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Art. 3 ─ Se a escravidão pode sobrevir ao matrimônio por ter-se o marido vendido a outrem como escravo.

O terceiro discute-se assim. ─ Parece que a escravidão não pode sobrevir ao matrimônio por ter-se o marido vendido a outrem como escravo.

1. Pois, a ação feita em fraude e detrimento de outrem não deve ser ratificada. Ora, o marido que se vendeu como escravo fá-lo-á às vezes em fraude do matrimônio, e pelo menos em detrimento da esposa. Logo, não deve ser válida essa venda para produzir a escravidão.

2. Demais. ─ Duas instituições protegidas pelo direito sobrelevam a uma dele não protegida. Ora, o matrimônio e a liberdade são assim protegidos e repugnam à escravidão, não protegida pelo direito. Logo, a escravidão sobreveniente ao matrimônio deve anulá-lo totalmente.

3. Demais. ─ No matrimônio o marido e a mulher estão no mesmo pé de igualdade. Ora, a mulher não pode vender-se como escrava, contra a vontade do marido. Logo, nem o marido, contra a da mulher.

4. Demais. ─ O obstáculo na ordem natural à geração de um ser, destrói também o ser já produzido. Ora, a escravidão do marido, com a ignorância da mulher, impede o matrimônio de ser contraído. Logo sobrevindo-lhe, destrui-lo-á, O que é inadmissível.

Mas, em contrário. ─ Todos podemos dar a quem quisermos o que nos pertence. Ora, o marido, sendo livre, pode dispor da sua pessoa. Logo, pode ceder a outrem o seu direito.

2. Demais. ─ O escravo pode casar contra a vontade do dono, como se disse. Logo e pela mesma razão, o marido poderá fazer-se escravo de um senhor, contra a vontade da mulher.
 
SOLUÇÃO. ─ O marido está sujeito à mulher só no concernente ao ato natural do casamento, por onde são iguais e a que não se estende a sujeição da escravidão. Logo, o marido pode vender-se como escravo, mesmo contra a vontade da mulher. O que, pois, não dissolve o casamento, porque nenhum impedimento superveniente pode fazê-lo, como se disse.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ A fraude bem pode prejudicar a quem a cometeu; não pode porém causar dano a terceiros. Por onde, o marido que se vender como escravo a outrem, em fraude da esposa, sofrerá ele o dano, perdendo o dom inestimável da liberdade. A mulher porém nenhum dano poderá advir daí, pois continuará o marido obrigado ao dever conjugal e a todas as mais exigências do matrimônio. Pois, a elas não pode eximir-se por ordem do senhor.

RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Repugnando ao matrimônio, há de a escravidão por força prejudicá-lo; pois, então, o escravo continuará obrigado a cumprir o dever conjugal para com a mulher, mesmo contra a vontade do senhor.

RESPOSTA À TERCEIRA. ─ Em relação ao ato matrimonial e às funções naturais, o marido e a mulher são considerados iguais e isentos das condições da escravidão. Contudo, quanto ao governo da casa e ao mais que se acrescenta ao matrimônio, o marido é a cabeça da mulher e deve governá-la; mas não do inverso. Portanto, a mulher não pode vender-se como escrava, contra a vontade do marido.

RESPOSTA À QUARTA. ─ A objeção colhe quanto às coisas susceptíveis de corrupção; pois, nessa ordem, há muitas causas impeditivas da geração e que contudo não bastam a destruir o ser já produzido. Para os seres perpétuos, porém, pode um obstáculo impedir a um deles a existência, mas não que deixe de existir. Tal o caso da alma racional. Ora, o mesmo se dá com o matrimônio, que é um vínculo perpétuo e perdura enquanto perdurar a vida.

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