Skip to content

Art. 4 – Se a incontinência da ira é pior que a da concupiscência.

O quarto discute–se assim. – Parece que a incontinência da ira é pior que a da concupiscência.

1. – Pois, parece que tanto menos grave é a incontinência quanto mais difícil é resistir à paixão. Por isso diz o Filósofo: Não devemos nos espantar que alguém se deixa dominar por prazeres ou por sofrimentos fortes e violentos, mas antes, devemos lhe perdoar. Ora, como disse Heráclito, é mais difícil lutar contra a concupiscência do que contra a ira. Logo, mais leve é a incontinência da concupiscência que a da ira.

2. Demais. – Quando uma paixão veemente priva do juízo da razão, ficamos de todo escusado do pecado; tal é o caso de quem fica furioso por paixão. Ora, o de ira incontinente conserva mais o juízo da razão do que o incontinente por concupiscência pois, como está claro no Filósofo, o irado obedece de certo modo à razão, não porém o concupiscente. Logo, a incontinência da ira é pior que a da concupiscência.

3. Demais. – Tanto mais grave é um pecado quanto mais perigoso é. Ora, parece que a incontinência da ira é mais perigosa; pois, leva o homem a um pecado maior, que é o do homicídio, mais grave que o adultério, ao qual conduz a incontinência da concupiscência. Logo, a incontinência da ira é mais grave que a da concupiscência.

Mas, em contrário, diz o Filósofo, que menos má é a incontinência da ira que a da concupiscência.

SOLUÇÃO. – O pecado da incontinência pode ser considerado a dupla luz. Primeiro, relativamente à paixão que vence a razão. E neste caso, a incontinência da concupiscência é pior que a da ira, porque o movimento da concupiscência é mais desordenado que o da ira. E isto por quatro razões, que dá o Filósofo. – Primeiro, porque o movimento da ira participa de algum modo da razão; pois, o irado visa vingar–se da injúria que lhe foi feita, coisa às vezes ditada pela razão; mas não o faz perfeitamente, porque a sua vindicta não observa o modo devido. Ao contrário, o movimento da concupiscência provém totalmente do sentido e de nenhum modo obedece à razão. – Segundo, porque o movimento da ira resulta mais da compleição do corpo, por causa da rapidez desse movimento, que na ira se resolve. Donde vem que quem, por compleição corpórea, é disposto a irar–se, mais prontamente o faz do que cede à concupiscência quem a ela é predisposto. Por isso mais frequentemente de iracundos nascem iracundos, do que de concupiscentes, concupiscentes. Ora, o que provém da natural disposição do corpo considera–se mais digno de perdão. – Terceiro, porque a ira nos leva a agir às claras; ao contrário, a concupiscência busca esconderijos e em nós desperta subrepticiamente. ­ Quarto, porque o concupiscente goza com o seu ato, ao passo que o irado é como coagido por um sofrimento precedente.

De outro modo, podemos considerar o pecado da incontinência quanto ao mal em que caí quem se desvia da razão. E, então, a incontinência da ira é quase sempre mais grave, por conduzir a atos que danificam o próximo.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – É mais difícil lutar perseverantemente contra os prazeres que contra a ira, porque a concupiscência é mais contínua. Mas, no momento, é mais difícil resistir à ira, por causa da sua impetuosidade.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Diz–se que a concupiscência não participa da razão, não porque nos prive totalmente do juízo dela, mas porque nenhum ato pratica levada por esse juízo. E por isso é pior.

RESPOSTA À TERCEIRA. – A objeção colhe relativamente aos atos a que o incontinente é levado.

AdaptiveThemes