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Art. 8 – Se é lícito o transferir–se de uma religião para outra que pelo menos seja mais rigorosa.

O oitavo discute–se assim. – Não parece lícito o transferir–se de uma religião para outra embora mais rigorosa.

1. – Pois, diz o Apóstolo: Não abandonando a nossa congregação, como é costume de alguns. Ao que diz a Glosa: Isto é os que cedem ao temor de perseguição ou que, por presunção própria, afastam–se do pecador, como imperfeito, afim de parecerem perfeitos. Ora, parece que isso fazem os que se transferem de uma religião para outra mais perfeita. Logo, parece que tal é ilícito.

2. Demais. – A profissão dos monges é mais rigorosa que a dos cónegos regulares. Ora, não é lícito a ninguém passar do estado dos cônegos regulares para o dos monges. Pois, diz uma Decretal: Mandamos e universalmente proibimos que nenhum cónego regularmente professo ­ salvo, o que não suceda se cair publicamente ­ se faça monge. Logo, parece que a ninguém é lícito transferir–se de uma religião para outra maior.

3. Demais. – Cada um está obrigado a cumprir o voto que fez, na medida em que o puder licitamente. Assim, quem fez o voto de continência, mesmo depois de ter pronunciado as palavras do contrato de matrimônio, mas antes da cópula carnal, está obrigado a cumprir o voto, porque pode fazê–lo entrando numa religião. Se, portanto, é lícito a alguém o transferir–se de uma religião para outra, estará obrigado a fazê–lo, se antes, quando vivia no século, emitiu esse voto. O que não é admissível, porque daí muitas vezes poderia nascer escândalo. Logo, nenhum religioso pode transferir–se de uma religião para outra, mesmo mais rigorosa.

Mas, em contrário, uma decretal determina: As virgens consagradas a Deus que, tendo em vista vantagens espirituais advindas de uma vida mais rigorosa, quiserem transferir–se para outro mosteiro e decidirem nele permanecer, o Sínodo o permite. Se o mesmo podem fazer quaisquer outros religiosos. Logo, pode um licitamente transferir–se de uma religião para outra.

SOLUÇÃO. – Não é louvável transferir–se um religioso para outra religião, salvo por grande utilidade ou necessidade. Quer por escandalizar muitas vezes um tal procedimento os que ficam; quer também porque mais facilmente progredirá o religioso na religião a que está habituado do que em outra com a qual não o está, em igualdade de condições. Por isso diz o Abade Nésteros: O bem de cada um está em marchar com perseverança no caminho que escolheu, em esforçar–se com todo o estudo e diligência para chegar à perfeição da vida que abraçou; e que de nenhum modo abandone a regra que elegeu no dia da sua profissão. E logo, dando a razão disso, acrescenta: Pois, é impossível um mesmo homem resplender simultaneamente em todas as virtudes. E quem quisesse tentá–lo viria por forca a não conseguir a perfeição em nenhuma virtude, por querer praticar todas na sua integridade. Ora, as diversas religiões fulgem, cada uma em obras virtuosas que lhes são próprias.

Mas, pode um religioso louvavelmente transferir–se para outra religião por três causas. – Primeiro, pelo desejo de uma religião mais perfeita. Ora, a excelência de uma religião como dissemos, não depende só do seu rigor; mas, principalmente, do fim a que ela se ordena; e secundariamente, pelo discernimento das observâncias proporcionadas ao fim proposto. – Segundo, pelo desviar–se a sua religião da perfeição devida. Por exemplo, quando numa religião mais rigorosa os religiosos começam a levar uma vida mais remissa, procede louvavelmente o religioso que passar para outra menos rigorosa, mas onde melhor se observam as regras. Por isso, o Abade João, diz de si mesmo que da vida solitária, que primeiro professara, passou para a vida menos rigorosa dos que vivem em comunidade, porque a vida eremitica começara a declinar e a tornar­se frouxa nas suas observâncias. – Terceiro, por doença ou fraqueza, donde muitas vezes procede que não pode o religioso obedecer às prescrições de uma religião mui rigorosa; ao passo que poderia obedecer às de outra que o fosse menos.

Mas, esses três casos comportam diferenças. Assim, no primeiro caso, o religioso deve, por humildade, pedir licença; a qual, porém, não lhe pode ser negada por ser mais rigorosa a religião a que se transfere. Mas, se nesse ponto houver dúvida provável, é necessário então a decisão do superior. – Semelhantemente, no segundo caso também requer o juízo do superior. – E enfim, no terceiro caso é, além disso, necessária a dispensa.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÃO. – Os que se transferem para uma religião mais rigorosa não o fazem por presunção, para parecerem justos; mas por devoção, para mais se santificarem.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Ambas as religiões, a dos monges e a dos cónegos regrantes ordenam­se às obras da vida contemplativa. E dentre essas obras as principais são a celebração dos divinos mistérios, o que diretamente se ordena a ordem dos cónegos regrantes, que exercem as funções de clérigos religiosos. A religião dos monges, porém, não competem as funções de clérigos. Portanto, embora a ordem dos monges seja de uma observância mais estrita, se os monges fossem leigos lhes seria lícito transferirem­se da sua ordem para a dos cónegos regrantes, segundo o que diz Jerónimo – vive no mosteiro de modo a mereceres ser clérigo; mas não ao inverso. Mas, se os monges forem Clérigos com o exercício dos ministérios sagrados, vivem com maior rigor a vida dos cónegos regrantes. E portanto, será lícito passar da ordem dos cónegos regrantes para a dos monges: contanto que se peça licença ao superior.

RESPOSTA À TERCEIRA. – O voto solene pelo qual alguém se obriga a entrar numa religião menor, é mais forte que o voto–simples pelo qual se obriga a uma religião maior. Assim, quem contraísse matrimónio depois de um voto simples, não ficaria aquele dirimido, como o ficaria depois do voto solene. E portanto, quem já professou numa religião menor não está obrigado a cumprir o voto simples que fez de entrar numa religião maior.

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