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Art. 2 – Se, a intemperança é um pecado pueril.

O segundo discute–se assim. – Parece que a intemperança não é um pecado pueril.

1. – Pois, àquilo do Evangelho – Se vos não converterdes e não vos fizerdes como meninos – diz Jerônimo, que a criança não persevera na tracúndia; ofendida, não guarda rancor; nem se compraz na vista de uma mulher bela ­  o que é contrário à intemperança. Logo, a intemperança não é um pecado pueril.

2. Demais. – A criança só tem a concupiscência natural; ora, poucos pecam por intemperança no tocante à essa concupiscência, como diz o Filósofo. Logo, a intemperança, não é um pecado pueril.

3. Demais. – As crianças devem ser criadas e nutridas. Ora, a concupiscência e o prazer, sobre os quais versa a intemperança, devemos sempre diminui–los e extirpa–Ios, conforme o Apóstolo: Mortificai os vossos membros, que estão sobre a terra, a concupiscência, etc. Logo, a intemperança não é um pecado pueril.

Mas, em contrário, diz o Filósofo que a denominação de intemperança nós a aplicamos aos pecados pueris.

SOLUÇÃO. – A palavra – pueril é susceptível de dupla significação. Num sentido, significa o conveniente à criança. E, nesse, o Filósofo não quer dizer que a intemperança seja um pecado pueril. – Noutro, implica uma certa semelhança. E, neste, os pecados da intemperança se chamam pueris. Pois, o pecado da intemperança é um pecado de concupiscência supérflua, que é comparável ao proceder da criança, de três modos.

Primeiro, pelo que uma e outra desejam; pois, como a criança, assim também a concupiscência deseja o desonesto. E a razão é que, o belo, nas coisas humanas, consiste em ser ordenado segundo a razão. Por isso, Túlio diz, o belo é o consentâneo com a excelência do homem, por onde a sua natureza difere da dos brutos. Ora, a criança não atende à ordem da razão. E, do mesmo modo, a concupiscência não ouve a razão, como diz o Filósofo.

Segundo, quanto às consequências. Pois, a criança a que se lhe faz a vontade, quer que lha façamos cada vez mais; donde o dito da Escritura: Um cavalo indómito faz–se intratável e um filho deixado à sua vontade sairá precipitado. Assim também a concupiscência; a que satisfazemos cada vez mais se fortalece; donde o dizer Agostinho: A concupiscência a que cedemos transforma–se em costume; e o costume a que não resistimos, faz–se necessidade.

Terceiro, quanto ao remédio que a ambos se aplica. Assim, a criança se emenda, quando castigada, conforme àquilo da Escritura: Não queiras subtrair a correção ao menino; tu o o fustigarás com a vara e livrarás a sua alma do inferno. Do mesmo modo, resistindo à concupiscência, reduzimo–Ia aos limites devidos, Por isso, diz Agostinho, que o espírito afeito às coisas espirituais e nelas permanentemente fixo quebra o ímpeto do costume, isto é, da concupiscência carnal, o qual aos poucos reprimido, se extingue; pois, mais forte, quando lhe obedecíamos, já é certamente menor, embora não de todo nulo, quando o refreamos. Donde o dizer o Filósofo, que assim como a criança deve viver segundo as prescrições do mestre, assim o concupiscível deve estar em consonância com a razão.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÁO. – A objecção colhe se considerarmos pueril o que é próprio da criança. Mas, neste sentido, não chamamos pueril ao pecado da intemperança, senão só por semelhança, como dissemos.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Qualquer concupiscência pode chamar–se natural de dois modos. – De um modo, genericamente. E, então, a temperança e a intemperança são relativas às concupiscências naturais: pois, regulam as concupiscências do comer e do sexo, ordenadas à conservação da natureza. Noutro sentido, podemos considerar–se a concupiscência natural, especificamente, como á que tem por objeto o que a natureza exige para a sua própria conservação. E, nesse sentido, não é fácil pecarmos nessa matéria, da concupiscência naturais. Pois, a natureza não exige senão o necessário à sua subsistência; e não há lugar para o pecado se agirmos de acordo com essas exigências, salvo se houver excesso na quantidade; que é o único meio de pecarmos em matéria da concupiscência natural, como diz o Filósofo. Mas, o que dá muitas ocasiões ao pecado são certas provocações à concupiscência, procuradas pela indústria humana; assim, os alimentos refinadamente preparados e as mulheres ornadas. E embora, de ordinário, as crianças não busquem tais coisas, contudo, chamamos à intemperança pecado pueril pela razão já exarada.

RESPOSTA À TERCEIRA. – O que é próprio da natureza, devemos favorecer e promover, na criança. Mas, o que têm elas de irracional, isso não lhe devemos favorecer mas emendar, como dissemos.

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