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Category: Papa FranciscoConteúdo sindicalizado

Breve anotações sobre a nova doutrina bergogliana sobre a pena de morte

Pe. Mauro Tranquillo, FSSPX

 

Já analisamos aqui o fundo modernista da nova doutrina do Papa que condena a pena de morte. Vimos que, ao contrário, a doutrina da Igreja, fundada sobre a Revelação, a considera lícita. Ainda assim, falta fazer algumas outras observações sobre o escrito pontifício de 01/08/2018 e o discurso que o anunciava em 11/10/2017.

1. Em 1962, para mudar a doutrina (liberdade religiosa, ecumenismo, colegialidade, etc) foi preciso um Concílio ecumênico. Ainda em 2016, para dar a comunhão aos divorciados recasados, foi preciso um sínodo. Este enésimo vulnus  formal no ensinamento da Igreja se fez, ao contrário, com um simples ato administrativo de uma Congregação Romana, depois de uma audiência com o Papa. Além disso, não constam até o momento reações ou “dúbia” de prelados “conservadores”. (Continue a leitura)

Pena de morte, modernismo e Papa Francisco

Pe. Mauro Tranquillo, FSSPX

Com uma mensagem ex audientia Sanctissimi, a Congregação da Doutrina da Fé nos informou que um outro elemento da religião católica deve se considerar modificado oficialmente: a doutrina sobre a licitude da pena de morte.

O Catecismo publicado por João Paulo II, mesmo contendo inovações conciliares, ainda admitia (ainda que de maneira mais teórica) que a autoridade estatal pudesse cominar a pena capital em casos gravíssimos. Ao contrário, a modificação do número 2267 do referido catecismo nos diz que, contrariamente ao afirmado no passado, “a Igreja ensina, à luz do Evangelho, que ‘a pena de morte é inadmissível porque atenta contra a inviolabilidade e dignidade da pessoa’ e se empenha com determinação na sua abolição em todo o mundo” Especifica-se, seguindo a doutrina conciliar, que a dignidade humana nunca se perde, nem mesmo por crimes gravíssimos (Santo Tomás ensinava o oposto).

Francisco afirma que concubinos podem ter a "graça do verdadeiro matrimônio".

                             

Nosso Senhor comandou a Pedro que confirmasse seus irmãos na Fé (S. Lucas 22,32), mas Francisco deleita-se em fazer todo o contrário.

Em 16 de junho, em uma sessão de perguntas e respostas durante conferência em Roma, Francisco sinalizou que quem vive em "fiel" concubinato recebe a "graça do verdadeiro matrimônio por causa de sua fidelidade". Mas, ao contrário do que afirma o Papa, o concubinato nunca traz consigo a graça do verdadeiro matrimônio, pelo fato de em si ser uma desgraça.

Na continuação de três anos de comentários irresponsáveis, que provocam escândalos em escala mundial, Francisco falou da situação na Argentina, onde a maioria dos que freqüentam aulas de preparação para casamento vive em concubinato.  Conforme o registro de Catholic News Agency:   Leia mais

 

Sobre "Traditionis custodes"

texto tirado do site oficial da FSSPX Brasil:

“ESSA MISSA, NOSSA MISSA, DEVE SER REALMENTE PARA NÓS COMO A PÉROLA DO EVANGELHO PELA QUAL TUDO RENUNCIAMOS, PELA QUAL ESTAMOS PRONTOS A VENDER TUDO.”

Caros membros e amigos da Fraternidade Sacerdotal São Pio X,

O motu proprio Traditionis custodes e a carta que o acompanha causaram uma agitação profunda no ambiente dito ‘tradicionalista’. Pode-se notar, com boa lógica, que a era da hermenêutica da continuidade — com seus equívocos, ilusões e esforços impossíveis — acabou tragicamente, sendo posta de lado. Essas medidas, tão claras e nítidas, não tocam diretamente a Fraternidade São Pio X, mas devem ser para nós ocasião de uma reflexão profunda. Para fazer isso, é necessário elevar-nos aos princípios e colocarmo-nos uma questão simultaneamente antiga e nova: por que a Missa tridentina é o pomo da discórdia depois de cinquenta anos?

Antes de tudo, devemos nos lembrar que a santa Missa é a continuação, nos tempos, da luta mais renhida que há: a batalha entre o Reino de Deus e o reino de Satanás, essa guerra que chegou ao ápice no Calvário, com o triunfo de Nosso Senhor. Foi para essa luta, e essa vitória, que Ele se encarnou. Visto que a vitória de Nosso Senhor foi obtida pela cruz e por seu sangue, é compreensível que sua perpetuação aconteça, também, por meio de lutas e contrariedades. Todo cristão é chamado a esse combate: Nosso Senhor nos chama porque disse que “veio à terra para trazer a espada” (Mt 10, 34). Não é surpreendente que a Missa de sempre, que exprime perfeitamente a vitória definitiva de Nosso Senhor sobre o pecado, por seu sacrifício expiatório, seja ela mesma um sinal de contradição.

Contudo, por que essa Missa se tornou sinal de contradição dentro da própria Igreja? A resposta é simples, e cada vez mais clara. Depois de cinquenta anos, os elementos da resposta são evidentes para todos os católicos de boa vontade: a Missa tridentina expressa e veicula uma concepção da vida cristã — e, consequentemente, uma concepção de Igreja — que é absolutamente incompatível com a eclesiologia que procede do Concílio Vaticano II. O problema não é simplesmente litúrgico, estético, ou meramente formal. O problema é simultaneamente doutrinal, moral, espiritual, eclesiológico e litúrgico. Em poucas palavras, é um problema que toca todos os aspectos da vida da Igreja, sem exceção: é uma questão de fé.

De um lado encontra-se a Missa de sempre, estandarte de uma Igreja que enfrenta o mundo e que está certa de sua vitória, porque sua batalha não é outra que a continuação daquela que Nosso Senhor realizou para destruir o pecado e o reinado de Satanás. É pela Missa, e através da Missa, que Nosso Senhor alista as almas cristãs no seu próprio combate, fazendo que participem tanto de sua cruz como de sua vitória. De tudo isso decorre uma ideia fundamentalmente militante da vida cristã. Duas notas a caracterizam: o espírito de sacrifício e uma esperança inabalável.

Do outro lado ergue-se a Missa de Paulo VI, expressão autêntica de uma Igreja que busca estar em harmonia com o mundo, que dá ouvidos às exortações do mundo; uma Igreja que, em última instância, não tem mais de combater o mundo porque não tem mais nada a repreender; uma Igreja que não tem mais o que ensinar porque escuta os poderes desse mundo; uma Igreja que já não precisa do sacrifício de Nosso Senhor porque, tendo perdido a noção de pecado, não tem mais nada a expiar; uma Igreja que não tem mais como missão restaurar o reinado universal de Nosso Senhor, porque ela quer dar sua contribuição à construção de um mundo melhor, mais livre, mais igualitário, mais ecologicamente responsável; e tudo isso com recursos puramente humanos. À essa missão humanista a que se entregaram os homens da Igreja deve corresponder uma liturgia igualmente humanista e dessacralizada.

A batalha desses últimos cinquenta anos — que no dia 16 de julho teve um momento certamente significativo — não é a guerra entre dois ritos: é tão simplesmente a guerra entre duas concepções diferentes e opostas da Igreja e da vida cristã, absolutamente irredutíveis e incompatíveis entre si. Parafraseando Santo Agostinho, podemos dizer que duas Missas construíram duas cidades: a Missa de sempre construiu a cidade cristã, a nova Missa busca construir a cidade humanista e laica.

Se Deus permite tudo isso, é certamente por um bem maior. Antes de tudo para nós mesmos, que temos a oportunidade imerecida de conhecer a Missa tridentina e dela nos beneficiarmos; possuímos um tesouro a que nem sempre damos o devido valor, e que poderíamos vir, talvez, a guardar por hábito. Ora, quando algo de grande prezo é atacado ou desprezado, apreciamos melhor seu valor. Possa esse “choque”, provocado pela dureza dos textos oficiais de 16 de julho, servir para que nosso amor pelo rito tridentino se renove, se aprofunde, seja redescoberto; essa Missa, nossa Missa, deve ser realmente para nós como a pérola do Evangelho pela qual tudo renunciamos, pela qual estamos prontos a vender tudo. Aquele que não está pronto para derramar seu próprio sangue por essa Missa não é digno de celebrá-la. Aquele que não está disposto a tudo renunciar para protege-la não é digno de assistir a ela.

Eis no que deve consistir nossa primeira reação perante os eventos que acabaram de sacudir a Igreja. Que nossa própria reação, padres e fiéis católicos, sobrepuje de longe — por sua profundidade e valor— os comentários de todo o tipo, cheios de inquietação e muitas vezes sem esperança.

Deus certamente visa outro objetivo ao permitir esse novo ataque contra a Missa tridentina. Ninguém pode duvidar que durante esses últimos anos, muitos padres e fiéis descobriram essa Missa, e que através dela se aproximaram de um novo horizonte espiritual e moral, que lhes abriu o caminho da santificação de suas almas. As últimas medidas que foram tomadas contra a Missa obrigarão tais almas a tirarem todas as consequências do que elas descobriram: cabe a elas, agora, escolherem — com os elementos de discernimento que têm à disposição — o que se impõe a toda consciência católica bem formada. Muitas almas encontrar-se-ão diante de uma escolha importante concernente à fé, porque — repetimos — a Missa é a expressão suprema de um universo doutrinal e moral. Trata-se, portanto, de escolher a fé católica em sua integridade, e por ela Nosso Senhor Jesus Cristo, sua cruz, seu sacrifício, sua realeza. Trata-se de escolher seu sangue, de imitar o Crucificado e de segui-lo até o fim por uma fidelidade total, radical, firme.

A Fraternidade São Pio X tem o dever de ajudar todas as almas que se encontram, atualmente, consternadas e confusas. Em primeiro lugar, temos o dever de oferecer-lhes, pelos próprios

fatos, a certeza que a Missa tridentina não poderá jamais desaparecer da face da terra: trata-se de um sinal de esperança extremamente necessário.

