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Art. 6 — Se há só um evo.

(II Sent., dist. II, q. 1, a. 2; Quodl., V, q. 4; Opusc. XXXVI, De Instant., cap. III).
 
O sexto discute-se assim. — Parece que não há um só evo.
 
1. — Pois, diz o livro apócrifo de Esdras (III, IV, 40): a majestade e o poder dos evos está em ti, Senhor.
 
2. Demais. — Gêneros diversos têm medidas diversas. Ora, certos seres eviternos — os corpos celestes — pertencem ao gênero das coisas corpóreas; outros, porém — os anjos — são substâncias espirituais. Logo, não há um só evo.
 
3. Demais. — Designando o evo a duração, os seres que têm o mesmo evo têm a mesma duração. Ora, nem todos os seres eviternos têm a mesma duração, porque uns começam a existir depois de outros, bem o demonstram as almas humanas. Logo, não há um só evo.
 
4. Demais. — Seres que não dependem uns dos outros não têm a mesma medida de duração; por isso é que todas as coisas temporais são medidas pelo mesmo tempo, porque a causa de todos os movimentos é, de certo modo, o primeiro movimento, medido pelo primeiro tempo. Ora, os seres eviternos não dependem uns dos outros. Logo, não há um só evo.
 
Mas, em contrário. — O evo é mais simples que o tempo e mais se aproxima da eternidade. Ora, o tempo é um só. Logo, com maior razão, o evo.
 
SOLUÇÃO. — Sobre este assunto houve duas opiniões. Uns dizem que o evo é um só e outros, que muitos. Para sabermos qual delas é a mais verdadeira, devemos considerar a causa da unidade do tempo, pois pelo conhecimento do corporal, chegamos ao do espiritual.  
 
Assim, uns dizem que há um só tempo para todos os seres corpóreos, porque só há um número para todas as coisas numeradas; pois, o tempo é número, segundo o Filósofo1. Mas, isto não basta, porque o tempo não é um número separado da coisa numerada, mas, nesta existente; do contrário, não seria contínuo, pois a continuidade de dez braças de pano, por exemplo, não está em um número, mas no pano numerado. Ora, o número existente nos numerados não é o mesmo para todos, mas cada um tem o seu.
 
Por isso, outros querem ver a causa da unidade do tempo na unidade da eternidade, princípio de toda duração. De modo que todas as durações se reduzem a uma, se lhes considerarmos o princípio; são muitas, pelo contrário, se considerarmos a diversidade dos seres que recebem a duração do influxo do primeiro princípio. — Outros, por fim, descobrem a causa da unidade do tempo na matéria prima, sujeito primeiro do movimento, cuja medida é o tempo. Ora, nenhuma destas duas opiniões pode ser considerada suficiente, porque seres que se unificam em virtude de um princípio, ou pelo sujeito, sobretudo remoto, não têm unidade, pura e simplesmente, mas sobre certo ponto de vista.
 
Por onde, a verdadeira razão da unidade do tempo é a unidade do primeiro movimento, pelo qual, sendo simplicíssimo, todos os demais são medidos, como diz Aristóteles2. Assim, pois, o tempo está para esse movimento, não só como a medida, para o medido, mas também como o acidente, para o sujeito e, portanto, dele recebe a unidade; ao passo que está para os outros movimentos somente como medida, para o que é medido; e nem se multiplica com a multidão deles, porque uma medida distinta pode medir muitas coisas.
 
Isto posto, devemos saber que houve dupla opinião a respeito das substâncias espirituais. Assim, uns diziam que todas ou, pelo menos, muitas, no sentir de outros, procederam de Deus em uma quase igualdade, como ensina Orígenes3. Outros, porém, diziam que todas as substâncias procederam de Deus num certo grau e numa certa ordem; este foi o sentir de Dionísio4que diz haver, entre as substâncias espirituais e ainda, numa mesma ordem de anjos, primeiras, médias e últimas. Ora, pela primeira opinião, é necessário admitirem-se vários evos correlativos aos vários seres eviternos primeiros e iguais. Pela segunda, é necessário admitir-se um só evo, porque, medindo-se cada ser pelo que é mais simples no seu gênero, como diz Aristóteles5, o ser de todas as criaturas coeternas há-de forçosamente ser medido pelo que o é primariamente, tanto mais simples quanto mais elevado for. Ora, sendo esta opinião mais verdadeira, como a seguir se demonstrará6, concedemos, no caso presente, que há um só evo.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Evo é às vezes tomado por século, período de duração de um ser; e, então consideram-se os evos muitos, como os séculos.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Embora os corpos celestes e os espirituais difiram pelo gênero da natureza, têm, contudo, de comum, o serem intransmutáveis, e, por isso, medem-se pelo evo.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — Embora os seres temporais não comecem todos simultaneamente, contudo, todos estão no mesmo tempo, por causa do movimento primeiro medido pelo tempo. E, assim, todos os seres eviternos têm um mesmo evo, em virtude do primeiro dentre eles, embora nem todos comecem simultaneamente.
 
RESPOSTA À QUARTA. — Para que várias coisas tenham a mesma medida, não é necessário que esta seja a causa de todas aquelas, mas, que seja mais simples que elas.
  1. 1. IV Physic., lect. XVII.
  2. 2. X Metaphys., lect. II.
  3. 3. lib. I Periarchon, cap. VIII.
  4. 4. Cael. hier., c. X.
  5. 5. X Met., lect. II.
  6. 6. Q. 47, a. 2; Q. 50, a. 4.
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