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Art. 1 – Se a incontinência pertence à alma ou ao corpo.

O primeiro discute–se assim. – Parece que a incontinência não pertence à alma, mas, no corpo.

1. – Pois, a diversidade dos sexos não pertence à alma, mas, ao corpo. Ora, na diversidade dos sexos funda–se a diversidade da incontinência; pois, no dizer do Filósofo, as mulheres não se consideram continentes nem incontinentes. Logo, a incontinência não pertence à alma, mas, ao corpo.

2. Demais. – O que respeita a alma não depende da compleição do corpo. Ora, a incontinência depende da compleição do corpo; pois, como diz o Filósofo, os mais agudos, isto é, coléricos, e os mais melancólicos, por deixarem desenfreada a. concupiscência, são os incontinentes. Logo, a incontinência pertence ao corpo.

3. A vitória é mais do vencedor do que do vencido. Ora, incontinente se chama quem deixa a carne concupiscente se avantajar ao espírito. Logo, a incontinência não mais pertence à alma que ao corpo.

Mas, em contrário, principalmente pela alma é que nos diferenciamos dos animais. Ora, é pela razão que a continência difere da incontinência; pois, não dizemos dos animais, que sejam continentes ou incontinentes, como o ensina o Filósofo. Logo, a incontinência pertence, sobretudo, à alma.

SOLUÇÃO. – Um efeito se atribui mais à sua causa própria que à sua causa acidental. Ora, o corpo é apenas causa ocasional da incontinência; pois, a disposição do corpo pode ser causa de surgirem paixões veementes no apetite sensitivo, que é uma potência do corpo orgânico. Ora, essas paixões, por mais veementes que sejam, não são a causa eficiente da incontinência, mas só a causa ocasional; porque, enquanto está no uso da razão, o homem sempre pode resistir às paixões. Se estas, porém, crescerem a ponto de privar totalmente do uso da razão, como acontece com aqueles que uma paixão veemente faz enlouquecer já não haverá possibilidade de se falar em continência nem em incontinência, por não conservarem esses tais o juízo racional, a que a continente obedece e que o incontinente transgride. Donde se conclui que a causa própria da continência está na alma, que não resiste, pela razão, às paixões. O que de dois modos pode–se dar, como diz o Filósofo. Primeiro, quando a alma cede às paixões, antes da razão deliberar, o que se chama continência irreprimida ou antecipação. Segundo, quando não perseveramos no que deliberamos por estarmos fracamente firmados no que a razão julgou, chamando–se por isso essa incontinência fraqueza. Por onde é claro que a incontinência pertence principalmente à alma.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – A alma humana é a forma do corpo e tem certas potências que se servem de órgãos corpóreos. E os atos delas afetam também aquelas operações da alma que não dependem do instrumento do corpo, isto é os atos do intelecto e da vontade; e isso porque o intelecto recebe a influência dos sentidos, e a vontade é impelida pelas paixões do apetite sensitivo. Ora, sendo assim, e por ter a mulher– de certo modo, uma fraca compleição corpórea, na maior parte das vezes ela adere fracamente ao que adere, embora em certos e raros casos tal não se dê, conforme aquilo da Escritura: Quem achará uma mulher forte? E o pequeno ou fraco sendo reputado como por não existente, daí vem que o Filósofo fala das mulheres como se não tivessem juízo firme da razão, embora com certas mulheres se dê o contrário. E por isso diz, que não chamamos às mulheres continentes, porque não dirigem, como quem tem uma razão sólida, mas são dirigidas, como que facilmente obedientes às paixões.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Do ímpeto da paixão resulta o nos deixarmos logo arrastar por ela antes de a razão deliberar. Ora, o ímpeto da paixão costuma provir, ou da sua velocidade, como se dá com os coléricos; ou da veemência, como nos casos dos melancólicos, que por causa da sua compleição térrea se inflamam veementissimamente. Assim como, ao contrário, acontece não perseverarmos naquilo a que fracamente aderimos, por causa da fraqueza da compleição, como é o caso das mulheres, segundo dissemos. O que também se dá com os fleugmáticos, pela mesma causa que nas mulheres. Pois, tal se dá, pela ocasião que, de certo modo, oferece à incontinência a compleição corpórea, a qual porem não é daquela uma causa suficiente, como dissemos.

RESPOSTA À TERCEIRA. – A concupiscência da carne, no incontinente, sobreleva o espírito, não necessariamente, mas por uma certa negligência deste, que não resistiu fortemente.

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