Ademais, é preciso que cada um de nós, padre ou fiel, estenda para essas almas uma mão amiga, porque aquele que não tem o desejo de partilhar dos bens com que se beneficia é, de fato, indigno deles. É somente desse modo que se amará verdadeiramente as almas e a Igreja. Porque cada alma que ganhemos para a cruz de Nosso Senhor, e para o amor imenso que manifestou por seu sacrifício, será uma alma verdadeiramente ganha para sua Igreja, para a caridade que a anima e que deve também ser nossa, especialmente neste momento.

Confiamos essas intenções à Mãe das Dores, é a ela que dirigimos nossas orações, afinal ninguém mais do que Ela penetrou no mistério do sacrifício de Nosso Senhor e de sua vitória na Cruz. Ninguém mais do que Ela esteve tão intimamente associada a seus sofrimentos e a seu triunfo. Foi em suas mãos que Nosso Senhor colocou a Igreja inteira; portanto, é a Ela que foi confiado o que a Igreja tem de mais precioso: o testamento de Nosso Senhor, o santo sacrifício da Missa.

Menzingen, 22 de julho de 2021
Na Festa de Santa Maria Madalena
Dom Davide Pagliarani, Superior-Geral

Não devemos nos render ao mundo, mas render todas as coisas a Cristo

Uma entrevista com o Superior Geral da Fraternidade Sacerdotal São Pio X sobre o pontificado do Papa Francisco

 

DICI: Reverendíssimo Padre, passaram-se oito anos desde que o Papa Francisco ascendeu ao trono de São Pedro, e, por ocasião desse aniversário, o sr., bondosamente, concedeu-nos essa entrevista, pela qual estamos verdadeiramente gratos.

Para alguns observadores do pontificado do Papa Francisco, particularmente para aqueles apegados à Tradição, parece que a batalha de ideias acabou. De acordo com eles, agora, há uma praxis que domina, a saber, a ação concreta, inspirada em um pragmatismo amplo. Qual sua opinião acerca disso?

Padre Pagliarani: Eu não tenho tanta certeza de que as ações e as ideias devam ser opostas dessa maneira. O Papa Francisco, definitivamente, é muito pragmático. Mas, sendo um homem de governo, ele sabe perfeitamente bem onde quer chegar. Uma ação de larga escala é sempre inspirada em princípios teóricos, em um conjunto de ideias, normalmente dominadas por uma ideia central, com a qual toda a praxis pode e deve estar relacionada.

Deve-se perceber que todas as tentativas de entender os princípios [por detrás] do pragmatismo do Papa Francisco ainda estão no âmbito da tentativa e erro. Por exemplo, algumas pessoas achavam que tinham encontrado os princípios norteadores de sua ação na teologia del pueblo, uma variação argentina da teologia da libertação – porém muito mais moderada. Parece-me, no entanto, que o Papa Francisco está além desse sistema, e mesmo além de qualquer sistema conhecido. Eu acredito que as ideias que direcionam suas ações não podem ser analisadas e interpretadas de maneira satisfatórias se nos limitarmos aos critérios teológicos tradicionais. Ele não apenas está além de qualquer sistema conhecido, está acima deles!

 

O que o Sr. quer dizer com isso?

Com o Papa João Paulo II, por exemplo -- apesar de tudo que pode ser deplorado em seu pontificado -- certos pontos da doutrina católica permaneciam incólumes. Com o Papa Bento XVI, lidávamos com um espírito apegado às raízes da Igreja. Seu esforço considerável de realizar a quadratura do círculo, ao tentar reconciliar a Tradição com os ensinamentos conciliares ou pós-conciliares, embora condenado ao fracasso, revelavam contudo uma preocupação com a fidelidade à Tradição. Mas, com o Papa Francisco, essa preocupação não existe mais. O pontificado sob o qual vivemos é um ponto de virada histórico para a Igreja Católica: bastiões que ainda existiam, foram agora demolidos para sempre – humanamente falando; e, ao mesmo tempo, a Igreja redefiniu, ao revolucioná-la, sua missão em relação às almas e ao mundo.

Ainda é muito cedo para analisar o escopo integral dessa sublevação, mas já podemos tentar analisá-la.

 

O Sr. disse que os bastiões que ainda existiam foram demolidos. Que bastiões são esses?

Estou me referindo, de maneira particular, aos fundamentos morais últimos sobre os quais não apenas a sociedade cristã, mas qualquer sociedade natural se estabelece. Estava fadado a acontecer mais cedo ou mais tarde, era uma questão de tempo. Até agora, embora sendo vaga às vezes, a Igreja ainda mantinha suas demandas morais de modo um tanto firme, por exemplo acerca do casamento católico. Ela ainda condenava todas as perversões sexuais… Mas essas demandas, infelizmente, eram baseadas em uma teologia dogmática que estava desviada de seu propósito e, portanto, tornada instável. Era inevitável que, um dia, tudo isso iria vacilar. Princípios sólidos de ação não podem se sustentar firmemente por muito tempo quando a ideia de seu Autor Divino é enfraquecida ou distorcida. Esses princípios morais poderiam sobreviver por algum tempo, até mesmo por algumas décadas, porém, privados de sua espinha dorsal, eles estavam condenados a, um dia, ser tachados de “ultrapassados” e negados na prática. É isso que estamos vendo com o pontificado do Papa Francisco, em particular com a exortação apostólica Amoris Laetitia, de 19 de março de 2016. Esse documento não apenas contém erros sérios: ele manifesta um approach novo, completamente historicista.

 

O que é esse novo approach? O que poderia ter determinado sua escolha?

O Papa Francisco tem uma visão geral muito precisa da sociedade contemporânea e da Igreja contemporânea – e mesmo da história como um todo. Ele me parece muito afetado por um tipo de hiperrealismo, uma espécie de hiperrealismo “pastoral”. De acordo com ele, a Igreja deve encarar a realidade: é impossível a ela continuar a pregar a doutrina moral como tem feito até hoje. Ela deve, portanto, render-se às demandas do homem moderno e, consequentemente, repensar seu papel como mãe.

É claro, a Igreja deve sempre ser mãe. Mas, ao invés de ser mãe ao transmitir a vida e ao educar os filhos, será mãe na medida em que saiba ouvir, compreender e acompanhar seus filhos… Essas preocupações, que não são más em si mesmas, devem ser compreendidas, aqui, em um novo e muito particular sentido: a Igreja Católica não pode mais – e, portanto, não deve mais – impor-se. Ela deve ser passiva e adaptar-se. É a vida eclesial, tal como é vivida atualmente, que condiciona e determina a missão da Igreja, e, até mesmo, sua raison d’être [propósito]. Por exemplo, como não pode impor as mesmas condições que impunha no passado para a recepção da Sagrada Comunhão, uma vez que o homem moderno as percebe como uma intolerância inaceitável, a única reação verdadeiramente cristã e realista, ao seguir essa lógica, consistiria em adaptar-se a essa situação e redefinir essas condições. Portanto, por força dos acontecimentos, a moral muda; as leis eternas, agora, estão sujeitas a uma evolução, que se torna necessária em razão de circunstâncias históricas e dos imperativos de uma falsa e mal-compreendida caridade.

 

Na sua opinião, o Papa se sente desconfortável com esse desenvolvimento? Sente necessidade de justificá-lo?

Sem a menor dúvida, o Papa devia estar ciente, desde o princípio, da reação que tal processo provocaria dentro da Igreja. Ele, provavelmente, também estava ciente do fato de que estava abrindo portas que, por mais de dois mil anos, haviam permanecido muito bem fechadas. Mas, para ele, as demandas dos tempos superam quaisquer outras considerações.

É nessa perspectiva que a ideia de “misericórdia” adquire seu valor e escopo completos. Essa ideia de “misericórdia” é onipresente em seus discursos. Ela não é mais a resposta de um Deus de amor, que acolhe o pecador arrependido com braços abertos, para o regenerar e dar-lhe a vida da graça de volta. Ela, agora, é uma misericórdia fatal, que se tornou necessária para satisfazer as necessidades urgentes da humanidade. Daqui em diante, considerados incapazes de respeitar até mesmo a lei natural, os homens têm o direito estrito de receber essa misericórdia, uma espécie de anistia condescendente de um Deus que também se adapta à história, sem dominá-la como antes.

Desse modo, não apenas a fé e a ordem sobrenaturais são abandonados, mas também os princípios morais indispensáveis a uma vida honesta e reta. Isso é assustador, porque significa a renúncia definitiva da cristianização da moral: ao contrário, os católicos, agora, devem adotar a moral do mundo, ou ao menos adaptar – de acordo com o caso concreto – a lei moral à moda atual, incluindo aquela dos casais divorciados “recasados” e mesmo dos casais de mesmo sexo.

Essa misericórdia, portanto, tornou-se uma espécie de panaceia, o fundamento de uma nova evangelização a ser proposta para um século que não pode mais ser convertido e a cristãos aos quais o jugo dos mandamentos não pode mais ser imposto. Dessa maneira, as almas em perigo, ao invés de serem encorajadas e fortalecidas em sua fé, são consoladas e confirmadas em sua situação pecaminosa. Ao agir assim, o guardião da fé revoga até mesmo a ordem natural, o que significa que mais nada sobrou.

O que subjaz esses erros é a ausência total de transcendência ou verticalidade. Não há mais nenhuma referência, mesmo implícita, ao sobrenatural, à nossa vida após esse mundo e, acima de tudo, à obra de Redenção de Nosso Senhor, que, de modo definitivo, deu a todos os homens os meios necessários para sua salvação. A eficácia perene desses meios não é mais pregada, nem mais reconhecida. Eles não acreditam mais neles! Consequentemente, tudo é reduzido a uma visão puramente horizontal e historicista, na qual as contingências prevalecem sobre os princípios, e na qual apenas o bem-estar terreno importa.

 

Esse "ponto de virada", que o Sr. mencionou, continua consistente com o Concílio Vaticano II, ou já pertence a um Concílio Vaticano III, que não aconteceu?

