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Artigo 8 - Se os infiéis devem, de algum modo, ser compelidos a aceitar a fé.

O oitavo discute-se assim. – Parece que os infiéis de nenhum modo devem ser compelidos a aceitar a fé.

1. – Pois, diz o Evangelho, que os servos do pai de famílias, em cujo campo foi semeada a cisânia, perguntaram-lhe: Querer tu que nós vamos e a arranquemos? Ao que ele respondeu: Não, para que talvez não suceda que, arrancando a cisânia, arranqueis juntamente com ela também o trigo. E comenta Crisóstomo: Isto diz o Senhor para proibir que se perpetrem mortes. Nem se devem matar os heréticos, pois se o fizerdes, fareis, necessária e simultaneamente, desaparecer muitos santos. Logo, pela mesma razão, nenhum infiel deve ser obrigado a aceitar a fé.

2. Demais. – Uma Decretal diz: O santo Sinodo ordena, em seguida, que não se obrigue nenhum judeu a crer por força. Logo, pela mesma razão, nem os demais infiéis devem ser obrigados a aceitar a fé.

3. Demais. – Agostinho diz: tudo o homem pode, não querendo; menos crer, que só por vontade o quer. Ora, a vontade não pode ser obrigada. Logo, os infiéis não devem ser obrigados a aceitar a fé.

4. Demais. – A Escritura diz; da pessoa de Deus: Eu não quero a morte do pecador. Ora, nós devemos conformar a nossa com a vontade divina, como já se estabeleceu. Logo, também não devemos querer que os infiéis sejam condenados à morte.

Mas, em contrário, a Escritura: Sai por esses caminhos e cercos e força-os a entrar, para que fique cheia a minha casa. Ora, na casa de Deus, isto é, na santa Igreja, os homens entram pela fé. Logo, certos podem ser forçados a aceitá-la.

SOLUÇÃO. – Há certos infiéis, como os gentios e os judeus, que nunca receberam a fé; e esses de nenhum modo devem ser compelidos a crer, pois crer depende da vontade. Podem porém ser obrigados pelos fiéis, se estes tiverem poder para tal, a não lhes impedirem a fé, com blasfêmias, mas persuasões ou mesmo com perseguições francas. E por isso, os fiéis de Cristo movem frequentemente guerra aos infiéis; não pelos obrigar a crer, pois ainda que os tivessem vencidos e cativos deixar-lhes-iam a liberdade de quererem crer ou não; mas pelos compelir a não impedir a fé em Cristo. - Outro é o caso porém, dos infiéis, que outrora tiveram fé e ainda a confessam, como os heréticos e todos os apóstatas. E esses devem ser forçados, mesmo com violência física, a cumprir o que prometeram e a conservar o que uma vez receberam.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – Pelo lugar citado, entenderam alguns ser proibido não, certo, a excomunhão, mas a morte dos heréticos, como é claro pelo passo citado de Crisóstomo. E Agostinho diz, de si: Minha primeira opinião era que não se deve forçar ninguém a fazer parte da unidade de Cristo, senão persuadindo com palavras e lutando com discussões. Mas esta minha opinião fica excluída, não pelas palavras dos que me contradizem, mas pelos fatos demonstrativos do contrário. Pois o terror das leis só serviu para levar muito a dizerem: Graças ao Senhor, que nos rompeu os vínculos. Quando, portanto, o Senhor diz: Deixai crescer uma e outra coisa até a ceifa - a sequência do texto mostra claramente como deve ser entendido: Para que talvez não suceda que, arrancando a cizânia, arranqueis juntamente com ela também o trigo. - Por onde suficientemente se mostra ­ diz Agostinho que quando isto não se deve temer, isto é, quando os crimes de um são tão conhecidos e execrados por todos, que não acha nenhum defensor ou, pelo menos, defensor tal, que possa causar cisma, então não pode dormir a severidade da disciplina.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Os judeus, que de nenhum modo receberam a fé, não devem ser forçados a aceitá-la. Os que, porém a receberam devem ser obrigados à força a conservar a fé, como se diz no mesmo capítulo.

RESPOSTA À TERCEIRA. – Assim como prometer é próprio da vontade e cumprir o exige a necessidade, assim também, próprio da vontade é receber a fé, e, de outro lado, é imposição da necessidade conservar a fé já recebida. Por onde, os heréticos devem ser compelidos a conservar a fé. Pois, diz Agostinho: Porque costumavam este: a clamar - somos livre: de crer ou não? Contra quem Cristo empregou a força? - Saibam, pois, que Cristo forçou, primeiro, Paulo, e depois o ensinou.

RESPOSTA À QUARTA. – Como diz Agostinho na mesma Epistola, ninguém de nós quer que nenhum herético pereça. Mas a casa de Davi não pode ter paz senão pela morte do seu filho Absalão, na guerra que movia contra o Pai. Assim, a Igreja católica, se salva uns com a perdição de outros, cura a dor do coração materno com a libertação de tantos povos.

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