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Artigo 4 - Se o homem deve, com caridade, amar mais a si mesmo que ao próximo.

O quarto discute-se assim. – Parece que o homem não deve, com caridade, amar mais a si mesmo que ao próximo.

1. – Pois, o objeto principal da caridade é Deus como já se disse. Ora, às vezes, o próximo está mais unido a Deus que nós mesmos. Logo, devemos amá-la, então, mais que a nós mesmos.

2. Demais. – Evitamos mais o mal aquele a quem mais amamos. Ora, pela caridade, sofremos danos pelo nosso próximo, conforme aquilo da Escritura: Aquele que por amor do seu amigo não faz caso de passar por alguma perda é justo. Logo, o homem deve, com caridade, amar mais a outrem que a si mesmo.

3. Demais. – A Escritura diz, que a caridade não busca os seus próprios interesses. Ora, mais amamos aquilo de que mais buscamos o bem. Logo, ninguém se ama, com caridade, mais a si mesmo que ao próximo.

Mas, em contrário, a Escritura: Amarás a teu próximo como a ti mesmo. Por onde, parece que o amor do homem para consigo mesmo é como que o exemplar do amor que tem para com outrem. Ora, o exemplar é anterior ao exemplado. Logo, o homem deve, com caridade, amar mais a si mesmo que ao próximo.

SOLUÇÃO. – No homem há duas naturezas - a espiritual e a corpórea. Ora, dizemos que ele se ama a si mesmo quando se ama na sua natureza espiritual, como já dissemos. E a esta luz, deve amar-se a si mesmo, depois de Deus, mais que a quem quer que seja. E isto é claro pela própria razão desse amor. Pois, conforme já dissemos, Deus é amado como o princípio do bem no qual se funda o amor de caridade. Ora, o homem se ama a si mesmo com caridade, pela razão de ser participante do referido bem; o próximo, porém, é amado por lhe ser associado nessa participação. Ora, a co-associação é razão do amor fundada numa certa união, relativamente a Deus. Por onde, assim como a unidade é mais forte que a união, assim o participar o homem do bem divino é mais forte razão de amar do que o associar-se outro com ele nessa participação. Portanto, o homem deve, com caridade, amar mais a si mesmo que ao próximo. E isto é sinal que não deve submeter-se a nenhum mal do pecado, que contrarie à participação da felicidade, para que livre o próximo do pecado.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ­– O amor de caridade é susceptível de quantidade não só por parte do objeto que é Deus, mas também por parte do amante, que é aquele mesmo que tem a caridade; assim, também a quantidade de qualquer ação depende: de certo modo, do próprio sujeito. E portanto, embora o próximo mais unido com Deus seja melhor, como porém não é tão próximo ao que tem caridade, como este a si mesmo, não se segue devamos amar mais ao próximo que a nós mesmos.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Devemos sofrer danos corpóreos pelo nosso amigo. E assim agindo, amamos mais a nós mesmos na ordem espiritual, pois isso constitui a perfeição da virtude, que é o bem do espírito. Mas o homem não deve, pecando, sofrer dano nos seus bens espirituais, para livrar o próximo do pecado, como já dissemos.

RESPOSTA À TERCEIRA. – Segundo Agostinho, quando a Escritura diz - a caridade não busca os seus próprios interesses - isso significa que ela antepõe o geral ao particular. Pois, sempre o bem geral nos é mais amável que o nosso bem próprio, assim como também a parte mais ama o bem do todo, que o bem particular dela, como já dissemos.

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