Há, ao mesmo tempo, continuidade com as premissas estabelecidas no Concílio e superação delas. Isso por uma razão muito simples: com o Concílio Vaticano II, a Igreja quis adaptar-se ao mundo, quis “atualizar-se” com o aggiornamento promovido pelos Papas João XXIII e Paulo VI. Agora, o Papa Francisco continua essa adaptação ao mundo, mas em um sentido novo e extremo: a Igreja, agora, deve adaptar-se aos pecados do mundo – ao menos quando o pecado for “politicamente correto”. O pecado, no entanto, é apresentado como uma expressão autêntica de amor, em todas as formas permitidas na sociedade contemporânea e, portanto, permitidas por um Deus misericordioso. São sempre analisados caso a caso, mas esses casos excepcionais estão destinados a se tornar a norma, como já podemos ver na Alemanha.

 

Paralelamente a essa aniquilação progressiva da moral tradicional, o Papa Francisco propõe valores a serem promovidos? Ou, para colocar de outra maneira, na sua opinião, sobre que fundamento ele quer construir?

Essa é uma pergunta muito pertinente, à qual o próprio Papa deu a resposta no dia 03 de outubro de 2020, na sua última encíclica Fratelli tutti, onde afirmou que “trata-se, sem dúvida, doutra lógica”; e ele continua, propondo que aceitemos “o desafio de sonhar e pensar numa humanidade diferente […] Esse é o verdadeiro caminho da paz”. Isso é o que se chama de uma utopia, e é isso que acontece a todos que se separam de suas raízes. O Santo Padre, rompendo com a Tradição Divina, aspira a uma perfeição ideal e abstrata, totalmente desconectada da realidade.

Reconhecidamente, na mesma passagem, defende sua posição, admitindo que o que diz “parecerá um devaneio”. Ele também especifica a base na qual ele quer justificar sua posição:  “o grande princípio dos direitos que brotam do simples fato de possuir a inalienável dignidade humana”. Mas, de modo preciso, a Revelação Divina e a Tradição Católica nos ensinam que a natureza humana e a dignidade humana não são autossuficientes. Como Chesterton diz, “retire o sobrenatural, e o que resta é antinatural”. Sem Deus, a natureza tende a se tornar, na prática, antinatural. Ao chamar e elevar o homem à ordem sobrenatural, Deus ordenou a natureza humana à graça. Portanto, a natureza não pode remover a ordem sobrenatural sem introduzir uma desordem profunda nela mesma. O sonho do Papa Francisco – sua “outra lógica” é profundamente naturalista.

Outro sinal desse caráter utópico, seu sonho toma um escopo universalista: é uma questão de o impor a todos, de maneira autoritária e absoluta. Sendo concebidos de maneira artificial, os sonhos só podem ser impostos de uma maneira artificial...

 

Mas em que consiste a utopia do Papa Francisco?

Em osmose perfeita com as aspirações do homem moderno, imbuído dos direitos que ele reivindica e separado de suas raízes, ela pode ser resumida em duas ideias: a da ecologia integral e a da fraternidade universal. Não é coincidência que o Papa tenha dedicado suas duas encíclicas chave a esses temas, que, como ele mesmo defende, caracterizam as duas principais partes do seu pontificado.

A ecologia integral de Laudato si (24 de maio de 2015) não é nada mais que uma nova moral proposta para toda a humanidade, deixando de lado a Revelação Divina e, portanto, o Evangelho. Seus princípios são puramente arbitrários e naturalistas. Eles se harmonizam, sem a menor dificuldade, com as aspirações ateístas de uma humanidade que está apaixonada pelo mundo na qual vive, e atolada em preocupações puramente materiais.

E a fraternidade universal de Fratelli tutti, defendida pelo Papa de modo muito solente na Declaração de Abu Dhabi, coassinada pelo Grande Imam de Al-Azhar (04 de fevereiro de 2019), não é nada mais que uma caricatura naturalista da fraternidade cristã, fundada na paternidade divina comum a todos os homens, salvo por Nosso Senhor Jesus Cristo. Essa fraternidade é, materialmente, idêntica à da Maçonaria, que, ao longo dos últimos dois séculos, não fez nada além de semear ódio, particularmente contra a Igreja Católica, em um desejo feroz de suplantar a única verdadeira fraternidade entre os homens possível.

Não é apenas a negação da ordem sobrenatural, reduzindo a Igreja Católica às dimensões de uma ONG filantrópica, mas também é uma falta de compreensão das feridas do pecado original e o esquecimento da necessidade da graça para restaurar a natureza decaída e para promover a paz entre os homens.

 

Nesse contexto, como pode o papel da Igreja ser distinguido do papel da sociedade civil?

Hoje, a Igreja Católica oferece a imagem de um poder sacerdotal a serviço do mundo contemporâneo e de suas necessidades sociopolíticas… Porém, esse sacerdócio não é mais dedicado à cristianização das instituições ou à reforma da moral, que se tornaram pagãos novamente. É um sacerdócio tragicamente humano, sem qualquer dimensão sobrenatural. Paradoxalmente, a sociedade civil e a Igreja, portanto, encontram-se, como no apogeu do Cristianismo, unidos, lutando lado a lado por objetivos comuns… Mas, dessa vez, é a sociedade secularizada que sugere e impõe suas visões e ideais à Igreja. Isso é verdadeiramente assustador: o humanitarismo secular tornou-se a luz da Igreja e o sal que lhe dá seu sabor. A debandada doutrinal e moral dos últimos anos é um bom exemplo do complexo de inferioridade que os homens da Igreja mantêm em relação ao mundo moderno.

E, ainda assim – esse é o mistério de nossa fé e, também, nossa esperança – a Igreja é Santa! Ela é Divina! Ela é Eterna! Apesar dos sofrimentos da hora presente, sua vida interior, em todas as suas dimensões mais elevadas, é, certamente, de uma beleza que delicia a Deus e aos anjos. Hoje, como em todos os tempos, a Igreja Católica dispõe completamente de todos os meios necessários para guiar e santificar as almas!

 

Na sua opinião, como a Igreja pode livrar-se desses erros e regenerar-se?

Primeiramente, devemos rejeitar todas as utopias e voltar à realidade, um retorno aos fundamentos da Igreja Católica. Podemos identificar três pontos chave que a Igreja deve recuperar e começar a pregar novamente, de maneira direta, sem qualquer concessão ou transigência: a existência do pecado original e de seus efeitos (que são a concupiscência tripla de que São João fala em sua primeira Epístola) – e isso é contrário a toda forma de ingenuidade naturalista; a necessidade da graça, fruto da Redenção, que é o único remédio – porém um remédio todo-poderoso – para triunfar sobre aqueles efeitos devastadores; e a transcendência dum fim último que não está nessa terra, mas no Céu.

Pregar isso novamente seria o princípio de “confirmar vossos irmãos”. A verdadeira fé católica seria, novamente, proclamada. É a condição necessária para qualquer vida sobrenatural. É, também, o guardião indispensável da lei natural, que também é divina, eterna e imutável em sua origem, o fundamento necessário para levar o homem à sua perfeição.

Esses três conceitos podem ser resumidos em um único ideal: o de Cristo Rei. Ele é a essência de nossa fé. Ele é o autor de toda a graça. Ele é o autor dessa lei natural que Ele insculpiu nos corações de todos os homens quando Ele os criou. O legislador divino não muda. Ele não renuncia a Sua autoridade. Assim como essa lei não pode ser alterada sem se alterar a própria fé, ela também não pode ser restaurada, sem restaurar ao divino legislador a honra que Lhe é devida.

Para colocar de maneira mais simples, não devemos nos render ao mundo, mas “render todas as coisas a Cristo”. É em Cristo Rei e através de Cristo Rei que a Igreja Católica tem todos os meios para vencer o mundo, cujo príncipe é o pai das mentiras. Através da Cruz, Ele já o venceu de uma vez por todas: “Eu venci o mundo”.

 

O Sr. acha que a Bem-Aventurada Virgem Maria terá um papel especial nessa vitória?

Como essa vitória é uma vitória de Cristo Rei, ela, necessariamente, também será de Sua Santa Mãe. Nossa Senhora é sistematicamente ligada a todas as batalhas e a todas as vitórias de seu Filho. Ela, certamente, estará ligada a essa de um modo muito especial, porque jamais antes houve um triunfo de erros tão sutis e perniciosos, que causaram uma devastação tão generalizada e profunda na vida concreta dos católicos. A prova disso é que, entre os títulos mais belos que a Igreja dá a Nossa Senhora, estão aqueles de “Destruidora de todas as heresias” - ela esmaga a cabeça daqueles que as concebem – e de “Auxílio dos cristãos”. Quanto mais a vitória de um erro parecer definitiva, mais gloriosa será a vitória da Bem-Aventurada Virgem Maria.

 

Essa entrevista ocorreu em Menzingen, no dia 12 de março de 2021,

Festa de São Gregório Magno, Papa

Como a revolução do Vaticano II serve à Nova Ordem Mundial

O texto a seguir é a íntegra da fala de Monsenhor Carlo Maria Viganò no evento Catholic Identity Conference (Conferência da Identidade Católica), ocorrido entre 23 e 25 de outubro de 2020 em Pittsburgh, estado da Pensilvânia. O original está disponível neste link: https://catholicfamilynews.com/blog/2020/10/26/scapegoating-francis-how-...

 

 

 

Como a revolução do Vaticano II serve à Nova Ordem Mundial

Arcebispo Carlo Maria Viganò, Núncio Apostólico

 

“Segui-me, e deixai os mortos enterrarem seus mortos”

Mt. 8:22

 

1. VIVEMOS TEMPOS EXTRAORDINÁRIOS

Como todos provavelmente já compreendemos, estamos em um momento histórico; fatos do passado, que pareciam desconectados, provaram, agora, estar inequivocamente conectados, tanto nos princípios que os inspiraram quanto nos objetivos que eles buscaram. Um olhar justo e objetivo à atual situação força a captar a perfeita coerência entre a evolução da estrutura política global e o papel que a Igreja Católica assumiu no estabelecimento da Nova Ordem Mundial. Para ser mais exato, falo do papel que a maioria aparente da Igreja, que, na realidade, é pequena numericamente, mas extremamente poderosa e que, por razões de concisão, resumirei com o título de deep church*1

Obviamente, não há duas Igrejas, algo que seria impossível, blasfemo e herético. Nem a verdadeira Igreja de Cristo fracassou na sua missão, transformando-se numa seita. A Igreja de Cristo não tem nada com aqueles que, nos últimos 60 anos, executaram um plano de ocupação dela. A sobreposição da hierarquia católica pelos membros da deep church não é um fato teológico, mas sim uma realidade histórica que desafia categorias usuais e, como tal, deve ser analizado.

