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Artigo 4 - Se a solércia faz parte da prudência.

O quarto discute-se assim. – Parece que a solércia não faz parte da prudência.

1. – Pois, a solércia consiste em descobrirmos facilmente os meios, para a demonstração, como diz Aristóteles Ora, a prudência, versando sobre o contingente, não é, por natureza, demonstrativa. Logo, à prudência não pertence a solércia.

2. Demais. – A prudência pertence deliberar com acerto, como diz Aristóteles Ora, no deliberar com acerto não há lugar para a solércia, que é uma forma de sagacidade, isto é, uma acertada conjectura, desprovida de razão e veloz; ora, devemos deliberar demoradamente, segundo Aristóteles. Logo, a solércia não deve ser considerada parte da prudência. 

3. Demais. – A solércia, como se disse, é uma acertada conjectura. Ora, usar de conjecturas é próprio dos retóricos. Logo, a solércia mais pertence à retórica que à prudência.

Mas, em contrário, diz Isidoro: Solícito (sollicitus) significa, por assim dizer, solerte (solers) e pronto (citus). Ora, a solicitude é própria da prudência, como se disse. Logo, também, a solércia.

SOLUÇÃO. – A prudência consiste na reta apreciação do que devemos fazer. Ora, essa apreciação ou essa opinião reta a adquirimos na ordem prática, como na especulativa, de dois modos: ou por nós mesmos, ou aprendendo-a de outrem. Pois, assim como a docilidade consiste em formarmos uma opinião reta, recebendo-a de outrem; assim também a solércia, em procedermos de modo a chegarmos a uma apreciação reta, por nós mesmos.

De modo porém que a solércia seja considerada como sagacidade, da qual faz parte. Pois, a sagacidade consiste em conjecturarmos com acerto, sobre certas coisas; e a solércia, na fácil e pronta conjectura para a descoberta do meio, como diz Aristóteles. Contudo, aquele filósofo (Andronico), que considera a solércia parte da prudência a toma, em geral, pela sagacidade. Por 1580 diz: A solércia é um hábito consistente em descobrirmos prontamente o que convém.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. –­ A solércia versa sobre a descoberta do meio, não só nas demonstrações, mas também no agir. Por exemplo, quando, como no mesmo lugar diz o Filósofo, ao vermos certos se tornarem amigos, conjecturamos que o são por serem ambos inimigos de um terceiro. E deste modo, a solércia pertence à prudência.

RESPOSTA À SEGUNDA. – O Filósofo dá uma verdadeira razão, para mostrar que a eubulia, que delibera com acerto, não é a sagacidade: o mérito desta consiste na consideração pronta sobre o de que se há mister; ora, podemos deliberar com acerto, embora prolongada ou tardamente. Nem por isso contudo, deixa a conjectura acertada de contribuir para o bom conselho. E às vezes é necessária, por exemplo, quando ocorre algo que devemos prontamente fazer. Por isso, e com razão, a solércia é considerada parte da prudência.

RESPOSTA À TERCEIRA. – Também a retórica raciocina sobre os atos que devemos praticar. Por onde, nada impede que um mesmo objeto pertença à retórica e à prudência. E contudo, a conjectura, no caso vertente, não é só aquela com que se ocupa o retor, mas também, a pela qual dizemos, que, em certos casos, o homem conjectura a verdade.

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