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Art. 2 – Se a jactância é pecado mortal.

O segundo discute–se assim. – Parece que a jactância é pecado mortal.

1. – Pois, diz a Escritura: Aquele que se jacta e que se acha de soberba, excita contendas. Ora, excitar contendas é pecado mortal, porque Deus detesta o que semeia discórdias, conforme ainda à Escritura. Logo, a jactância é pecado mortal. 

2. Demais. – Tudo o proibido pela lei de Deus é pecado mortal. Ora, àquilo da Escritura – Não te eleves no pensamento do teu coração ­ diz a Glosa: proíbe a jactância e a soberba. Logo, a jactância é pecado mortal.

3. Demais. – A jactância é uma espécie de mentira. Ora, não é mentira oficiosa nem jocosa o que se deduz do fim da mentira. Pois, como diz o Filósofo, o jactancioso finge ser mais do que na realidade é, ora, sem nenhum fim, ora, tendo em vista glórias e honras e ora, com a mira no dinheiro. Por onde, é claro que a jactância não é mentira jocosa nem oficiosa. Donde se conclui, que sempre é perniciosa. E portanto é sempre pecado mortal.

Mas, em contrário, a jactância nasce da vanglória, segundo Gregório. Ora, a vanglória nem sempre e pecado mortal, mas, às vezes, é venial, sendo então próprio só dos muitos perfeitos o evitá–Ia. Pois, diz Gregório: É próprio dos muito perfeitos buscam a glória de Deus com boas obras conhecidas dos homens, sem se glorificarem interiormente com os louvores que por causa delas receberam. Logo, a jactância nem sempre é pecado mortal.

SOLUÇÃO. – Como já dissemos mortal é o pecado; que contraria à caridade. Por onde, a jactância pode ser considerada à dupla luz. Primeiro, em si mesma, como uma espécie de mentira. E então é umas vezes pecado mortal e outras, venial. Mortal quando por jactância atribuimo–no o que vai contra a glória de Deus; assim, a Escritura diz do rei de Tiro: O teu coração se elevou e tu disseste – Eu sou Deus. Ou o que vai contra a caridade devida ao próximo, como quando por jactância prorrompemos em injúrias ao próximo, como refere o Evangelho do fariseu, que dizia: Nela sou como os mais homens, que são uns ladrões, uns injustos, uns adúlteros, como é também este publicano. Outras vezes porém a jactância é pecado venial, isto é, quando nos jactamos do que não vai contra Deus nem contra o próximo. – A outra luz podemos considerá–la na sua causa, isto é, a soberba ou o apetite do lucro ou da vanglória. E então, se proceder da soberba ou da vanglória, que são pecados mortais, também ela o será. Do contrário, será pecado venial. Mas, quem se desfaz, em jactâncias por apetite do lucro já por isso mesmo induz o próximo em engano e o danifica. Por isso, uma tal jactância é antes pecado mortal. Donde o dizer o Filósofo: Pior é quem se jacta com fito no lucro do que quem o faz para conseguir a glória ou honras. Contudo, nem sempre é pecado mortal, porque o lucro pode ser obtido sem dano de ninguém.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. –– Quem se jacta para provocar discórdias, peca mortalmente. Mas, às vezes se dá, que a jactância é causa, não essencial, mas acidental das discórdias. E nesse caso não é pecado mortal.

RESPOSTA À SEGUNDA. – A Glosa se refere à jactância enquanto procede da soberba proibida, que é pecado mortal.

RESPOSTA À TERCEIRA. – Nem sempre a jactância implica a mentira perniciosa; mas só quando contraria à caridade devida a Deus ou ao próximo, quer essencialmente; quer na sua causa. Ora, quem se jacta, quase deleitando–se com isso, mostra ser vão, como diz o Filósofo. Por onde, essa jactância se reduz à mentira jocosa. Salvo se o antepusesse ao amor divino ou se assim agindo, desprezasse os preceitos de Deus; pois, então iria contra a caridade devida a Deus, em quem só a nossa alma eleve descansar, como no seu fim último. E pratica uma espécie ele mentira oficiosa quem se jacta para alcançar glória ou lucro, contanto que o faça sem prejudicar a outrem, o que já constituiria mentira perniciosa.

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