Sabemos que os planos de uma Nova Ordem Mundial consistem no estabelecimento da tirania pela maçonaria: um projeto que remonta à Revolução Francesa, à Era das Luzes, ao fim das Monarquias Católicas, e à declaração de guerra à Igreja. Podemos dizer que a Nova Ordem Mundial é a antítese da sociedade cristã, que ela seria a realização da diabólica Civitas DiaboliCidade do Demôniocontraposta à Civitas DeiCidade de Deusno eterno combate entre Luz e Escuridão, Bem e Mal, Deus e Satã.

Nesse combate, a Providência colocou a Igreja de Cristo e, de modo particular, o Sumo Pontífice como kathèkon – isto é, aquele que se opõe à manifestação do mistério da iniquidade (2Ts 2: 6-7). E a Sagrada Escritura nos adverte que, quando da manifestação do Anticristo, esse obstáculo – o kathèkon – terá deixado de existir. Parece-me bastante evidente que o fim dos tempos está se aproximando diante dos nossos olhos, pois o mistério da iniquidade espalhou-se ao redor do mundo, com o desaparecimento da oposição corajosa do kathèkon.

A respeito da incompatibilidade da Cidade de Deus e da Cidade de Satã, o conselheiro Jesuíta de Francisco, Antonio Spadaro, põe de lado a Sagrada Escritura e a Tradição, adotando os embrassons-nous bergoglianos. De acordo com o Diretor de La Civiltà Cattolica, a encíclica Fratelli Tutti

“também é uma mensagem de forte valor político, porque – poderíamos dizer – ela inverte a lógica do apocalipse que prevalece hoje em dia. É a lógica fundamentalista que luta contra o mundo, porque ela acredita ser ele o oposto de Deus, isto é, um ídolo, e, portanto, algo que precisa ser destruído o quanto antes para acelerar o fim dos tempos. O abismo do apocalipse, na verdade, ante o qual não há mais irmãos: apenas apóstatas ou mártires correndo ‘contra’ o tempo […] Não somos militantes ou apóstatas, mas todos irmãos” [1]

Essa estratégia de descredibilizar o interlocutor com o estigma de “integralista”, evidentemente, tem o objetivo de facilitar a ação do inimigo dentro da Igreja, buscando desarmar a oposição e desencorajar qualquer dissensão. Também a encontramos na esfera civil, na qual os democratas e o deep state se arrogam o direito de decidir a quem dar legitimidade política e quem condenar, sem direito de recurso, ao ostracismo midiático. Esse método é sempre o mesmo, pois aquele que o inspira é o mesmo. Assim como a falsificação da História e das fontes é sempre a mesma: se o passado desautoriza a narrativa revolucionária, os seguidores da Revolução censuram o passado e substituem fato histórico por um mito. Até mesmo São Francisco é vítima dessa adulteração que faria dele o porta-voz da pobreza e do pacifismo, que são tão alheias ao espírito da ortodoxia católica quanto são essenciais à ideologia dominante. Prova disso é a última e fraudulenta citação do Poverello de Assis em Fratelli Tutti para justificar o diálogo, o ecumenismo e a fraternidade universal da anti-Igreja bergogliana.

Não cometamos o erro de apresentar os eventos atuais como “normais”, julgando o que acontece com parâmetros legais, canônicos e sociológicos que essa normalidade demandaria. Em tempos extraordinários – e a presente crise da Igreja é, de fato, extraordinária –, os eventos vão além do ordinário que nossos ancestrais conheceram. Em tempos extraordinários, vemos um Papa enganar os fiéis; vemos os Príncipes da Igreja acusados de crimes que, em outros tempos, teriam causado horror e atraído punições severas; contemplamos, em nossas Igrejas, ritos litúrgicos que parecem ter sido inventados pela mente perversa de Cranmer; vemos Prelados introduzir o ídolo imundo de pachamama na Basílica de São Pedro; e ouvimos o Vigário de Cristo pedir perdão aos adoradores desse simulacrum se um Católico o atira ao Tibre. Nesses tempos extraordinários, ouvimos um conspirador – Cardeal Godfried Danneels – dizer-nos que, desde a morte de João Paulo II, a Máfia de São Galo estava planejando eleger um deles para a Cátedra de Pedro, que terminou sendo Jorge Mario Bergoglio. Diante dessa revelação desconcertante, podemos perfeitamente ficar perplexos com o fato de que nem Cardeais, nem Bispos expressaram suas indignações, nem pediram que a verdade seja trazida à tona.

A coexistência do bem e do mal, dos santos e dos réprobos no corpo eclesial sempre acompanhou os acontecimentos terrenos da Igreja, a começar pela traição de Judas Iscariotes. E, de fato, tem muito significado que a anti-Igreja esteja tentando reabilitar Judas – e, juntamente com ele, os piores heresiarcas – como modelos exemplares, “anti-santos” e “anti-mártires” e, portanto, legitimizando a si mesmos em suas heresias, imoralidades e vícios. A coexistência – como eu dizia – dos bons e dos maus, da qual o Evangelho fala na parábola do joio e do trigo, parece ter se transformado na prevalência dos ruins sobre os bons. A diferença é que vícios e crimes antes detestados, hoje, são não apenas praticados e tolerados cada vez mais, mas até mesmo encorajados e louvados, enquanto a virtude e a fidelidade ao ensinamento de Cristo são menosprezados, ridicularizados e até condenados.

 

2. O ECLIPSE DA VERDADEIRA IGREJA

Por 60 anos, estamos testemunhando o eclipse da verdadeira Igreja por uma anti-Igreja que tem se apropriado de seu nome, ocupado a Cúria Romana e seus Dicastérios, Dioceses e Paróquias, Seminários e Universidades, Conventos e Mosteiros. A anti-Igreja usurpou a autoridade da verdadeira Igreja, e seus ministros trajam suas vestes sacras; ela usa o prestígio e o poder da Igreja para se apropriar de seus tesouros, ativos e finanças.

Assim como acontece na natureza, esse eclipse não toma lugar de uma vez só: ele sai da luz à escuridão quando um corpo celestial se insere entre o sol e nós. Esse é um processo relativamente lento, porém inexorável, no qual a lua da anti-Igreja segue sua órbita até cobrir o sol, gerando um cone de sombra que se projeta sobre a Terra. Hoje, estamos nesse cone sombrio doutrinal, moral, litúrgico e disciplinar. Ainda não é o eclipse total que veremos no fim dos tempos sob o reino do Anticristo. Mas é um eclipse parcial, que nos permite ver a coroa luminosa do sol circulando o disco negro da lua.

Esse processo que levou ao atual eclipse da Igreja começou com o modernismo sem a menor sombra de dúvidas. A anti-Igreja seguiu sua órbita apesar das condenações solenes do Magistério, que, àquela altura, brilhava com o esplendor da Verdade. Mas, com o Concílio Vaticano II, a escuridão dessa entidade espúria cobriu a Igreja. Inicialmente, ela obscureceu apenas uma pequena parte, mas a escuridão aumentou gradativamente. Quem apontava para o sol, dizendo que a lua o estava obscurecendo, era acusado de ser um “profeta da desgraça”, com aquelas formas de fanatismo e intemperança que advêm da ignorância e do preconceito. O caso do Arcebispo Marcel Lefebvre e de alguns outros prelados confirma, de um lado, a visão profética desses pastores e, de outro, a reação desarticulada de seus adversários, que, por medo de perderem poder, usaram toda a sua autoridade para negar as evidências e mantiveram suas verdadeiras intenções escondidas.

Para prosseguir na analogia: podemos dizer que, no céu da Fé, um eclipse é um fenômeno raro e extraordinário. Mas negar que, durante esse eclipse, a escuridão se espalha – simplesmente porque isso não aconteceria em circunstâncias ordinárias – não é um sinal de fé na indefectibilidade da Igreja, mas, em vez, uma negação obstinada da evidência, ou má-fé. A Santa Igreja, de acordo com as promessas de Cristo, jamais será derrotada pelas portas do inferno, mas isso não significa que ela não será – ou já está sendo – encoberta por uma falsificação infernal, aquela lua que, não por acaso, vemos sob os pés da Mulher da Revelação: “Depois apareceu no céu um grande sinal: uma mulher vestida de sol, com a luz debaixo de seus pés, e uma coroa de doze estrelas sobre a sua cabeça” (Rev 12:1)

A lua está debaixo dos pés da Mulher, que está acima de toda mutabilidade, acima de toda corrupção terrena, acima da lei do destino e do reino do espírito deste mundo. E isso porque essa mulher, que é, ao mesmo tempo, imagem de Maria Santíssima e da Igreja, está amicta sole, coberta com o Sol da Justiça que é Cristo, “isenta de todo o poder demoníaco, pois ela toma parte no mistério da imutabilidade de Cristo” (Santo Ambrósio). Ela permanece incólume, senão no seu reino militante, certamente no reino padecente do purgatório e no reino triunfante do Paraíso. São Jerônimo, comentando a Escritura, lembra-nos que “as portas do inferno são os pecados e vícios, especialmente os ensinamentos dos hereges”. Sabemos, portanto, que mesmo a “síntese de todas as heresias”, representada pelo modernismo e sua atualizada versão conciliar, jamais poderá obscurecer definitivamente o esplendor da Esposa de Cristo, mas apenas pelo breve período do eclipse que a Providência, em sua infinita sabedoria, permitiu, para tirar dele um bem maior.

