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Art. 4 – Se a temperança versa somente sobre as concupiscências e os prazeres do tato.

O quarto discute–se assim. – Parece que a temperança não versa somente sobre as concupiscências e os prazeres do tato.

1. – Pois, diz Agostinho, que o papel da temperança é coibir e acalmar a concupiscência, que nos arrasta a atos contrários à lei de Deus e ao fruto da sua bondade. E logo adiante acrescenta, que a junção da temperança é desprezar todos os atrativos do prazer e os louvores humanos. Ora, nem só as concupiscências dos prazeres do tacto nos afastam das leis de Deus, mas ainda, as dos prazeres dos outros sentidos, que também implicam os atrativos sensíveis. E o mesmo se dá com a cobiça das riquezas ou ainda a glória mundana; e por isso diz o Apóstolo, que a raiz de todos os males é a avareza. Logo, a temperança não versa somente sobre as concupiscências dos prazeres do tato.

2. Demais. – O Filósofo diz que quem é digno das pequenas coisas e com elas se dignifica, é temperado, mas não, magnânimo. Ora, as honras pequenas ou grandes, a que ele se refere, não são os prazeres do tato, mas os resultantes da apreensão da alma. ·Logo, a temperança não versa somente sobre as concupiscências dos prazeres do tato.

3. Demais. – Coisas do mesmo gênero parecem, pela mesma razão, pertencer à matéria de uma mesma virtude. Ora, todos os prazeres dos sentidos parecem pertencer a um mesmo gênero. Logo, pela mesma razão, pertencem à matéria da temperança.

4. Demais. – Os prazeres espirituais são maiores que os corpóreos, como se estabeleceu quando se tratou das paixões. Ora, às vezes, o desejo dos prazeres espirituais faz certos se afastarem das leis de Deus e do estado virtuoso; assim, quando levados pela curiosidade da ciência. Por isso, o diabo prometeu a ciência ao primeiro homem, quando disse: Sereis como uns deuses, conhecendo o bem e o mal. Logo, a temperança não versa somente sobre os prazeres do tato.

5. Demais. – Se os prazeres do tato fossem a matéria própria da temperança, ela deveria exercer–se sobre todos esses prazeres. Ora, tal não se dá; por exemplo, ela não tem lugar quando se trata de diversões. Logo, os prazeres do tato não são a matéria própria da temperança.

Mas, em contrário, diz o Filósofo, que a temperança versa propriamente sobre as concupiscências e os prazeres do tato.

SOLUÇÃO. – Como dissemos a temperança versa sobre as concupiscências e os prazeres, assim como a fortaleza, sobre os temores e as audácias. Ora, a fortaleza versa sobre os temores e as audácias, relativamente aos males máximos, que nos destroem a própria vida e que são os perigos de morte. Por onde e semelhantemente, a temperança há de versar sobre as concupiscências dos máximos prazeres. E como o prazer resulta de uma atividade que nos é conatural, tanto mais veementes são certos prazeres quanto mais forem resultantes de atividades mais naturais. Ora, as atividades naturais por excelência aos animais são as que, pela comida e pela bebida, conservam a natureza do indivíduo e, pela conjunção do macho e da fêmea, a natureza da espécie. Por onde, a temperança versa propriamente sobre os prazeres da comida e da bebida e sobre os venéreos. Ora, esses prazeres resultam do sentido do tato. Donde se conclui que a temperança regula esses prazeres.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ­ Agostinho, no lugar citado, considera a temperança, não como uma virtude especial com matéria determinada; mas, enquanto introduz a moderação racional, em qualquer matéria; o que é próprio da condição geral da virtude. Embora também se possa dizer que quem pode refrear os mais intensos prazeres, pode, com maior razão, refrear os menores. Por isso, a função própria e principal da temperança é moderar as concupiscências dos prazeres do tato; e o secundário, moderar as outras concupiscências.

RESPOSTA À SEGUNDA. – No lugar citado, o Filósofo designa, com o nome de temperança, a moderação das coisas externas, isto é, quando buscamos o que nos é proporcionado. Mas, não quer se referir à temperança enquanto moderadora dos afetos da alma, objeto dessa virtude.

RESPOSTA À TERCEIRA. – Os prazeres dos outros sentidos não se apresentam no homem do mesmo modo que nos animais. Pois, nestes, não derivam, dos outros sentidos, senão os prazeres ordenados ao sentido do tacto; assim, o leão se compras, vendo um cervo, ou ouvindo­lhe a voz, enquanto este lhe serve de alimento . . Ao passo que o homem goza prazeres dos outros sentidos, não só por se referirem à alimentação, mas, pela harmonia existente nas coisas sensíveis. E assim, os prazeres dos outros sentidos, enquanto relativos aos do tato, constituem, não principalmente, mas por consequência, matéria da temperança. Mas, quando os sensíveis dos outros sentidos causam prazer, pela conveniência que implicam: assim, quando nos deleitamos com um som harmonioso, – esse prazer não concerne à conservação da natureza. Por isso, essas paixões não são de tal modo principais que, por antonomásia, possamos chamar temperança à virtude que as rege.

RESPOSTA À QUARTA. – Os prazeres espirituais, embora sejam por natureza maiores que os corporais, contudo, não nos cativam de tal modo os sentidos e, por consequência, não nos atraem o apetite sensitivo de modo tão veemente, que seja necessária uma virtude moral para furtar, ao ímpeto deles, o bem da razão. – Ou devemos dizer que os prazeres espirituais, em si mesmos considerados, são segundo a razão. Por onde, só acidentalmente devem ser refreados, quando, por exemplo, um prazer espiritual nos impede outro mais elevado e mais do nosso estado.

RESPOSTA À QUINTA. – Nem todos os prazeres do tacto visam a conservação da natureza. Por isso, não há de necessariamente a temperança versar sobre todos os prazeres.

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