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Art. 2 – Se a verdade é uma virtude especial.

O segundo discute–se assim. – Parece que a verdade não é uma virtude especial.

1. – Pois, a verdade e o bem entre si se convertem. Ora, a bondade não é uma virtude especial; ao contrário, todas as virtudes a supõem porque tornam bom quem as tem. Logo, a verdade não é uma virtude especial.

2. Demais. – Revelar o que nos concerne é um ato próprio da verdade, no sentido em que agora ela é considerada. Ora, qualquer outra virtude faz o mesmo, pois, todo ato virtuoso se manifesta pelo seu ato próprio. Logo, a verdade não é urna virtude especial.

3. Demais. – Chama–se verdade da vida a que nos leva a viver retamente; e ela diz a Escritura: Lembra–te, eu t'o peço, de como tenho andado diante de ti em verdade e com um coração perfeito. Ora, qualquer virtude nos leva a viver retamente, como o demonstra a definição supra referida da virtude. Logo, a verdade não é uma virtude especial.

4. Demais. – A verdade parece ser o mesmo que a simplicidade, pois, a uma e outra se opõe a simulação. Ora, a simplicidade não é uma virtude especial, porque torna a intenção reta, o que toda virtude supõe. Logo, também a verdade não é uma virtude especial.

Mas, em contrário, Aristóteles a enumera entre as outras virtudes.

SOLUÇÃO. – É da essência da virtude tornar bom o ato humano. Portanto, para praticar um ato bom, por uma bondade especial, há de o homem necessariamente ser disposto por uma virtude especial. E, o bem consistindo na ordem, como diz Agostinho, necessariamente a uma bondade de natureza especial corresponde uma ordem determinada. Ora, há uma ordem especial pela qual ordenamos as nossas palavras ou ações exteriores a um fim, como o sinal se ordena ao assinalado. E isso o alcançamos completamente pela virtude da verdade. Por onde é manifesto que a verdade é uma virtude especial.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – A verdade e o bem convertem–se, quanto ao seu sujeito; pois, toda verdade é bem e todo bem é verdade. Mas, pelas suas noções, mutuamente se excedem, assim como o intelecto e a Vontade mutuamente se incluem; pois, o intelecto intelige a vontade e muitas outras coisas, e a vontade deseja o objeto do intelecto, e muito mais. Por onde, a verdade, na sua noção própria, que é a perfeição do intelecto, é um bem particular, enquanto um certo apetível. E, semelhantemente, o bem, na sua noção própria, enquanto fim do apetite é de algum modo verdade, enquanto um certo inteligível. Mas, a virtude, incluindo a noção de bondade, pode a verdade ser uma virtude especial, como o verdadeiro é um bem especial. Mas não pode ser a bondade uma virtude especial, pois é, antes, racionalmente, um gênero de virtude.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Os hábitos virtuosos e viciosos se especificam pelos objetos, em si mesmos, buscados intencionalmente; mas, não pelo que é acidental e estranho à nossa intenção. Ora, o manifestarmos o que nos concerne supõe por certo a virtude da verdade, como o objeto principal da nossa intenção; mas, pode ser matéria de outras virtudes, por consequência, fora da intenção principal. Assim, o forte tem a intenção de agir fortemente; mas se, agindo fortemente, manifesta a força que tem, é isso uma consequência que não lhe constitui o principal da intenção.

RESPOSTA À TERCEIRA. – A verdade da vida é a do objeto verdadeiro e não a que nos leva a falar verdade. Pois, como qualquer outra realidade, chama–se verdadeira a vida que obedece à sua regra e à sua medida, isto é, à lei divina, da conformidade com a qual tira a sua retidão. E tal verdade ou retidão é comum a qualquer virtude.

RESPOSTA À QUARTA. – A simplicidade é assim chamada por oposição à duplicidade, pela qual temos uma intenção e manifestamos outra. E assim a simplicidade se inclui na Virtude de que tratamos. Pois, ela nos torna reta a intenção, não diretamente, porque esse é o papel de todas as virtudes, mas, por excluir a duplicidade, pela qual temos uma intenção e manifestamos outra.

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