 

3. O ABANDONO DA DIMENSÃO SOBRENATURAL

Nessa conferência, desejo, de maneira especial, falar da relação entre a revolução do Vaticano II e o estabelecimento da Nova Ordem Mundial. O elemento central dessa análise é trazer à tona o abandono, por parte da hierarquia eclesiástica, mesmo a do topo, da dimensão sobrenatural da Igreja e de seu papel escatológico. Com o Concílio, os inovadores apagaram a origem divina da Igreja do seu horizonte teológico, criando uma entidade de origem humana, semelhante a uma organização filantrópica. A primeira consequência dessa subversão ontológica foi a necessária negação do fato de que a Igreja de Cristo não está (e não poderia estar) sujeita a mudanças por parte daqueles que exercem autoridade vicariante em nome do Senhor. Ela não é propriedade do Papa, nem dos Bispos, nem dos teólogos e, assim, qualquer tentativa de “aggiornamento” a rebaixa ao nível de uma empresa que, para gerar lucro, renova sua oferta comercial, vende suas ações e segue a moda do momento. A Igreja, por sua vez, é uma realidade divina e sobrenatural: ela adapta sua maneira de pregar o Evangelho às nações, mas jamais pode mudar o conteúdo de um único iota (Mt 5:18), nem negar sua força transcendente ao se rebaixar a um mero serviço social. Do outro lado, a anti-Igreja, orgulhosamente, reivindica o direito de realizar uma mudança de paradigma não apenas mudando a maneira como a doutrina é exposta, mas a doutrina em si. Isso é confirmado pelas palavras de Massimo Faggioli sobre a nova encíclica Fratteli Tutti:

“O pontificado do Papa Francisco é como um novo padrão para os integralistas católicos e aqueles que igualam continuidade material e tradição: a doutrina católica não apenas se desenvolve. Às vezes, ela realmente muda: por exemplo, no tocante à pena de morte e à guerra” [2]

Insistir no que o Magistério ensina é inútil. A alegação descarada dos inovadores de ter direito de mudar a fé segue, obstinadamente, o approach modernista.

O primeiro erro do Concílio consiste, principalmente, na falta de uma perspectiva transcendente – resultado de uma crise espiritual que já estava latente – e na tentativa de criar um paraíso na terra, com um horizonte humano estéril. Na linha desse approach, Fratelli Tutti vê a realização de uma utopia terrena e a redenção social na fraternidade humana, pax œcumenica entre religiões e no acolhimento de imigrantes.

 

4. O SENTIMENTO DE INFERIORIDADE E INADEQUAÇÃO

Como eu já escrevi em outras ocasiões, as demandas revolucionárias da Nouvelle Théologie encontraram solo fértil nos Padres Conciliares em razão de um grave complexo de inferioridade em relação ao mundo. Houve um tempo, no período pós-guerra, quando a revolução conduzida pela maçonaria nas esferas civil, política e cultural penetraram na elite católica, persuadindo-a de sua inadequação face um desafio de sua época, que era inescapável. Ao invés de indagar a si mesmos e sua fé, essa elite – Bispos, teólogos, intelectuais – imprudentemente atribuiu responsabilidade pelo fracasso iminente da Igreja à sua sólida estrutura hierárquica e a seu ensinamento doutrinário e moral monolítico. Ao contemplar a derrota da civilização europeia que a Igreja havia ajudado a construir, a elite pensou que a falta de concordância com o mundo foi causada pela intransigência do Papado e pela rigidez moral dos Padres, que não desejavam fazer as pazes com o Zeitgeist e “abrirem-se”. Esse approach ideológico advém de uma falsa ideia segundo a qual, entre a Igreja e o mundo contemporâneo, pode haver uma aliança, uma consonância, uma amizade. Nada poderia estar mais distante da verdade, pois jamais haverá descanso na luta entre Deus e Satã, entre a Luz e a Escuridão. “Porei inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua posteridade e a posteridade dela. Ela te pisará a cabeça, e tu armarás traições ao seu calcanhar” (Gen 3:15). Essa é uma inimizade desejada pelo próprio Deus, que coloca Maria Santíssima – e a Igreja – como inimigos eternos da antiga serpente. O mundo tem seu próprio príncipe (Jo 12:31), que é o “inimigo” (Mt 13:28), um “homicida desde o princípio” (Jo 8:44) e um “mentiroso” (Jo 8:44). Pregar um pacto de não-beligerância com o mundo significa entrar em acordo com Satã. Isso arruína e perverte a própria essência da Igreja, cuja missão é converter o máximo de almas a Cristo para a maior glória de Deus, sem jamais abaixar as armas àqueles que querem atrai-las a si e à condenação.

O sentimento de inferioridade e de fracasso perante o mundo que a Igreja tem criou a “tempestade perfeita” para a revolução se enraizar nos Padres Conciliares e, por extensão, no povo cristão, no qual a obediência à Hierarquia havia sido cultivada, talvez, mais do que a fidelidade ao depositum fidei. Permitam-me ser mais claro: a obediência aos Pastores Sagrados certamente é louvável se as ordens são legítimas. Mas a obediência deixa de ser uma virtude e, na verdade, torna-se servilismo se ela se torna um fim em si mesma e se ela contradiz o propósito ao qual ela deveria estar ordenada, a saber, a Fé e a Moral. Devemos acrescentar que esse sentimento de inferioridade foi introduzido no corpo eclesial com mostras de grande pompa, como a remoção da tiara por Paulo VI, a devolução do estandarte Otomano conquistado em Lepanto, as espalhafatosas aproximações ecumênicas do cismático Atenágoras, os pedidos de perdão pelas Cruzadas, a abolição do Index, o foco do Clero nos pobres em lugar do dito “triunfalismo” de Pio XII. O coup de grâce dessa atitude foi codificado na liturgia reformada, que expressa sua vergonha do dogma católico ao silenciá-lo – e, portanto, ao negá-lo indiretamente. Essa mudança ritual engendrou uma mudança doutrinal, que levou os fiéis a acreditarem que a Missa é um simples banquete fraternal e que a Santíssima Eucaristia é um mero símbolo da presença de Cristo entre nós.

 

5. “IDEM SENTIRE” DA REVOLUÇÃO E DO CONCÍLIO

O sentimento de inadequação dos Padres Conciliares foi intensificado pelas obras dos inovadores, cujas ideias heréticas coincidiam com as demandas do mundo. Uma análise comparativa do pensamento moderno confirma o idem sentire [mesmo sentimento ou mesmo pensamento] dos conspiradores com cada elemento da ideologia revolucionária:

- a aceitação do princípio democrático como a fonte legitimadora do poder, no lugar do direito divino da Monarquia Católica (incluindo o Papado);

- a criação e acumulação de órgãos de poder, no lugar da responsabilidade pessoal e da hierarquia institucional

- a erosão do passado histórico, avaliado pelos parâmetros atuais, que não defendem a tradição e a herança cultural

- a ênfase na liberdade dos indivíduos e o enfraquecimento do conceito de responsabilidade e dever

- a evolução contínua da moralidade e da ética, agora privadas de sua natureza imutável e de qualquer referência ao transcendente

- a natureza secular do Estado, no lugar da devida submissão da ordem civil ao Reinado de Jesus Cristo e da superioridade ontológica da missão da Igreja sobre aquela da esfera temporal

- a igualdade das religiões não apenas perante o Estado, mas como um conceito geral ao qual a Igreja deve se conformar, contrária à defesa objetiva e necessária da verdade e da condenação do erro

- o falso e blasfemo conceito de dignidade do homem como conatural a ele, baseado na negação do pecado original e da necessidade da Redenção como pressupostos para agradar a Deus, assim merecendo Sua graça e atingindo a bem-aventurança eterna;

- a diminuição do papel das mulheres e um menosprezo ao privilégio da maternidade;

- o primado da matéria sobre o espírito;

- a relação fideísta com a ciência [3], face um criticismo impiedoso da religião baseado em falsos fundamentos científicos

Todos esses princípios, propagados pelos ideólogos da maçonaria e pelos apoiadores da Nova Ordem Mundial, coincidem com as ideias revolucionárias do Concílio:

- a democratização da Igreja começou com Lumen Gentium e, hoje, concretiza-se no caminho sinodal bergogliano;

-a criação e acumulação de órgãos de poder tem sido atingida delegando-se funções decisórias às Conferências Episcopais, aos Sínodos de Bispos, às Comissões, aos Concílios Pastorais, etc;

- o passado e as gloriosas tradições da Igreja são julgados de acordo com a mentalidade moderna e condenados para obter aprovação do mundo moderno;

- a “liberdade dos filhos de Deus” teorizada pelo Vaticano II tem sido estabelecida sem consideração alguma das obrigações morais dos indivíduos, que, de acordo com as fábulas conciliares, estão todos salvos independentemente das suas disposições interiores e do estado de suas almas;

- o ofuscamento de referências morais perenes tem levado à revisão doutrinária sobre a pena capital; e, com Amoris Laetitia, à admissão de adúlteros públicos aos sacramentos, assim rompendo o edifício sacramental;

- a adoção do conceito de secularismo tem levado à abolição da religião estatal nas nações católicas. Encorajada pela Santa Sé e pelo Episcopado, isso tem levado à perda da identidade religiosa e ao reconhecimento dos direitos das seitas, assim como à aprovação de normas que violam a lei natural e divina;

- a liberdade religiosa teorizada em Dignitatis Humanae é, hoje, levada às suas consequências lógicas mais extremas com a Declaração de Abu Dhabi e com a última encíclica, Fratelli Tutti, tornando a missão salvífica da Igreja e a até mesmo a Encarnação obsoletas;

- teorias sobre a dignidade humana na esfera católica têm levado a confusão quanto ao papel do laicato em relação ao papel ministerial do clero e ao enfraquecimento da estrutura hierárquica da Igreja. Enquanto isso, a adoção da ideologia feminista é um prelúdio à admissão das mulheres às Sagradas Ordenações;

- uma preocupação desordenada com as necessidades temporais dos pobres, tão típica das esquerdas, tem transformado a Igreja em uma associação assistencial, limitando sua ação à esfera meramente material, quase a ponto de abandonar a esfera espiritual;

- subserviência à ciência moderna e ao progresso tecnológico tem levado a Igreja a desautorizar a “Rainha das Ciências” [a fé], a “desmitificar” milagres, a negar a inerrância da Sagrada Escritura, a encarar os mistérios mais sagrados de nossa santa religião como “mitos” ou “metáforas”, sacrilegamente sugerindo que a transubstanciação e até mesmo a ressurreição são “magia” (expressão esta entendida não literal, mas simbolicamente) e a descrever os sublimes dogmas marianos como “tonterias” [tolices]

Há um aspecto quase grotesco desse rebaixamento da Hierarquia para se adequar ao pensamento corrente. O desejo da hierarquia de agradar a seus carrascos e de servir a seus inimigos sempre chega atrasado e fora de tempo, dando a impressão de que os Bispos são irremediavelmente atrasados, fora de sintonia com seus tempos. Eles são tão coniventes com sua própria extinção que nos levam a crer que essa demonstração de submissão cortesã ao politicamente correto advém não de uma verdadeira persuasão ideológica, mas do medo de serem deixados de lado, de perder poder e de não mais ter aquele prestígio que o mundo ainda lhes dá de qualquer maneira. Eles não percebem – ou não querem admitir – que o prestígio e autoridade que têm vêm da autoridade e prestígio da Igreja de Cristo, e não falsificação miserável e digna de pena que eles criaram.

