própria não deve basear-se no que lhe é provado, mas dar a sentença fundada na verdade que conhece.

4. Demais. – A consciência, como o nome o indica, importa na aplicação da ciência a um determinado caso, como se estabeleceu na Primeira Parte. Ora, agir contra a consciência é pecado. Logo, peca o juiz que proferiu a sentença fundada nas alegações e contra a consciência que tem da verdade.

Mas, em contrario, Agostinho (Ambrósio) diz, comentando um dos salmos: O bom juiz nada faz por seu arbítrio; mas, sentencia segundo as leis e o direito. Ora, isto é julgar segundo o proposto e provado em juízo. Logo, o juiz deve assim julgar e não, segundo o próprio arbítrio.

SOLUÇÃO. – Como já dissemos julgar é próprio do juiz, enquanto investido da autoridade pública. Logo, ao julgar, deve informar-se não pelo que sabe como pessoa privada, mas pelo que conhece como pessoa pública. Ora, isso ele o conhece em geral e em particular. Em geral, pelas leis públicas, divinas ou humanas, contra as quais não deve admitir nenhuma prova. Tratando-se, porém, de um caso particular, deve formar a sua ciência baseado nos instrumentos, nas testemunhas e em outros documentos legítimos de sua natureza, que deve seguir, ao julgar, mais do que na ciência que tem como pessoa privada. Dessa ciência contudo pode ajudar-se para discutir mais rigorosamente as provas aduzidas, de modo a investigar-lhes melhor os defeitos. Mas, não podendo de direito repudiá­las, como se disse, deve fundar-se nelas o seu juízo.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ­– O texto aduzido começa por tratar da consulta a ser feita aos juízes, para compreendermos que eles devem julgar da verdade, baseados nas alegações.

RESPOSTA À SEGUNDA. – A Deus cabe julgar por poder próprio. Logo, ao julgar, é informado pela verdade que ele próprio conhece e não pelo que recebe de outrem. E o mesmo se dá com Cristo, verdadeiro Deus e homem. Ao passo que os outros juízes não julgam por poder próprio. Logo, a comparação não colhe.

RESPOSTA À TERCEIRA. – O Apóstolo se refere ao caso de um crime manifesto não só ao juiz, mas tanto ao juiz como aos outros. De modo que o réu, longe de poder de qualquer modo negar o crime, fica desde logo preso pela própria evidência do fato. Mas, se o crime for manifesto ao juiz e não, aos outros; ou aos outros, e não ao juiz, então é necessário discuti-lo em juízo.

RESPOSTA À QUARTA. – O homem, no atinente à sua pessoa mesma, deve informar a sua consciência pela ciência própria. Mas, no respeitante ao poder público, deve informar, a sua consciência fundado no que pode ser conhecido no juízo público e nisso basear-se.

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