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Art. 5 – Se a gula é um vício capital.

O quinto discute–se assim. – Parece que a gula não é um vício capital.

1. – Pois, chamam–se vícios capitais os de que nascem os outros, em razão da causa final. Ora, a comida, objeto da gula, não exerce a função de fim; pois, não a buscamos em si mesma, mas, para a nutrição do corpo. Logo, a gula não é um vício capital.

2. Demais. – O vício capital parece ter uma certa preeminência em razão do pecado. Ora, tal não se dá com a gula, pois, parece que é, no seu gênero, o mínimo dos pecados, por se aproximar mais do que é natural. Logo, não deve a gula ser considerada um vício capital.

3. Demais. – O pecado consiste em abandonarmos o bem honesto por causa de alguma utilidade para a vida presente ou por causa de algum prazer sensível. Ora, só há um vício capital, a avareza, cujo objeto são os bens úteis. Logo, também os prazeres sensíveis parece deverem constituir o objeto de um só vício capital. E este é a luxúria, vício maior que a gula e que tem por objeto prazeres mais intensos. Logo, a gula não é um vício capital.

Mas, em contrário, Gregório enumera a gula entre os vícios capitais.

SOLUÇÃO. – Como dissemos, chama–se vício capital aquele de que nascem outros vícios, em razão da causa final; isto é, aqueles cujo fim é muito desejável e cujo deseja provoca os homens a pecarem muitas vezes. Pois, um fim torna­se muito desejável desde que realiza uma das condições da felicidade, que naturalmente desejamos. – Ora, a felicidade por natureza implica o prazer, como está claro em Aristóteles. Por onde o vício da gula, cujo objeto são os prazeres do tato, os mais intensos dos prazeres sensíveis. foi convenientemente enumerado entre os vícios capitais.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – A comida, em si mesma se ordena a algum fim; mas, como esse fim, que é a conservação da vida, é sumamente desejável, e ela não pode se sustentar sem a comida, daí vem o ser esta última sumamente desejável; e a ela se ordena quase todo o trabalho da vida humana, conforme aquilo da Escritura: Todo o trabalho do homem é para a sua boca. E contudo, a gula tem como objeto, antes, os prazeres do corpo, do que a comida. Por isso, como diz Agostinho, os que têm em pouco a saúde do corpo, querem antes alimentar–se, no que consiste o prazer, do que saciar–se; pois, o fim de todo esse prazer é não termos fome nem sede.

RESPOSTA À SEGUNDA. – O fim, no pecado, funda–se na conversão, ao passo que a sua gravidade, na aversão. Por onde, o vício capital, cujo fim é sumamente desejável, não há de necessariamente ter a grande gravidade.

RESPOSTA À TERCEIRA. – O deleitável é o desejável em si mesmo considerado. Por isso, à sua diversidade correspondem dois vícios capitais: a gula e a luxúria. Ao passo que o útil não é, por natureza, desejável, senão só enquanto ordenado para outro fim. Por isso, todos os bens úteis o são por uma mesma razão de apetibilidade. Donde vem que só há um vício capital que lhes concerne.

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