Quando essa anti-Igreja estiver definitivamente estabelecida no eclipse total da Igreja Católica, a autoridade de seus líderes dependerá do grau de submissão à Nova Ordem Mundial, que não tolerará qualquer divergência de seu credo e aplicará impiedosamente esse dogmatismo, fanatismo e fundamentalismo que muitos Prelados e autoproclamados intelectuais criticam naqueles que permanecem fiéis ao Magistério hoje. Dessa maneira, a deep church continua a possuir a marca “Igreja Católica”, mas será escrava do pensamento da Nova Ordem, situação que remonta aos judeus, que, após negarem o Reinado de Cristo ante Pilatos, tornaram-se escravos da autoridade civil de seu tempo: “Não temos rei, senão César” (Jo 19:15). O César dos nossos tempos nos ordena fechar as Igrejas, vestir uma máscara e suspender as celebrações sob pretexto de uma pseudopandemia. O regime comunista persegue os católicos chineses, e o mundo não ouve nada além de silêncio vindo de Roma. Amanhã, um novo Tito saqueará o templo, transportando o espólio para algum museu, e a vingança divina através das mãos dos pagãos será realizada novamente.

 

6. O PAPEL DOS CATÓLICOS MODERADOS NA REVOLUÇÃO

Alguns dizem que os Padres Conciliares e os Papas que presidiram essa assembleia não perceberam as consequências que a sua aprovação dos documentos do Vaticano II teriam para o futuro da Igreja. Se esse foi o caso – isto é, se tivesse havido algum arrependimento posterior da aprovação apressada de textos heréticos ou próximos da heresia –, é difícil compreender por que eles não conseguiram fazer cessar, imediatamente, os abusos, corrigir os erros, esclarecer mal-entendidos e omissões. E, acima de tudo, é incompreensível por que a autoridade eclesiástica tem sido tão implacável com aqueles que defendem a Verdade Católica e, ao mesmo tempo, tem sido tão complacente com os rebeldes e hereges. De qualquer modo, a responsabilidade pela crise conciliar deve ser colocada sobre a Autoridade que, mesmo em meio a milhares de apelos à colegialidade e ao pastoralismo, tem protegido suas prerrogativas, exercendo-as apenas em uma direção, a saber, contra o pusillus grex [pequeno rebanho] e jamais contra os inimigos de Deus e da Igreja. As raríssimas exceções em que um teólogo herege ou um religioso revolucionário foram censurados pelo Santo Ofício apenas confirmam uma regra que tem sido aplicada por décadas; isso tudo sem mencionar que muitos deles têm sido reabilitados sem que precisassem abjurar de seus erros e foram até mesmo promovidos a posições institucionais na Cúria Romana ou no Pontifício Athenaeum.

Essa é a realidade de acordo com minha análise. Porém sabemos que, além da ala progressista do Concílio e da ala católica tradicional, há uma parte do episcopado, do clero e dos fiéis que tentam manter uma distância daquilo que consideram dois extremos. Estou me referindo aos chamados “conservadores”, isto é, um partido centrista do corpo eclesial que acaba servindo aos revolucionários porque, embora rejeitando seus excessos, compartilha dos seus princípios. O erro dos “conservadores” reside em dar uma conotação negativa ao tradicionalismo e em colocá-lo em um extremo oposto do progressismo. A aurea mediocritas [via media] deles consiste em, arbitrariamente, colocar-se não entre dois vícios, mas entre a virtude e o vício. Eles são aqueles que criticam os excessos de pachamama ou as declarações mais radicais de Bergoglio, mas não toleram que a autoridade do Concílio seja questionada, muito menos que se reconheça a conexão intrínseca entre o câncer conciliar e a atual metástase. A correlação entre conservadorismo político e conservadorismo religioso consiste em adotar a posição de “centro”, uma síntese entre a tese “direitista” e a antítese “esquerdista”, tudo de acordo com o approach hegeliano tão festejado pelos apoiadores moderados do Concílio.

Na esfera civil, o deep state tem causado dissensão política e social usando organizações e movimentos que se opõem apenas nas aparências, mas que, na realidade, são instrumentos de manutenção do poder. Semelhantemente, na esfera eclesial, a deep church usa os “conservadores” moderados para dar uma aparência de liberdade aos fiéis. O motu próprio Summorum Pontificum, por exemplo, embora dê liberdade para celebrar na forma extraordinária, exige saltem impliciter [ao menos implicitamente] que aceitemos o Concílio e reconheçamos a legalidade da liturgia reformada. Essa artimanha evita que aqueles que se beneficiam do Motu Proprio levantem qualquer objeção, pois isso ameaçaria a dissolução das comunidades Ecclesia Dei, e instiga no povo cristão a perigosa ideia de que uma coisa boa, para ter legitimidade na Igreja e na sociedade, necessariamente deve vir acompanhada de uma coisa ruim ou, ao menos, de algo menos bom. Porém, apenas uma mente transviada buscaria dar direitos iguais ao bem e ao mal. Não importa se alguém é pessoalmente a favor do bem, se ele reconhece a legitimidade daqueles que estão a favor do mal. Nesse sentido, a “liberdade de escolha” do aborto teorizada pelos políticos democratas encontra seu contrapeso na não menos aberrante “liberdade religiosa” teorizada pelo Concílio, que, hoje, é obstinadamente defendida pela anti-Igreja. Se não é permitido a um católico apoiar um político que defende o direito ao aborto, é menos permitido ainda aprovar um Prelado que defende a “liberdade” de um indivíduo de arriscar sua alma imortal ao “escolher” permanecer em pecado mortal. Isso não é misericórdia: isso é um grosseiro abandono do dever espiritual perante Deus para obter os favores e a aprovação dos homens.

 

7. “SOCIEDADE ABERTA” E “RELIGIÃO ABERTA”

Essa análise não poderia estar completa sem algumas palavras sobre a novilíngua tão popular na esfera eclesiástica. O vocabulário católico tradicional tem sido deliberadamente modificado para mudar o conteúdo que ele expressa. O mesmo tem acontecido na liturgia e na pregação, nas quais a clareza da exposição católica tem sido substituída por ambiguidade ou pela negação implícita da verdade dogmática. Os exemplos são inumeráveis. Esse fenômeno também remonta ao Vaticano II, que buscou desenvolver versões “católicas” dos slogans do mundo. De qualquer maneira, eu gostaria de enfatizar que todas essas expressões foram tomadas do léxico secularista e que também são parte da novilíngua. Pensemos na insistência de Bergoglio na “Igreja em saída”, na abertura como um valor positivo. Semelhantemente, agora cito Fratelli Tutti:

“Um povo vivo, dinâmico e com futuro é aquele que permanece constantemente aberto a novas sínteses, assumindo em si o que é diverso” (Fratelli Tutti, 160)

“A Igreja é uma casa com as portas abertas” (ibid. 276)

“Queremos ser uma Igreja que serve, que sai de casa, que sai dos seus templos, que sai das suas sacristias, para acompanhar a vida, sustentar a esperança, ser sinal de unidade (…) para lançar pontes, abater muros, semear reconciliação” (ibid.).

A Semelhança com a Sociedade Aberta almejada pela ideologia globalista de Soros é tão notável a ponto de quase constituir uma Religião Aberta que sirva de contraponto a ela.

E essa Religião Aberta está perfeitamente de acordo com as intenções do globalismo. Dos encontros políticos “para um Novo Humanismo”, abençoados pelos líderes da Igreja, à participação da intelligentsia progressista na propaganda verde, tudo segue o pensamento corrente, numa triste e grotesca tentativa de agradar ao mundo. O forte contraste com as palavras do Apóstolo é claro: “Porque agora, é o favor dos homens que eu procuro, ou o de Deus? Porventura é aos homens que eu pretendo agradar? Se agradasse ainda aos homens, não seria servo de Cristo” (Gal. 1:10)

A Igreja Católica está sempre sob os olhos de Deus; ela existe para Sua glória e para a salvação das almas. A anti-Igreja vive sob os olhos do mundo, para agradar à blasfema apoteose do homem e à condenação das almas. Durante a última sessão do Segundo Concílio Ecumênico do Vaticano, ante todos os Padres Conciliares, essas chocantes palavras de Paulo VI ressoaram na Basílica do Vaticano:

“A religião do Deus que se faz homem se encontrou com a religião (pois tal ela é) do homem que se faz Deus. E o que aconteceu? Houve um choque, um combate, uma condenação? Poderia ter havido, mas não houve. A velha história do Samaritano foi o modelo de espiritualidade do concílio. Um sentimento de simpatia ilimitada permeou-o inteiramente. A atenção de nosso concílio foi absorvida pela descoberta das necessidades humanas (e essas necessidades crescem na proporção da grandeza que o filho da terra reclama para si mesmo). Mas nós conclamamos àqueles que se proclamam humanistas modernos e que renunciaram aos valores transcendentes das realidades mais elevadas a dar crédito ao concílio por ao menos uma qualidade e a reconhecer nosso próprio novo humanismo: nós, também, de fato, mais que qualquer outro, honramos a humanidade” [4]

Essa simpatia – no sentido etimológico de  συμπάϑεια, isto é, participação no sentimento do outro – é a figura do Concílio e da nova religião (pois tal ela é) da anti-Igreja. Uma anti-Igreja nascida da união impura entre a Igreja e o mundo, entre a Jerusalém celeste e a Babilônia infernal. Notem bem: a primeira vez que um Pontífice mencionou o “novo humanismo” foi na sessão final do Vaticano II, e, hoje, nós o encontramos repetido como um mantra por aqueles que o consideram uma perfeita e coerente expressão da mens revolucionária [molde mental] do Concílio [5]

Sempre em vista dessa comunhão de intenções entre a Nova Ordem Mundial e a anti-Igreja, devemos lembrar o Compacto Global sobre a Educação, um projeto criado por Bergoglio “para causar uma mudança em escala planetária, para que a educação seja um gerador de fraternidade, paz e justiça. Uma necessidade ainda mais urgente nesses tempos marcados pela pandemia” [6] Promovido em colaboração com a Organização das Nações Unidades, esse “processo de formação no relacionamento e cultura de encontro também encontra lugar e valor numa ‘casa comum’ com todas as criaturas, pois as pessoas, uma vez formadas na lógica da comunhão e da solidariedade, já estão trabalhando para ‘recuperar a harmonia serena com a criação’” e para “configurar o mundo como um ‘espaço de verdadeira fraternidade’ (Gaudium et Spes, 37)” [7] Como podemos ver, a referência ideológica é sempre e apenas ao Vaticano II, porque apenas a partir daquele momento a anti-Igreja colocou o homem no lugar de Deus, a criatura no lugar do Criador.

