Skip to content

Art. 10 — Se o nome de Deus dele se predica univocamente, quanto à natureza, à participação e à opinião.

O décimo discute-se assim. — Parece que o nome de Deus se lhe atribui univocamente, quanto à natureza, à participação e à opinião.
 
1. — Pois, entre quem afirma e quem nega não há contradição se as palavras têm sentidos diversos, pois, a equivocação impede que se contradigam. Ora, o católico, dizendo — um ídolo não é Deus — contradiz o pagão que afirma um ídolo é Deus. Logo, Deus é tomado univocamente nessas duas expressões.
 
2. Demais. — Assim como um ídolo é Deus conforme uma certa opinião e não na realidade das coisas, assim o gozo dos prazeres carnais também se chama felicidade, de acordo com certa opinião e não na realidade. Ora, a palavra felicidade predica-se univocamente tanto da que o é, por opinião, como da que verdadeiramente é tal. Logo, também o nome de Deus se predica univocamente do Deus real, como do que uma opinião considera tal.
 
3. Demais. — São unívocos os termos que têm a mesma significação. Ora, quando um católico diz que Deus é uno, ele entende por esse nome um ser onipotente e digno de veneração, mais que todos os outros; e o mesmo entende o gentio quando diz que um ídolo é Deus. Logo, em ambos os casos o nome de Deus é empregado univocamente.
 
Mas, em contrário. — O que está na inteligência é uma semelhança do que existe na realidade, como diz Aristóteles1. Ora, o termo animal é empregado equivocamente quando atribuído a um animal verdadeiro e a um animal pintado. Logo, o nome de Deus é predicado equivocamente quando é atribuído ao Deus verdadeiro e ao que a opinião julga tal.
 
Demais. — Ninguém pode exprimir o que não conhece. Ora, o gentio não conhece a natureza divina. Logo, quando diz — um ídolo é Deus — não exprime a verdadeira deidade, a qual o católico exprime dizendo que Deus é um só. Logo, o nome de Deus não se predica unívoca, mas, equivocamente, do Deus verdadeiro e do que uma opinião qualquer julga como tal.
 
SOLUÇÃO. — O nome de Deus não é tomado, nas três significações propostas, nem unívoca, nem equívoca, mas analogicamente, o que assim se demonstra. Os termos unívocos têm a mesma significação; os equívocos têm significação diversa; nos análogos, porém, é necessário que a significação de um nome, tomado numa acepção, apareça na definição desse mesmo nome tomado em outras acepções. Assim, a palavra ser, predicado da substância, entra na definição de ser quando predicado do acidente; do mesmo modo são, predicado de um animal, entra na definição de são predicado da urina e de um remédio; pois, da saúde do animal, a urina é o sinal, e o remédio, a causa.
 
Ora, o mesmo se dá com o caso em questão, pois quando o nome de Deus é tomado pelo verdadeiro Deus, este vocábulo exprime, quer uma opinião, quer uma participação. Assim, quando dizemos que alguém é Deus por participação, entendemos por esse nome, um ser que tem semelhança com o verdadeiro Deus. Semelhantemente, quando dizemos que um ídolo é Deus, queremos, com o nome de Deus, designar um ser que a opinião dos homens considera tal. Por onde, é manifesto que são diferentes as significações esse nome; mas, uma delas está contida nas outras e, portanto, é claro que tal nome é predicado analogicamente.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — A multiplicidade de acepções dos nomes não depende da predicação mas, da significação deles. Pois, o nome de homem tem sempre a mesma significação, seja qual for a sua predicação, verdadeira ou falsa. Mas, teria múltiplas acepções, se com ele quiséssemos significar seres diversos; assim, se um quisesse designar com esse nome, o homem verdadeiro e outro, uma pedra ou coisa semelhante. Por onde, é claro que quando o católico diz que um ídolo não é Deus, contradiz ao pagão que tal afirma, porque ambos empregam o nome de Deus para designar o Deus verdadeiro. Mas, quando o pagão diz que um ídolo é Deus, não emprega esse nome para significar um Deus que uma opinião considera como tal, porque então diria a verdade; pois, que também os católicos às vezes empregam esse nome nessa significação, como quando a Escritura diz (Sl 95, 5): Todos os deuses das gentes são demônios.
 
E o mesmo devemos responder, à segunda e à terceira objeções. — Pois, essas objeções procedem, quanto à diversidade da predicação do nome, e, não, quanto à diversidade da significação.
 
RESPOSTA À QUARTA. — Não é em sentido puramente equivoco que predicamos o nome de animal, do animal verdadeiro e do pintado. Mas, o Filósofo2toma os nomes equívocos em sentido lato, enquanto em si incluem os análogos; pois o ente, empregado analogicamente é atribuído às vezes, equivocamente, aos diversos predicamentos.
 
RESPOSTA À QUINTA. — Nem o católico nem o pagão conhecem a natureza de Deus como ela é em si mesma; mas, só a conhecem pelas noções de causalidade ou de excelência ou de remoção, como já dissemos3. E neste sentido, quando o gentio usa do nome de Deus, dizendo — Um ídolo é Deus, pode tomá-lo na mesma significação em que o toma o católico quando diz que um ídolo não é Deus. Porém se houvesse alguém desprovido totalmente da noção de Deus, esse não poderia nomeá-lo, a não ser no sentido em que nós proferimos nomes cuja significação ignoramos.

 

  1. 1. I Periherm., lect. II.
  2. 2. Categor., cap. I.
  3. 3. Q. 12, a. 12.
AdaptiveThemes