Família e moral (139)
Irmãs da Fraternidade São Pio X
Francisco está estudando no quarto ano no colégio mais famoso da cidade. Ao voltar da aula, ele entrega à sua mãe, Andreia, o boletim com as notas do bimestre. “Que bom!”, pensa Andreia: “Francisco tirou notas excelentes em matemática e em português. Com a sua prática em idiomas, com certeza ele vai poder entrar nas melhores universidades do país!”.
E Andreia já imagina seu filho sendo um advogado de prestígio, um engenheiro com êxito ou um cientista eminente... Que mãe não tem grandes ambições para seus filhos?
Ao mesmo tempo, Gustavo - estudando no 5º. ano no Colégio São Pio X – também entrega a Silvina, sua mãe, as suas notas bimestrais. Silvina lê com atenção: Catecismo: 9; Comportamento geral exemplar: bom espírito, responsável e prestativo com os menores. Silvina sonha também com o futuro do seu filho: “O que será de Gustavo no futuro? Um bom pai com uma família numerosa? Talvez padre?” (Clique para continuar)

André Charlier
Esta carta de André Charlier merece ser lida duas vezes. Uma, por seu conteúdo e oportunidade; Outra, tendo-se em vista a data em que foi escrita, 22 de outubro de 1954, quando Charlier era diretor da escola preparatória de Clères, na Normandia.
Embora escrita para pais franceses, estas breves reflexões certamente interessarão ao leitor brasileiro.
(Continue a leitura)
Pe. Juan Carlos Iscara, FSSPX
Como não há ensinamento oficial da Igreja sobre esse tema, devemos fazer a aplicação dos princípios gerais morais ao caso concreto do boxe.
Um dicionário define o boxe como “um esporte de combate em que duas pessoas, normalmente usando algum tipo de equipamento de proteção, trocam socos por um tempo pré-determinado e em um ringue”. Outro dicionário define-o como “desferir e defender golpes sem a intenção de machucar o oponente severamente”, mas deve-se concordar que isso não é uma definição realista das lutas de Boxe que vemos na TV.
Ambas as definições concordam que ele é um esporte de combate no qual socos são trocados, mas devem-se fazer distinções levando em conta as intenções dos lutadores, seus objetivos e as circunstâncias concretas da troca de socos. Em outras palavras, deve-se distinguir entre o que chamamos de boxe amador e o profissional.
A princípio, não parece haver nenhuma objeção ao Boxe amador entre os teólogos. Seus defensores alegam que é um esporte que oferece oportunidade de desenvolvimento físico e força, melhora na autoconfiança e disciplina, formação de caráter e espírito desportivo. Eles até realçam que essas vantagens do esporte são de tal modo que até São Paulo, levando em conta a autodisciplina a ser exercitada em nossa vida cristã (1Cor 9, 25-27), faz analogia com o Boxe.
Como a disputa toma lugar em condições supervisionadas e, normalmente, usa-se equipamento de proteção, a possibilidade de dano físico é limitada. Além disso, as habilidades adquiridas também podem ser utilizadas fora do ringue em casos de autodefesa genuína, ou para defender outra pessoa.
Apesar disso, também há teólogos que alegam que, como a natureza humana é frágil, até mesmo as formas mais benignas de pugilismo amador podem se tornar moralmente repreensíveis porque os lutadores, embora não desfiram socos com a mesma intenção ou potência que no boxe profissional, podem se deixar levar pelo desejo de vencer e, assim, infligir dano físico imoderado ao oponente.
Os problemas surgem no caso do boxe profissional.
Há esportes em que há o risco de dano físico. Porém, tal dano é acidental, não intencional. Se for infligido de propósito, ele é penalizado.
O boxe profissional é um esporte cujo objetivo primário é privar o oponente da habilidade de lutar, não simbolicamente (como no Jiu-Jitsu ou no Wrestling, por exemplo, imobilizando o oponente), mas ao bater e lesionar o oponente até que ele se torne indefeso, deixando-o fisicamente incapaz de continuar a luta.