O “novo humanismo”, obviamente, tem um aspecto ambiental e ecológico, no qual estão situados a Encíclica Laudato Sì e a Teologia verde – a “Igreja com um rosto amazônico” do Sínodo dos Bispos de 2019, com seu culto idolátrico da pachamama (mãe terra) na presença do Sinédrio Romano. A atitude da Igreja durante a Covid-19 demonstrou, de um lado, a submissão da hierarquia aos diktats do Estado, em violação à Libertas Ecclesiae, que o Papa deveria ter defendido firmemente. Também demonstrou a negação de qualquer dimensão espiritual da pandemia, substituindo a justa ira de Deus, ofendido pelos inumeráveis pecados da humanidade a das nações, por uma mais perturbadora e destrutiva fúria da Natureza, ofendida pela falta de respeito pelo ambiente. Eu gostaria de enfatizar que atribuir uma identidade pessoal à Natureza, quase dotada de intelecto e vontade, é um prelúdio à sua divinização. Nós já vimos um prelúdio sacrílego disso, debaixo do domo da Basílica de São Pedro.

A linha de fundo é esta: conformidade por parte da anti-Igreja com a ideologia dominante do mundo moderno cria uma verdadeira cooperação com poderosos representantes do deep state, a começar por aqueles trabalhando por uma “economia sustentável”, envolvendo Jorge Mario Bergoglio, Bill Gates, Jeffrey Sachs, John Elkann, Gunter Pauli [8].

É útil lembrar que a economia sustentável também tem consequências para a agricultura e o mundo do trabalho em geral. O deep state precisa garantir mão de obra barata através de imigração, o que, ao mesmo tempo, contribui para a neutralização das identidades religiosa, cultural e linguística das nações envolvidas. A deep church fornece uma base ideológica e pseudoteológica a esse plano de invasão, e, ao mesmo tempo, garante uma parte nos negócios lucrativos de hospitalidade. Podemos compreender a insistência de Bergoglio no tema dos migrantes, também reiterada em Fratelli Tutti: “Assim se difunde uma mentalidade xenófoba, de clausura e retraimento em si mesmos” (ibid. 39.) “As migrações constituirão uma pedra angular no futuro do mundo” (ibid. 40). Bergoglio usa a expressão “pedra angular”, alegando que não é possível imaginar um futuro sem migrações.

Permitam-me uma breve palavra sobre a situação política nos Estados Unidos às vésperas da eleição presidencial. Fratelli Tutti parece ser uma forma de apoio do Vaticano ao candidato do Partido Democrata, em clara oposição a Donald Trump, e vem poucos dias após Francisco ter recusado uma audiência ao Secretário de Estado Mike Pompeo em Roma. Isso confirma de que lado os filhos da luz estão, e de que lado os filhos das trevas estão.

 

8. AS FUNDAÇÕES IDEOLÓGICAS DA “FRATERNIDADE”

O tema da fraternidade, uma obsessão de Bergoglio, encontra sua primeira formulação em Nostra Ætate e em Dignitatis Humanae. A última encíclica, Fratelli Tutti, é o manifesto dessa visão maçônica, na qual o grito Liberté, Égalité, Fraternité substituiu o Evangelho em prol de uma unidade dos homens que escamota Deus. Reparemos que o Documento Sobre a Fraternidade Humana em Prol da Paz Mundial e da Convivência Comum, assinado em Abu Dhabi em 4 de fevereiro de 2019, foi orgulhosamente defendido por Bergoglio com as seguintes palavras:

“Do ponto de vista católico, o documento não foi um milímetro além do Concílio Vaticano II”

O Cardeal Miguel Ayuso Guixot, Presidente do Pontifício Conselho para o Diálogo Interreligioso, comentou em La Civiltà Cattolica:

“Com o Concílio, o dique rachou e, então, rompeu: as águas do diálogo se espalharam com as declarações conciliares Nostra Ætate, sobre a relação entre a Igreja e os fiéis de outras religiões, e Dignitatis Humanae, sobre a liberdade religiosa, temas e documentos que estão intimamente ligados um ao outro e que permitiram São João Paulo II dar vida a encontros como os de Assis em 27 de outubro de 1986 e Bento XVI, 25 anos mais tarde, permitir-nos viver, na cidade de São Francisco, o Dia para Reflexão, Dia´logo e Oração para Paz e Justiça no Mundo – Peregrinos da Verdade, Peregrinos da Paz. Portanto, o compromisso da Igreja Católica com o diálogo interreligioso, que abre caminho à paz e à fraternidade, é parte da sua missão original e tem suas raízes no Concílio” [9]

Novamente, o câncer do Vaticano II confirma estar na origem da metástase bergogliana. O fil rouge  [fio comum] que une o Concílio ao culto de pachamama também passa por Assis, como meu irmão Athanasius Schneider acertadamente explicou em sua recente conferência [10]

E, por falar da anti-Igreja, o Bispo Fulton Sheen descreve o Anticristo: “Como sua religião será a fraternidade sem a paternidade de Deus, ele enganará até mesmo os eleitos” [11] Parece que estamos vendo a profecia do venerável Arcebispo americano se realizando diante de nossos olhos.

Não causa surpresa, portanto, que a infame Grande Loja da Espanha, após congratular seu paladino elevado ao Trono, novamente tenha feito homenagem a Bergoglio com estas palavras:

“O grande princípio dessa escola de iniciação não mudou em três séculos: a construção de uma fraternidade universal na qual seres humanos se chamem irmãos independentemente de suas crenças, suas ideologias, cor de suas peles, sua condição social, sua língua, sua cultura ou sua nacionalidade. Esse sonho fraternal entrava em rota de colisão com o fundamentalismo religioso, que, no caso da Igreja Católica, levou a duros textos condenando a tolerância da Maçonaria no Século XIX. A última encíclica do Papa Francisco mostra quão distante a presente Igreja Católica está de suas posições anteriores. Em ‘Fratelli Tutti’, o Papa abraça a Fraternidade Universal, o grande princípio da maçonaria moderna” [12]

A reação do Grande Oriente da Itália não foi diferente:

“Esses são os princípios que a Maçonaria sempre buscou e guardou para a elevação da Humanidade” [13]

Austen Ivereigh, o hagiógrafo de Bergoglio, confirma, satisfeito, essa interpretação, que qualquer católico deveria considerar no mínimo perturbadora [14]

Gostaria de lembrar que os documentos maçônicos da Alta Vendita, desde o Século XIX, revelam um plano de infiltração da Maçonaria na Igreja:

“Vós, também, deveis fisgar alguns amigos e levá-los aos pés do Palácio Apostólico. Vós tereis pregado uma revolução de tiara e pluvial, realizada debaixo da insígnia da cruz, uma revolução que só precisará de um pouco de ajuda para atear fogo aos últimos confins do mundo” [15]

 

9. A SUBVERSÃO DA RELAÇÃO INDIVIDUAL E SOCIAL COM DEUS

Permitam-me concluir esse exame dos links entre o Concílio e a presente crise ao enfatizar uma inversão que eu considero extremamente importante e significativa. Estou me referindo ao relacionamento do leigo individual e da comunidade de fiéis com Deus. Enquanto, na Igreja de Cristo, a relação da alma com o Senhor é eminentemente pessoal mesmo quando é transportada pelo Ministro Sagrado na prática litúrgica, na Igreja conciliar, a comunidade e o relacionamento grupal prevalece. Pensemos na insistência deles em querer fazer do Batismo de uma criança, ou o casamento dos noivos, um “ato da comunidade”; ou a impossibilidade de receber a Sagrada Comunhão individualmente, fora da Missa, e na prática comum de se aproximar da Eucaristia durante a Missa mesmo sem as condições necessárias. Tudo isso é sancionado baseado numa concepção protestantizada de participação no banquete eucarístico, do qual nenhum convidado está excluído. Com esse entendimento de comunidade, a pessoa perde sua individualidade, perdendo-se em uma comunidade anônima da celebração. Assim também, a relação do corpo social com Deus desaparece em um personalismo que elimina o papel de mediação tanto da Igreja, quanto do Estado. A individualização no campo moral enquadra-se nisso também, onde os direitos e preferências do indivíduo tornam-se razões para a erradicação da moralidade social. Isso é feito em nome de uma “inclusão” que legitima todo e qualquer vício e aberração moral. A sociedade – entendida como a união de vários indivíduos direcionada à busca de um objetivo comum – torna-se dividida em uma multiplicidade de indivíduos, cada um com seu próprio objetivo. Isso é o resultado de uma sublevação ideológica que precisa ser analisada profundamente em razão de suas consequências tanto na esfera eclesial quanto na civil. É evidente, porém, que o primeiro passo dessa revolução se encontra na mens conciliar, a começar pela doutrinação do povo cristão através da liturgia reformada, na qual o indivíduo se junta à assembleia ao se despersonalizar, e a comunidade se deturpa em uma coletividade de indivíduos ao perder sua identidade.

