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Art. 1 – Se a continência é virtude.

O primeiro discute–se assim. – Parece que a continência não é virtude.

1. – Pois, a espécie se convide com o gênero. Ora, a continência se condivide com a virtude, como está claro no Filósofo. Logo, a continência não é virtude.

2. Demais. – Ninguém peca praticando a virtude; porque, segundo Agostinho, ninguém pode usar mal da virtude. Ora, é possível pecar­se por continência; por exemplo, no caso de desejarmos fazer um bem e nos contivermos e deixarmos de o praticar. Logo, a continência não é virtude.

3. Demais. – Nenhuma virtude nos afasta do lícito, mas só, do ilícito. Ora, a continência retrai o homem da prática de atos lícitos; assim, como diz a Glosa, pela continência nós nos abstemos também das coisas lícitas. Logo, a continência não é virtude.

Mas, em contrário. – Todo hábito meritório é virtude. Ora, tal e a continência; pois, como diz Andronico, a continência é um hábito, que não se deixa vencer do prazer. Logo, a continência é uma virtude.

SOLUÇÃO. – A denominação de continência vários a tomam em sentidos diversos. – Uns assim chamam a abstinência de todos os prazeres venéreos; e por isso o Apóstolo a une à castidade. E então a continência perfeita e, primariamente, a virgindade; e secundariamente, a viuvez. Por onde, o que se diz da continência também se diz da virgindade, da qual provamos acima ser virtude. – Outros denominam continência à resistência, que opomos às baixas concupiscências, que nos atacam com veemência. E neste sentido o Filósofo considera a continência; assim também as Conferências dos Padres. Neste sentido, a continência participa da natureza da virtude, pois, fortalece a razão contra as paixões, afim de não ser arrastada por elas; mas, não realiza perfeitamente a essência da virtude moral, que subordina à razão o apetite sensitivo de modo que nele não surjam paixões veementes contrárias à razão. E por isso o Filósofo diz, que a continência não é uma virtude, mas, um misto dela, por participar da virtude, de certo modo e, de certo outro, não. –­ Mas, em sentido mais lato, podemos tomar o nome de virtude no significado de qualquer princípio de obras meritórias; e então podemos considerar virtude a continência.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – O Filósofo condivide a continência com a virtude, no sentido em que ela não realiza a noção desta última.

RESPOSTA À SEGUNDA. – O homem é propriamente o que racionalmente é. Por isso dizemos que alguém se contém em si mesmo, quando se contém na obediência à razão. Ora, o que implica perversão da razão a esta não convém. Por onde, verdadeiramente continente só se chama quem se contém nos limites da razão reta; não quem se deixa levar por uma razão pervertida. Ora, à razão reta se opõem as baixas concupiscências; assim como à razão pervertida as boas. Por isso, o continente, própria é verdadeiramente falando, é o que persiste na razão reta e abstém–se das baixas concupiscências; não, porém o que persevera na razão pervertida e se abstém das boas concupiscências; pois, este poderá, antes, ser considerado como obstinado no mal.

RESPOSTA À TERCEIRA, – A Glosa, no lugar citado, se refere à concupiscência no primeiro sentido, no qual ela designa uma certa e perfeita virtude, pela qual nós nos abstemos não só dos bens ilícitos, mas ainda de todos os, embora lícitos, bens menores, afim de nos darmos totalmente aos bens mais perfeitos.

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