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Art. 3 – Se o mal tem no bem o seu sujeito.

(Supra, q. 9, a. 4, ad 2; II Sent., dist. XXXIV, q. 1, a. 4; III Cont. Gent., cap. XI; De Malo, q. 1, a. 2; Compend. Theol., cap. CXVIII).
 
O terceiro discute-se assim. – Parece que o mal não tem no bem o seu sujeito.
 
1. – Pois, todos os bens são existências. Ora, Dionísio diz que – o mal não é existente, nem está nos seres existentes1. Logo, o mal não tem no bem o seu sujeito.
 
2. Demais. – O mal não é um ente; mas o bem o é. Ora, o não-ser não exige um ser no qual exista como num sujeito. Logo, nem o mal exige o bem como sujeito de existência.
 
3. Demais. – Um contrário não pode ser sujeito de outro. Ora, o bem e o mal são con­trários. Logo, este não está naquele como no sujeito.
 
4. Demais. – Chama-se branco aquilo em que a brancura está como no seu sujeito. Logo, também o mal é aquilo em que a maldade está como no seu sujeito. Se portanto, o mal tiver no bem o seu sujeito, segue-se que o bem é mal, contra o que diz a Escritura (Is 5, 20): Ai de vós os que ao mal chamais bom, e ao bom mau!
 
Mas, em contrária, diz Agostinho, que o mal não pode existir senão no bem2.
 
Solução. – Como já se disse3, o mal importa a remoção do bem, não porém qualquer remoção. Pois, podemos considerar a remoção do bem pri­vativa e negativamente. A remoção do bem, negativamente considerada, não tem natureza de mal; do contrário se seguiria que as coisas de nenhum modo existentes seriam más; e ainda, que uma coisa seria má por não ter a bondade de outra coisa; por ex., que o homem seria mau por não ter a velocidade da cabra ou a fortaleza do leão. Porém a remoção do bem, em acepção privativa, chama-se mal; assim, a privação da vista chama-se cegueira. Ora, o sujeito da privação e da forma é um e o mesmo, a saber, o ser em potência; quer o ser em po­tência pura e simplesmente, como a matéria, que é sujeito da forma substancial e da priva­ção oposta; quer o ser em potência, sob certo ponto de vista, e em ato, absolutamente; como o corpo diáfano, que é sujeito das trevas e da luz. Ora, é manifesto que a forma pela qual alguma coisa existe em ato, é uma certa per­feição e um certo bem; assim que, todo ser em ato é um certo bem. E semelhantemente, todo ser em potência, como tal, é um certo bem en­quanto ordenado para o bem; pois, assim como é ser em potência, assim é bem em potência. Logo, resulta que o sujeito do mal é o bem.
 
Donde a resposta à primeira objeção. – Dionísio entende que o mal não está nos seres existentes, como se fosse parte ou propriedade natural de um ser existente.
 
Resposta à segunda. – O não-ser, em acepção negativa, não exige um sujeito. Mas a privação é a negação num sujeito, como diz Aristóteles4; e tal não-ser é o mal.
 
Resposta à terceira. – O mal não tem, como o sujeito, bem que se lhe opõe, mas algum outro bem; assim, o sujeito da cegueira não é a vista, mas o animal. Parece, então, como diz Agostinho, que nesta questão falha a regra dos dialectas, afirmando que os contrárias não pedem existir simultaneamente5. Deve-se porém entendê-la, segundo a acepção comum do bem e do mal e não enquanto especialmente se consi­dera tal bem e tal mal. Assim, o branco e o preto, o doce e o amargo e semelhantes contrá­rios não se tomam senão em acepção especial, por estarem em certos gêneros determinados. Mas o bem abrange todos os gêneros; por onde, um bem pode simultaneamente existir com a privação de outro.
 
Resposta à quarta. – O profeta impreca o ai! contra os que dizem que o bem, como tal, é mau. Isto, porém, não resulta das premissas, como se vê do que foi dito.

  1. 1. De div. nom., cap. IV (lect. XXIII).
  2. 2. Enchir. (cap. XIV).
  3. 3. Q. 48, a. 1.
  4. 4. IV Metaph. (lect. III).
  5. 5. In Enc., cap. XIV.
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