 

10. CAUSA E EFEITO

A Filosofia nos ensina que a uma causa sempre corresponde um certo efeito. Temos visto que as ações praticadas durante o Vaticano II têm tido o efeito desejado, dando forma concreta àquela virada antropológica, que, hoje, levou à apostasia da anti-Igreja e ao eclipse da verdadeira Igreja de Cristo. Devemos, portanto, compreender que, se desejamos desfazer os efeitos danosos que vemos, é necessário e indispensável remover os fatores que os causaram. Se esse é nosso objetivo, então é claro que aceitar – ou até mesmo aceitar parcialmente – aqueles princípios revolucionários tornaria nossos esforços inúteis e contraprodutivos. Devemos, portanto, ser claros quanto aos objetivos a serem alcançados, ordenando nossas ações em direção aos objetivos. Mas devemos estar cientes de que, nessa obra de restauração, nenhuma exceção aos princípios pode ser feita, precisamente porque deixar de compartilhá-los eliminaria qualquer chance de sucesso.

Portanto, deixemos de lado, de uma vez por todas, as vãs ilações acerca da presumida bondade do Concílio, da traição da vontade dos Padres Conciliares, da letra e do espírito de Vaticano II, do peso magisterial (ou da ausência dele) de seus atos e da hermenêutica da continuidade contra a da ruptura. A anti-Igreja tem usado a etiqueta “Concílio Ecumênico” para dar autoridade e força legal à sua agenda revolucionária, assim como Bergoglio chama seu manifesto político de lealdade à Nova Ordem Mundial de “carta encíclica”. A astúcia do inimigo conseguiu isolar a parte saudável da Igreja, dividida entre ter que reconhecer a natureza subversiva dos documentos conciliares, portanto devendo exclui-los do corpus magisterial, e ter que negar a realidade ao declará-los apoditicamente ortodoxos para salvaguardar a infalibilidade do Magistério. As Dubia foram uma humilhação àqueles Príncipes da Igreja, mas não desataram os nós doutrinários que foram levados à atenção do Pontífice Romano. Bergoglio não respondeu, exatamente porque ele não quer negar, nem confirmar os erros, assim expondo-se ao risco de ser declarado herege e perder o papado. Esse é o mesmo método usado pelo Concílio, no qual a ambiguidade e o uso de terminologia imprecisa evitam a condenação do erro implícito. Mas o jurista sabe muito bem que, para além da violação flagrante da lei, também se pode cometer um crime ao burlar a lei, utilizando-a para fins maus: contra legem fit, quod in fraudem legis fit (o que contorna a lei é contrário a ela).

 

11. CONCLUSÃO

A única maneira de vencer essa batalha é retornar ao que a Igreja sempre fez e parar de fazer o que a anti-Igreja nos pede atualmente – aquilo que a verdadeira Igreja sempre condenou. Coloquemos Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei e Sumo Sacerdote, de volta no centro da vida da Igreja; e, antes disso, no centro da vida de nossas comunidades, nossas famílias, de nós mesmos. Devolvamos a coroa a Nossa Senhora, Maria Santíssima, Rainha e Mãe da Igreja.

Voltemos a celebrar a Sagrada Liturgia tradicional dignamente e a rezar com as palavras dos Santos, não com as palavras desconexas dos modernistas e dos hereges. Comecemos, novamente, a saborear os escritos dos Padres da Igreja e dos Místicos e a atirar ao fogo as obras imbuídas de modernismo e sentimentalismo imanentista. Apoiemos, com orações e auxílio material, os vários bons Padres que permanecem fiéis à verdadeira Fé, e retiremos qualquer apoio daqueles que se mancomunaram com o mundo e suas mentiras.

E acima de tudo – eu lhes peço em nome de Deus! - deixemos de lado aquele sentimento de inferioridade que os nossos adversários nos acostumaram a aceitar: na guerra do Senhor, não é a nós que eles humilham (certamente merecemos humilhações por nossos pecados). Não: eles humilham a Majestade de Deus e a Esposa do Cordeiro Imaculado. A Verdade que nós abraçamos não vem de nós, mas de Deus! Permitir que a Verdade seja negada, aceitar que ela deve se justificar perante as heresias e os erros da anti-Igreja não é um ato de humildade, mas de covardia e pusilanimidade. Inspiremo-nos no exemplo dos Santos Mártires Macabeus, ante um novo Antíoco que nos pede que sacrifiquemos aos ídolos e abandonemos o verdadeiro Deus. Respondamos com as palavras deles, rezando ao Senhor: “Manda também agora diante de nós, ó Senhor dos céus, o teu bom anjo, a difundir o temor e o pavor. Que sejam feridos pela grandeza do teu braço aqueles que, blasfemando, avançam contra o teu santo povo” (2 Mac 15:23)

Permitam-me concluir minha conferência com uma lembrança pessoal. Quando eu era Núncio Apostólico na Nigéria, tomei conhecimento de uma magnífica tradição popular que surgiu durante a terrível guerra em Biafra e que continua até o dia de hoje. Eu pessoalmente tomei parte nela durante uma visita pastoral à Arquidiocese de Onitsha e fiquei muito impressionado. Essa tradição – chamada de “Crianças do Bloco de Rosários” - consiste em ajuntar milhares de crianças (mesmo as mais novas) em cada vilarejo ou vizinhança para recitar o Santo Rosário, pedindo a paz – cada criança segurando um pequeno pedaço de madeira, como se fosse um mini altar, com uma imagem de Nossa Senhora e uma pequena vela nela.

Até o dia 3 de novembro, convido todos a se juntarem em uma Cruzada de Rosários: uma espécie de tomada de Jericó, não com sete trombetas soadas por Padres, mas com as Ave Marias dos pequeninos e dos inocentes, para derrubar as paredes do deep state e da deep church.

Juntemo-nos aos pequeninos em um Crianças do Bloco de Rosários, implorando à Mulher vestida de Sol que o Reino de Nossa Senhora e Mãe seja restaurado e que o eclipse que nos aflige seja abreviado.

E que Deus abençoe essas santas intenções.

 

[1] Padre Antonio Spadaro sj, Fratelli Tutti, la risposta di Francesco alla crisi del nostro tempo, in Formiche, 4 Ottobre 2020 (qui).

[2] «Pope Francis’ pontificate is like a standard lifted up before Catholic integralists and those who equate material continuity and tradition: Catholic doctrine does not just develop. Sometimes it really changes: for example on death penalty, war», https://twitter.com/Johnthemadmonk/status/1313616541385134080/photo/1/https://twitter.com/massimofaggioli/status/1313569449065222145.

[3] «Dovremmo evitare di cadere in questi quattro atteggiamenti perversi, che certo non aiutano alla ricerca onesta e al dialogo sincero e produttivo sulla costruzione del futuro del nostro pianeta: negazione, indifferenza, rassegnazione e fiducia in soluzioni inadeguate», cfr. https://www.avvenire.it/papa/pagine/papa-su-clima-basta-negazionismi-su-riscaldamento-globale.

[4] «Religio, id est cultus Dei, qui homo fieri voluit, atque religio – talis enim est aestimanda – id est cultus hominis, qui fieri vult Deus, inter se congressae sunt. Quid tamen accidit? Certamen, proelium, anathema? Id sane haberi potuerat, sed plane non accidit. Vetus illa de bono Samaritano narratio excmplum fuit atque norma, ad quam Concilii nostri spiritualis ratio directa est. Etenim, immensus quidam erga homines amor Concilium penitus pervasit. Perspectae et iterum consideratae hominum necessitates, quae eo molestiores fiunt, quo magis huius terrae filius crescit, totum nostrae huius Synodi studium detinuerunt. Hanc saltem laudem Concilio tribuite, vos, nostra hac aetate cultores humanitatis, qui veritates rerum naturam transcendentes renuitis, iidemque novum nostrum humanitatis studium agnoscite: nam nos etiam, immo nos prae ceteris, hominis sumus cultores». Paolo VI, Allocuzione per l’ultima sessione del Concilio Ecumenico Vaticano II, 7 Dicembre 1965, cfr. http://www.vatican.va/content/paul-vi/it/speeches/1965/documents/hf_p-vi_spe_19651207_epilogo-concilio.html

[5] https://twitter.com/i/status/1312837860442210304

[6] Cfr. www.educationglobalcompact.org

[7] Congregazione per l’Educazione Cattolica, Lettera Circolare alle scuole, università e istituzioni educative, 10 Settembre 2020, cfr. http://www.educatio.va/content/dam/cec/Documenti/2020-09/IT-CONGREGATIO-LETTERA-COVID.pdf

[8] https://www.lastampa.it/cronaca/2020/10/03/news/green-blue-la-nuova-voce-dell-economia-sostenibile-via-con-il-papa-e-bill-gates-1.39375988;https://remnantnewspaper.com/web/index.php/articles/item/2990-the-vatican-un-alliance-architects-of-death-and-doom

[9] Card. Miguel Ángel Ayuso Guixot, Il documento sulla Fraternità umana nel solco del Concilio Vaticano II, 3 Febbraio 2020. Cfr. https://www.laciviltacattolica.it/news/il-documento-sulla-fratellanza-umana-nel-solco-del-concilio-vaticano-ii

[10] https://www.cfnews.org.uk/bishop-schneider-pachamama-worship-in-rome-was-prepared-by-assisi-meetings

[11] Mons. Fulton Sheen, discorso radiofonico del 26 Gennaio 1947. Cfr. https://www.tempi.it/fulton-sheen-e-linganno-del-grande-umanitario

[12] https://www.infocatolica.com/?t=noticia&cod=38792

[13] https://twitter.com/grandeorienteit/status/1312991358886514688

[14] https://youtu.be/s8v-O_VH1xw

[15] «Vous amènerez des amis autour de la Chaire apostolique. Vous aurez prêché une révolution en tiare et en chape, marchant avec la croix et la bannière, une révolution qui n’aura besoin que d’être un tout petit peu aiguillonnée pour mettre le feu aux quatre coins du monde». Cfr. Jacques Cretineau-Joly, L’Église romaine en face de la Révolution, Parigi, Henri Plon, 1859 (qui).

  1. 1. *N.T.: Aqui, o Arcebispo adota a linguagem política em voga. Deep state refere-se a um conjunto de homens que, por várias razões, exercem poderosa influência nas ações governamentais, embora estejam quase sempre escondidos do grande público, agindo nos bastidores; o Arcebispo quer, com essa expressão, indicar que os hereges se escondem da maioria dos fiéis para, nos bastidores, conduzir os rumos da Igreja em direção a seus objetivos pessoais, que não coincidem com os objetivos da Santa Igreja.
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