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Art. 5 — Se Cristo devia declarar com provas a verdade da sua ressurreição.

 O quinto discute-se assim. — Parece que Cristo não devia declarar com provas a verdade da sua ressurreição.

1. — Pois, diz Ambrósio: Deixa-te de provas, quando se trata da fé. Ora, a ressurreição de Cristo é matéria de fé. Logo, não é susceptível de provas.
 
2. Demais. — Gregório diz: Nenhum mérito tem a fé, quando a razão humana se funda na experiência. Ora, Cristo não devia privar-nos do mérito da fé. Logo, não devia confirmar com provas a sua ressurreição.
 
3. Demais. — Cristo veio ao mundo para tornar possível aos homens a aquisição da felicidade, segundo a Escritura: Eu vim para terem a vida e para terem em maior abundância. Logo, parece que Cristo não devia manifestar com provas a sua ressurreição.
 
Mas, em contrário, a Escritura refere que Cristo apareceu aos discípulos por quarenta dias, com muitas provas, falando-lhes do reino de Deus.
 
SOLUÇÃO. — O vocábulo - prova - é susceptível de duplo sentido. Num, assim se chama qualquer razão que nos leve a dar fé a uma causa duvidosa. Noutro, é às vezes um sinal sensível que induz a manifestação de alguma verdade; assim, Aristóteles nas suas obras usa às vezes ao referido vocábulo neste sentido. Ora, tomando a palavra no primeiro sentido, Cristo não deu aos seus discípulos prova da sua ressurreição. Porque tal prova seria um argumento resultante de determinados princípios: e estes, não sendo conhecidos dos discípulos, nada por eles se lhes poderia provar, pois, do desconhecido não podemos tirar nenhum conhecimento. E, de outro lado, se lhes fossem conhecidos, não transcenderiam a razão humana e portanto, não seriam eficazes para fundar a fé na ressurreição, que excede a nossa razão: pois os princípios devem ser do mesmo gênero que as coisas que pretendem provar, como diz Aristóteles. Ora, Cristo provou aos discípulos a sua ressurreição pela autoridade da Sagrada Escritura, fundamento da fé, quando disse: Era necessário que se cumprisse tudo o que de mim estava escrito na lei de Moisés, nos profetas e nos salmos.
Mas, se considerarmos a prova na segunda acepção então dizemos que Cristo declarou por provas a sua ressurreição, porque mostrou por certos sinais evidentíssimos, que verdadeiramente ressurgiu. Por isso, o grego, em lugar de dizer como a vulgata - com muitas provas - diz TfXJJ.'YJPW'" isto é, sinal evidente para provar. E esses sinais de ressurreição Cristo os manifestou aos discípulos, por duas razões. Primeiro, porque os corações deles não estavam dispostos a dar fàcilmente fé à ressurreição. Por isso Cristo lhes disse: ó estultos e tardas de coração para crer! E noutro lugar o Evangelho diz que Cristo lhes lançou em rosto a sua incredulidade e dureza de coração.  Segundo, para que, mediante tais sinais a eles manifestados, o testemunho que dessem fosse mais eficaz, segundo aquilo da Escritura: O que vimos e ouvimos e palparam as nossas mãos, disso damos testemunho.
 
DONDE RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO.  Ambrósio, no lugar citado, funda-se em argumentos baseados na razão humana. Os quais não são válidos para demonstrar as coisas da fé, como dissemos. 



RESPOSTA À SEGUNDA. — O mérito da fé está em crermos por ordem de Deus o que não vemos. Por onde, só exclui o mérito aquela razão que no, dá a ver pela ciência o que nos foi proposto a crer; e tal é a razão demonstrativa. Ora, a tais razões Cristo não recorreu para declarar a sua ressurreição.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Como dissemos, o mérito da beatitude, cuja causa é a fé, não fica totalmente excluído, salvo se não quiséssemos crer senão no que vemos. O fato porém de alguém crer o que não vê, mediante sinais visíveis, não elimina totalmente a fé nem o seu mérito. Assim Tomé, a quem o Senhor disse - Porque me viste, creste, viu uma causa e creu outra: viu as chagas e creu em Deus. É, porém fé mais perfeita a que, para crer, não exige esses auxílios. Por isso, para arguir a falta de fé em certo, o Senhor disse: Vós, se não vedes milagres e prodígios, não credes. E, assim sendo, podemos entender que os de alma pronta a crer a Deus, mesmo sem nenhuns sinais visíveis, são bem-aventurados, por comparação com os que não crêem sem que vejam tais sinais. 
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