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Art. 4 – Se é útil fazer voto.

O quarto discute–se assim, – Parece que não é útil fazer voto.

1. – Pois, nenhuma utilidade há em nos privarmos de um bem que Deus nos deu. Ora, a liberdade é um dos maiores dons que ele nos fez, e dela nos priva a obrigação imposta pelo voto. Logo, não nos é de nenhuma utilidade fazer voto.

2. Demais. – Ninguém deve expor–se a perigos. Ora, a perigo expõe–se quem faz voto; pois, o que, antes de tê–lo feito, poderia omitir sem perigo, já não o poderá depois que o fez. Por isso, Agostinho diz: Desde que fizeste voto te obrigaste e não te é lícito deixar de o cumprir. Não cumprindo o prometido, não estás na situação em que estarias se nenhum voto tivesses feito pois, se te tornou maior, também te fará pior. Mas, o que oxalá não seja, tendo quebrado a fidelidade para com Deus, serás tanto mais miserável, quanto serias feliz, se tivesses cumprido a promessa. Logo, de nada serve fazer voto.

3. Demais. – O Apóstolo diz: Sede meus imitadores, conto também eu sou de Cristo. Ora, a Escritura não menciona nenhum voto de Cristo ou dos Apóstolos, Logo, parece não ser útil fazer votos.

Mas, em contrário, a Escritura: Fazei votos ao Senhor vosso Deus e cumpri–os.

SOLUÇÃO. – Como já dissemos, o voto é uma promessa feita a Deus, Ora, uma é a razão de prometermos aos homens e outra, a de prometermos a Deus, Aos homens lhes prometemos para utilidade deles; pois, é–Ihes por igual útil o que lhes damos e os certificarmos, antes, do que futuramente lhes daremos. Ao contrário, fazemos promessa a Deus, para utilidade, não dele, mas, nossa. Por isso, diz Agostinho na citada epistola: Deus é um credor por beneficência e não por necessidade, que não aproveita do que recebe, mas antes, enriquece quem lhe paga as dívidas. E assim como o que damos a Deus é útil, não a ele, mas, a nós, por nos enriquecer a nós o débito que lhe pagamos a ele, como diz Agostinho no mesmo lugar, assim também, a promessa pela qual votamos alguma coisa a Deus não redunda em utilidade sua, porque não precisa de ser certificado da nossa boa vontade, mas, em utilidade nossa, porque, fazendo um voto, confirmamos imovelmente a nossa vontade naquilo que nos importa fazer. Logo, é útil fazer voto.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – Assim como a impossibilidade de pecar não nos diminui a liberdade, assim também não nô–la diminui a necessidade que confirma a vontade no bem, como o demonstra Deus e os santos. E tal é a necessidade imposta pelo voto, tendo assim uma certa semelhança da confirmação dos bem­aventurados no bem. Donde dizer Agostinho, na mesma epístola: Feliz necessidade a que nos compele ao melhor.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Quando um perigo resulta de um ato, em si mesmo, então este não traz utilidade; tal o caso de quem atravessasse um rio por uma ponte arruinada. Mas se o perigo resulta da deficiência com que praticamos o ato, este, não deixa por isso, de ser útil. Assim, é útil montar a cavalo embora se corra o perigo de cair dele. Pois, do contrário, deveríamos deixar de praticar qualquer ato bom por poderem eventual e acidentalmente, ser perigosos. Por isso, diz a Escritura: O que observa o vento não semeia e o que considera as nuvens nunca segará. Ora, o perigo que corre quem faz um voto não resulta do voto em si mesmo, mas, do homem que muda de vontade, deixando de cumpri–lo. Por isso, Agostinho diz, na mesma epístola: Não te arrependas de haver feito um voto. Ao contrário, alegra–te, por já não ter ser lícito o que t’o seria em teu detrimento.

RESPOSTA À TERCEIRA. – A Cristo, por natureza, não lhe cabia fazer voto, quer por ser Deus, quer também porque, como homem, tinha a vontade confirmada no bem, corno possuidor da visão beatífica. Embora, por uma certa semelhança, segundo a Glosa, é que a Escritura diz da pessoa dele: Eu cumprirei os meus votos em presença dos que o temem. Mas se lhe refere ao corpo, que é a Igreja. – Quanto aos Apóstolos, pode–se dizer que fizeram voto ele perfeição espiritual, quando, tendo abandonado tudo, seguiram a Cristo.

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