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Art. 4 – Se em tudo devemos obedecer a Deus.

O quarto discute–se assim. – Parece que nem em tudo devemos obedecer a Deus.

1. – Pois, diz o Evangelho que o Senhor, tendo curado a dois cegos, ordenou–lhes: Vede lá que o não saiba alguém; mas eles, saindo dali, divulgaram por toda aquela terra o seu nome. E por isso não foram incriminados. Logo, parece que não estamos obrigados a obedecer em tudo a Deus.

2. Demais. – Ninguém está obrigado a agir contra a virtude. Ora, certas ordens de Deus há contrárias a ela; assim quando mandou Abraão matar o filho inocente; que os Judeus roubassem os bens dos Egípcios, o que é contrário à justiça; e que Oseas desposasse uma mulher adúltera, contrariamente à castidade. Logo não devemos obedecer a Deus em tudo.

3. Demais. – Todo o que obedece a Deus conforma a sua vontade com a de Deus, mesmo quanto ao que quer. Ora, não estamos obrigados a conformar a nossa vontade, em tudo quanto ela quer, com a vontade divina, como se estabeleceu.

Mas, em contrário, a Escritura: Faremos tudo o que o Senhor disse e lhe seremos obedientes.

SOLUÇÃO. – Como dissemos, quem obedece é movido pelo império daquele a quem obedece, assim como as coisas naturais são movidas pelos seus motores. Ora, sendo Deus o motor primeiro de todas as coisas naturalmente movidas, é também o motor primeiro de todas as vontades, como do sobredito se colhe. Por onde, assim como todos os seres naturais estão necessariamente sujeitos à moção divina, assim também, por uma certa necessidade de justiça, todas as vontades estão obrigadas a obedecer ao império divino.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – O senhor mandou os cegos ocultarem o milagre, não com a intenção de os obrigar por virtude de um preceito divino, mas, como diz Gregório, deu o exemplo aos seus discípulos futuros para procurarem ocultar as suas virtudes; e que contudo, mesmo contra a vontade, as revelassem quando outros devessem daí tirar proveito.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Embora Deus nada faça contra a natureza, porque, no dizer de uma glosa a um lugar do apóstolo, a natureza de uma coisa se revela pelo que Deus nela opera, contudo, age às vezes contra o curso habitual da natureza. Assim também, Deus nada pode mandar de contrário à virtude, pois a virtude e a retidão da vontade humana consiste principalmente em conformar–se com a vontade de Deus e obedecer–lhe ao império, embora este contrarie as vias habituais da virtude. – Por onde, a esta luz, a ordem dada a Abraão de matar o filho inocente, não colidiu com a justiça; porque Deus é o autor da: morte e da vida. ­ Também não foi contra a justiça o ter mandado aos Judeus, se apoderarem dos bens dos Egípcios, porque é dono de tudo e o dá a quem quiser. Do mesmo modo, não contrariou à castidade a ordem dada a Oseas de desposar uma mulher adúltera; porque Deus mesmo é o ordenador da geração humana, e o modo devido de o homem usar da mulher é o que Deus instituiu. – Por onde é claro que essas pessoas referidas não pecam, nem obedecendo a Deus e nem querendo obedecer.

RESPOSTA À TERCEIRA. – Embora o homem nem sempre esteja obrigado a querer o que Deus quer, contudo, é sempre obrigado a querer o que Deus quer que ele queira. E isto o homem o conhece mediante o preceito divino. Logo, está obrigado a obedecer em tudo aos preceitos divinos.

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