Skip to content

Art. 2 — Se à Santa Virgem a anunciação devia ser feita por um anjo.

 O segundo discute-se assim. — Parece que à Santa Virgem a anunciação não devia ter sido feita por um anjo.

1. — Pois, aos anjos supremos a revelação se faz imediatamente por Deus, como diz Dionísio. Ora, a Mãe de Deus foi exaltada acima de todos os anjos. Logo, parece que o mistério da Encarnação devia ter-lhe sido feito imediatamente por Deus e não, por um anjo.
 
2. Demais. — Se nesta matéria era necessário observar a ordem comum, pela qual as coisas divinas são reveladas aos homens pelos anjos, semelhantemente devem tais coisas ser reveladas a uma mulher, por um homem; donde o dizer o Apóstolo: As mulheres estejam caladas nas igrejas, e se querem aprender alguma coisa, perguntem-na em casa aos seus maridos. Logo, parece que à Santa Virgem devia ter sido anunciado o mistério da Encarnação por algum homem, sobretudo que José, seu marido, foi nesse assunto instruído pelo Anjo, como se lê no Evangelho.
 
3. Demais. — Ninguém pode anunciar convenientemente o que ignora. Ora, mesmo os anjos supremos não conheceram plenamente o mistério da Encarnação; por isso Dionísio diz que da pessoa deles se deve entender a pergunta da Escritura – Quem é este que vem de Edom? Logo, parece que por nenhum anjo podia ser convenientemente anunciada a realização da Encarnação.
 
4. Demais. — Coisas maiores devem ser anunciadas por maiores embaixadores. Ora, o mistério da Encarnação é o máximo, dos anunciados aos homens, pelos anjos. Logo, parece que se por algum anjo devia ser anunciado, este deveria ser um dos da ordem suprema. Ora, Gabriel não é da ordem suprema, mas da ordem dos arcanjos, que é a penúltima. Por isso a Igreja canta: Sabemos que, mandado por Deus, Gabriel Arcanjo te anunciou. Logo, essa anunciação não foi convenientemente feita, por meio de Gabriel Arcanjo.
 
Mas, em contrário, o Evangelho: Foi enviado por Deus o anjo Gabriel, etc.
 
SOLUÇÃO. — Foi conveniente que o mistério da Encarnação fosse anunciado à Mãe de Deus, por meio de um anjo, por três razões.  Primeiro, para que, assim, se observasse a ordem divina, pela qual as coisas divinas são transmitidas aos homens, mediante os anjos. Donde o dizer Dionísio, que do mistério divino do amor de Jesus foram primeiro instruídos os anjos; depois, por meio deles a graça desse conhecimento chegou até nós. Assim, pois, o diviníssimo Gabriel anunciou a Zacarias que dele havia de nascer um profeta: e a Maria, como nela se cumpriria o mistério Trierárquico da inefável formação de Deus.  Segundo, porque era conveniente a restauração do gênero humano, que Cristo havia de realizar. E por isso diz Beda: Convinha à restauração da humanidade, que um anjo fosse enviado por Deus à Virgem. que devia consagrar o parto de um Deus. Pois, a causa primeira da perdição da humanidade foi o diabo, quando mandou a serpente ir ter com a mulher a fim de enganá-la com o espírito de soberba.  Terceiro, porque convinha à virgindade da Mãe de Deus. E por isso diz Jerônimo: Foi bem o anjo ter sido enviado à Virgem, pois, a virgindade é cognata da natureza angélica. Pois, na verdade, viver na carne, como se esta não existisse, não é vida terrena, mas celeste.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — A Mãe de Deus era superior aos anjos quanto à dignidade, para que Deus a elegeu. Mas, quanto ao estado da vida presente, era inferior aos anjos; pois, o próprio Cristo, em razão da sua vida passível, por um pouco foi feito menor que os anjos, na frase do Apóstolo. Contudo, como Cristo foi ao mesmo tempo mortal e bem-aventurado, não precisava ser instruído pelos anjos, quanto ao conhecimento das coisas divinas. Mas, a Mãe de Deus ainda não se achava no estado de bem-aventurança. Por isso, precisava ser instruída pelos anjos, quanto à sua divina conceição.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Como diz Agostinho, a Santa Virgem escapa a certas leis gerais humanas. Pois, nem teve muitas concepções, nem viveu sob poder de um homem, isto é, de um marido, ela que, conservando a sua virgindade íntegra, concebeu Cristo, do Espírito Santo. Por isso não lhe devia ser instruída no mistério da Encarnação, por nenhum homem, mas pelo anjo. E por isso também foi ela instruída nele, antes de José; pois, ao passo que o foi antes da sua concepção, José só depois dela o foi.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — Como é claro pela autoridade citada de Dionísio, os anjos conheceram o mistério da Encarnação; contudo interrogavam, desejando saber, de Cristo, mais perfeitamente, as razões desse mistério, que são incompreensíveis a todo intelecto criado. Por isso Máximo diz, que não podemos duvidar se os anjos conheceram a Encarnação futura. Mas escapou-lhes a investigável concepção do Senhor, e o modo pelo qual o Filho, todo inteiro no Pai que o engendrou, podia também ficar inteiramente em todos, e mesmo num seio virginal.
 
RESPOSTA À QUARTA. — Certos afirmam que Gabriel era da suprema ordem dos anjos, fundados no dito de Gregório: Era digno de ter vindo o anjo supremo a anunciar o sumo dos mistérios. Mas, daí não se conclui que fosse ele o supremo de todas as ordens, mas só quanto aos anjos; pois era da ordem dos arcanjos. Por isso, a Igreja lhe dá o nome de arcanjo e o próprio Gregório diz que se chamam arcanjos os que anunciam as coisas mais elevadas. É bastante crível, pois, que foi ele o primeiro na ordem dos arcanjos. E, como diz Gregório, esse nome lhe quadra ao ofício, pois, Gabriel significa força de Deus. E assim, onde, pela força de Deus devia ser anunciado aquele que, Senhor das virtudes e poderoso no combate, vinha para vencer os poderes do ar.
AdaptiveThemes