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Art. 1 — Se a penitência é uma virtude.

O primeiro discute-se assim. — Parece que a penitência não é uma virtude.
 
1. — Pois, a penitência é um sacramento enumerado entre os demais sacramentos; como do sobredito se colhe. Ora, nenhum outro sa­cramento é virtude. Logo, nem a penitência o é.
 
2. Demais. — Segundo o Filósofo, a vergo­nha não é virtude, tanto por ser uma paixão acompanhada de alteração corpórea, como tam­bém por não ser uma disposição de um ser em estado de perfeição; pois, tem por objeto atos vergonhosos, que não pratica o homem virtuoso. Ora, semelhantemente, a penitência é uma pai­xão acompanhada de alteração corpórea, a saber, as lágrimas; pois, como diz Gregório, fa­zer penitência é chorar os pecados passados. E também a penitência tem por objeto atos ver­gonhosos, isto é, os pecados, que um homem vir­tuoso não pratica. Logo, a penitência não é uma virtude.
 
3. Demais. — Segundo o Filósofo, ninguém que seja virtuoso é estulto. Ora, parece estulto chorar o pecado cometido e passado, que não pode deixar de ser o que é o que contudo cons­titui a penitência. Logo, a penitência não é virtude.
 
Mas, em contrário, os preceitos da lei têm por objeto os atos virtuosos; pois, o fim do legislador é tornar os cidadãos virtuosos, como diz Aristóteles. Ora, a lei divina preceitua a penitência, segundo aquilo do Evangelho - Fa­zei penitência, etc. Logo, a penitência é uma virtude.
 
SOLUÇÃO. — Como do sobredito resulta, a penitência tem por objeto a dor de um pecado que anteriormente cometemos. Ora, como já dissemos a dor ou a tristeza tem duplo sentido. - Num, é uma das paixões do apetite sensitivo. E, por aí, a penitência não é virtude, mas paixão. Noutro sentido, ela afeta a vontade; e então supõe uma certa eleição. E esta, sendo reta, necessariamente a penitência é um ato de vir­tude; pois, como diz Aristóteles, a virtude é um hábito eletivo segundo a razão reta. Ora, a razão reta exige que lamentemos o que deve­mos lamentar. E isso se dá com a penitência de que agora tratamos; pois, o penitente se en­trega a uma dor moderada dos pecados passados, com a intenção de não tornar a os cometer. Por onde é manifesto, que a penitência, no caso vertente, ou é virtude, ou um ato de virtude.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Como dissemos, os atos humanos constituem a matéria da penitência; o que não se dá com o batismo nem com a confirmação. Por onde, sendo a virtude o princípio de determinados atos, a penitência, mais que o batismo ou a confirmação, é uma virtude, ou é acompanhada desta.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — A penitência, como paixão, não é virtude, como dissemos. Como tal, é acompanhada de alteração corporal. Mas é virtude enquanto li, vontade se decide fundada numa eleição reta. - O que porém podemos dizer, antes, da penitência, que da vergonha. Pois, a vergonha tem por objeto um ato ver­gonhoso presente, por causa do qual tememos a confusão, ao passo que a penitência, um ato passado. Ora, é contra a perfeição da virtude o sermos o autor de um ato vergonhoso pre­sente do qual devamos nos envergonhar. Mas não é contra a perfeição da virtude o termos cometidos, antes, atos vergonhosos de que de­vamos mais tarde fazer penitência, quando, de viciosos, passarmos a ser virtuosos.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — Lamentarmos o que já cometemos com a intenção de envidar esfor­ços para que deixe de ser o que foi feito, seria estulto. Ora, tal não é a intenção do penitente. Pois, a sua dor é uma displicência ou reprova­ção do fato passado com a intenção de lhe evitar a conseqüência, a saber, a ofensa a Deus e o reato da pena. E isto não é estulto.

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