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Art. 2 – Se o dom das línguas é mais excelente que a graça da profecia.

O segundo discute–se assim. – Parece que o dom das línguas é mais excelente que a graça da profecia.

1. – Pois, as causas próprias dos melhores são as melhores, segundo o Filósofo. Ora, o dom das línguas é próprio do Novo Testamento por isso se canta na Sequência de Pentecostes: Hoje o Espírito Santo doou aos Apóstolos de Cristo com um dom insólito e inaudito em todos os séculos. A profecia, porém, é própria, antes, ao Antigo Testamento, segundo aquilo do Apóstolo: Deus, tendo falado muitas vezes e de muitos modos noutro tempo a nossos pais pelos profetas. Logo, parece que o dom das línguas é mais excelente que o dom da profecia.

2. Demais. – O meio por que nos ordenamos para Deus parece mais excelente que aquele pelo qual nos ordenamos para os homens. Ora, pelo dom das línguas o homem se ordena para Deus; e pelo da profecia, para os outros homens. Assim, diz o Apóstolo: O que fala uma língua desconhecida não fala a homens, senão a Deus; mas o que a profetiza fala aos homens para a sua edificação. Logo, parece que o dom das línguas é mais excelente que o da profecia.

3. Demais. – O dom das línguas permanece habitualmente em quem o tem que pode usar dele quando quiser. Por isso diz o Apóstolo: Graças dou ao meu Deus, que falo todas as línguas que vos falais. Ora, o mesmo não se dá com o dom da profecia, como se disse. Logo, o dom das línguas parece mais excelente que o da profecia.

4. Demais. – A interpretação das línguas parece contida na profecia; pois, as Escrituras são explica das pelo mesmo Espírito que as fez. Ora, a interpretação das línguas o Apóstolo a coloca depois do dom de falar diversas línguas. Logo, parece que o dom das línguas é mais excelente que o da profecia, sobretudo quanto a alguma das suas partes.

Mas, em contrário, o Apóstolo: Maior é o que profetiza que o que fala diversas línguas.

SOLUÇÃO. – O dom da profecia excede o das línguas de três modos. – Primeiro, porque o dom das línguas consiste na locução de vozes diversas, sinais de alguma verdade concebida pela inteligência, da qual também são sinais certos fantasmas que se manifestam na visão imaginária. Por isso Agostinho compara o dom das línguas à visão imaginária. Pois, como dissemos, o dom da profecia consiste na iluminação mesma da mente, para que ela conheça a verdade inteligível. Por onde, assim como a iluminação profética é mais excelente que a imaginária, segundo estabelecemos, assim também a profecia é mais excelente que o dom das línguas em si mesmo considerado. – Segundo, porque o dom da profecia está compreendido no conhecimento das coisas; e este é mais nobre que o das vozes, objeto do dom das línguas. – Terceiro, porque o dom da profecia é mais útil. O que o Apóstolo o prova por três razões. Primeiro, por ser a profecia mais útil à edificação da Igreja, para a qual em nada contribui quem fala várias línguas, a menos que se lhes não expliquem as palavras. Segundo, porque se aquele mesmo que recebeu o dom de falar várias línguas não as entendesse – o que constitui o dom da profecia – esse dom das línguas não lhe seria de nenhuma utilidade. Terceiro, quanto aos infiéis, por causa dos quais sobretudo foi conferido o dom das línguas, que talvez considerassem loucos aqueles que as falassem; assim, os judeus julgavam ébrios os Apóstolos quando estes falavam nas várias línguas, segundo se lê na Escritura. Ao passo que pelas profecias os infiéis ficam convencidos, porque lhes revelam o íntimo do coração.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – Como dissemos a excelência da profecia não somente torna o profeta iluminado pelo lume inteligível, mas também o faz perceber a visão imaginária. Assim também, a operação do Espírito Santo não somente, na sua perfeição, invade a alma do lume profético e a fantasia, da visão imaginária, como se lê no Antigo Testamento, mas ainda, exteriormente, move a língua a proferir os vários sinais da locução, como se lê ter acontecido no Novo Testamento, segundo aquilo do Apóstolo: cada um de vós tem o dom de compor salmos, tem o de doutrina, tem o de línguas, tem o de revelação, isto é, da revelação profética.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Pelo dom da profecia o homem ordena a sua mente para Deus; o que é mais nobre do que ordenar–se para ele por meio das línguas. Pois, de quem as fala se diz que não fala aos homens, isto é, à inteligência deles ou para a utilidade deles, mas para a só inteligência de Deus e para o louvor divino. Ora pela profecia o homem se ordena tanto para Deus como para o próximo e portanto ela é um dom mais perfeito.

RESPOSTA À TERCBIRA. – A revelação profética se estende ao conhecimento de todo o sobrenatural. Por isso da sua perfeição mesma resulta que, no estado imperfeito desta vida, não pó de ser perfeitamente possuída como hábito, mas só imperfeitamente, como uma paixão. O dom das línguas, porém chega ao conhecimento particular das palavras humanas. Por isso não repugna à imperfeição desta vida o ser ela possuída perfeita e habitualmente.

RESPOSTA À QUARTA. – A interpretação das palavras pode ser reduzida ao dom da profecia, porque ilumina a mente para entender e expor todas as obscuridades da linguagem, resultantes quer da dificuldades inerentes às coisas significadas, quer das palavras mesmas desconhecidas, que são faladas ou ainda das imagens das coisas referidas, como se lê na Escritura: De ti ouvi eu dizer que tu podes interpretar as coisas obscuras e desembulhar as implicadas. Por onde, a interpretação das palavras é superior ao dom das línguas, como claramente o diz o Apóstolo: Maior li o que profetiza que o que fala diversas línguas a não ser que também ele interprete. Mas, a interpretação das palavras o Apóstolo a propõe ao dom das línguas, porque ela também se estende à interpretação dos diversos gêneros de línguas.

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