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Art. 6 – Se os graus da profecia variam no decurso do tempo.

O sexto discute–se assim. – Parece que os graus da profecia variam no decurso do tempo.

1. – Pois, a profecia se ordena ao conhecimento das coisas divinas, como do sobre dito resulta. Ora, como diz Gregório, na sucessão dos tempos aumentou o conhecimento da verdade divina. Logo, também os graus da profecia devem se distinguir em relação ao decurso do tempo.

2. Demais. – A revelação profética se faz por meio da palavra divina dirigida ao homem. Ora, as suas revelações os profetas as anunciam falando e escrevendo. Assim, como refere a Escritura, antes de Samuel, a palavra de Deus era preciosa, isto é rara; contudo, depois, foi dirigida a muitos. Do mesmo modo, não se encontra escrito nenhum livro dos profetas, antes do tempo de Isaías, a quem foi dito: Toma um livro grande e escreve nele em estilo d’homem, como se lê na Escritura. E depois desse tempo muitos profetas escreveram as suas profecias. Logo, parece que, no decurso do tempo, aumentaram os graus da profecia.

3. Demais. – O Senhor diz: Todos os profetas e a lei até João profetizaram. Mas, depois o dom da profecia, nos discípulos de Cristo, foi muito mais excelente que o dos antigos profetas, conforme o Apóstolo: Em outras gerações não foi conhecido dos filhos dos homens, isto é, o mistério de Cristo, assim como agora tem sido revelado aos seus santos Apóstolos e profetas pelo espírito. Logo, parece, que os graus da profecia cresceram no decurso do tempo.

Mas, em contrário, Moisés foi o excelentíssimo dos profetas como se disse; e contudo foi anterior aos outros profetas. Logo, os graus da profecia não aumentaram no decurso do tempo.

SOLUÇÃO. – Como dissemos, a profecia se ordena para o conhecimento da verdade divina; com a ciência da qual, não somente somos instruídos na fé, mas também somos dirigidos nas nossas obras, conforme aquilo da Escritura: Envia a tua luz e a tua verdade; estas me conduzirão. Ora, a nossa fé consiste principalmente em duas causas: Primeiro, no verdadeiro conhecimento de Deus, segundo o Apóstolo: E necessário que o que se chega a Deus creia que há Deus. Segundo, no mistério da encarnação de Cristo, conforme o Evangelho: Credes em Deus, credes também em mim. Se, pois, tratamos da profecia, enquanto ordenada à fé em Deus, então ela aumentou, relativamente às três divisões dos tempos: os anteriores à lei, os da lei e os da graça, – Pois, antes da lei, Abraão e os outros Patriarcas foram instruídos profeticamente em matéria da fé em Deus. Por isso, chama–lhes profetas a Escritura: Não maltrateis aos meus profetas, o que especialmente se refere a Abraão e a Isaac. – No regime da lei, a revelação profética teve por objeto a fé em Deus, de modo mais excelente que antes. Porque então era necessário instruir, nessa matéria, não só determinadas pessoas ou famílias, mas, todo o povo. Por isso, o Senhor disse a Moisés: Eu sou o Senhor, que apareci a Abraão, a Isaac e a Jacó, como o Deus todo poderoso; mas eu não lhes declarei o meu nome Adonai. E isso porque os Patriarcas precedentes foram instruídos na fé, na omnipotência de um só Deus; enquanto que Moisés o foi mais plenamente, sobre a simplicidade da divina essência, quando o Senhor lhe disse: Eu sou o que sou nome que os judeus exprimem pela palavra Adonai, por causa da veneração que votavam ao inefável nome de Deus, – Enfim, mais tarde, no tempo da graça, pelo próprio Filho de Deus foi revelado o mistério da Trindade, conforme o Evangelho: Ide e ensinai a todas as gentes, batizando–as em nome do Padre, e do Filho, e do Espírito Santo.

Ora, em todas estas épocas, a primeira revelação foi a mais excelente. – Pois, a primeira revelação, antes da lei, foi feita a Abraão, no tempo de quem os homens começavam a se desviar da fé num só Deus e declinar para a idolatria; ao passo que, antes, não era necessária essa revelação, quando todos perseveravam no culto de um único Deus. Quanto a Isaac, foi­lhe feita uma revelação inferior, quase fundada na revelação feita a Abraão. Por isso foi–lhe dito: Eu sou o Deus de Abraão, teu pai, e Deus de Isaac. – Do mesmo modo, no tempo da lei, a primeira revelação feita a Moisés foi mais excelente; e nela se fundam todas as outras revelações dos profetas. – E assim também, no tempo da graça, na revelação feita aos Apóstolos, sobre a fé na Unidade e na Trindade, se funda toda a fé da Igreja, como está no Evangelho, sobre esta pedra, isto é, na tua confissão, edificarei a Minha Igreja.

Quanto à fé na Encarnação de Cristo, é manifesto que os mais próximos dele, quer antes, quer depois, foram, em geral, mais plenamente instruídos nessas verdades. Mas depois, mais que antes, como o diz o Apóstolo.

Quanto à direção dos atos humanos, a revelação profética se diversifica, não pelo decurso dos tempos, mas, pela condição dos atos; pois, como diz a Escritura, quando faltar a profecia dissipar–se–á o povo. Por onde, em todos os tempos os homens foram instruídos por Deus sobre o que devem praticar, conforme as exigências da salvação dos eleitos.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – As palavras de Gregório devem entender–se dos tempos anteriores à Encarnação de Cristo, quanto ao conhecimento desse mistério.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Diz Agostinho: Assim como, na origem do império dos Assírios, existiu Abraão, a quem foram conferidas promessas evidentes, assim, era preciso que elas se espalhassem, no nascimento da Babilônia do ocidente, isto é, da cidade de Roma; porque, sob o seu império, devia nascer Cristo, em quem se cumpririam os oráculos dos profetas, cujas palavras e cujas escritos atestam esse sublime acontecimento, isto é, da promessa feita a Abraão. Pois, desde o tempo dos reis, os projetas não faltaram nunca ao povo de Israel e não surgiram, a princípio, senão no interesse desse povo. Mas, ao era menos obscura das profecias e que se dirige às nações devia começar com a era dessa cidade, isto é, de Roma, futura soberana das nações. Por isso, sobretudo no tempo dos reis, era necessário abundassem os profetas no meio desse povo, porque então este não andava oprimido pelos estrangeiros, mas tinha um rei próprio. Por onde, havia de ser instruído pelos profetas sobre como devia proceder, para agir quase livremente.

RESPOSTA À TERCEIRA. – Os profetas que predisseram o advento de Cristo não puderam durar senão até o advento de João, que mostrava com o dedo Cristo presente. E contudo, como diz Jerónimo, no mesmo lugar, isto não significa que depois de João não haveria mais profetas; pois, como lemos nos Atos dos Apóstolos, Agabo projetou, bem como as quatro virgens filhas de Filipe. E também, João escreveu um livro profético sobre o fim da Igreja. E em todos os tempos não deixou de haver quem tivesse o espírito de profecia, não para ensinar uma nova doutrina sobre a fé, mas, para dirigir os atos humanos. Assim, Agostinho refere que Teodósio Augusto mandou consultar no deserto do Egito um eremita chamado João, de quem lhe chegou aos ouvidos a fama geral do seu dom de profetizar, e dele recebeu a predição certíssima da vitória.

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