O risco de tais danos é tal que o jornal do Vaticano La Civiltà Cattolica chamou o Boxe profissional de “uma forma legalizada de tentativa de homicídio”, notando que os lutadores, normalmente, sofrem danos físicos e psicológicos.
O 5º Mandamento proíbe infligir, intencionalmente, dano físico a si mesmo ou ao próximo. Como criaturas, não temos domínio absoluto sobre nossos corpos e muito menos sobre os corpos dos outros. Somos apenas administradores, encarregados do dever e do privilégio de administrá-los com razoabilidade. Domínio absoluto pertence apenas a Deus.
Um dano deliberado, intencional ao corpo humano é moralmente permissível apenas com uma causa razoável ou se houver um bem que o compense – por exemplo, nocautear ou afogar um homem para o salvar [como no caso de um suicida], cortar um membro para salvar uma vida. Mas no boxe profissional não há essa causa razoável ou o bem que compense, pois o dano físico sofrido por ambos os lutadores não é proporcional ao bem que eles obtêm – fama, riqueza, orgulho de sua superioridade física.
Um acadêmico recente também enfatizou os efeitos na sociedade do Boxe profissional – ele glamouriza a violência, encoraja a ideia de enriquecer e tornar-se famoso através de agressão física e é acompanhado de uma comercialização que favorece a brutalização de todos os esportes de combate.
Ele também pode ter efeitos deletérios sobre nós, os espectadores. É espiritualmente perigoso tomar parte nesses espetáculos. Um filósofo pagão, Sêneca, já havia avisado que quando tornamos a lesão ou a morte de seres humanos um esporte, nós mesmos nos tornamos menos humanos. Santo Tomás não conhecia o boxe profissional, mas, com um conhecimento inerrante da natureza humana, ele apontava que tirar prazer do sofrimento desnecessário de outro homem é um ato bárbaro.
Em suas Confissões, Santo Agostinho fala de um amigo amado, Alípio, que havia desenvolvido uma paixão enorme pelos espetáculos dos gladiadores, realçando tanto o apelo de assistir a violência quanto nosso esforço normalmente infrutífero de resistir a ele. Santo Agostinho descreve os jogos dos gladiadores como “um delírio de excesso extravagante”, com multidões comemorando, enquanto homens são machucados. “Enquanto via o sangue, ele bebia da selvageria ao mesmo tempo” E, longe de ser um deleite momentâneo, quando Alípio voltava do anfiteatro, ele “não era mais o homem que havia entrado ali... Ele saiu dali trazendo consigo a loucura que havia contemplado”. Certamente, o Boxe profissional moderno não vai a esses extremos de banho de sangue. Porém, ele ainda apetece a uma paixão primitiva encarvada em nossa natureza decaída, uma paixão que, de qualquer modo, pode ser superada com a graça de Deus, como Alípio fez, mais tarde tornando-se o Santo Bispo de Tagasta.
Pe. Juan Carlos Iscara, FSSPX
Todo homem tem direito a uma boa reputação, à boa opinião que comumente se tem sobre ele, pois ninguém deve ser considerado mau até que se prove que ele de fato é mau. Portanto, a difamação injusta do próximo constitui um pecado contra a justiça estrita.
Julgamento é a afirmação ou negação de uma coisa (p. ex., que algo é bom ou não). Um julgamento pode ser verdadeiro ou falso, dependendo de se está ou não de acordo com a verdade objetiva; verdadeiro ou provável, se afirmado ou negado com certeza ou apenas com probabilidade; prudente ou temerário, se emitido com fundamento suficiente ou insuficiente.
Levando em conta essas noções, chegaremos às seguintes conclusões sobre suspeitas infundadas e julgamentos temerários.
Uma suspeita temerária existe quando, sem fundamento suficiente, começamos a duvidar da conduta ou das intenções de nosso próximo, embora sem afirmá-lo definitivamente.
É um pecado contra a justiça devido ao direito do próximo à sua boa reputação, até que se prove o contrário. Mas por não ter assentimento firme, a simples suspeita não lesiona gravemente o próximo, e pode ser justificada de algum modo pelas ações do próximo ou por nossa própria fraqueza humana, que nos torna inclinados a essas suspeitas.
Mas ela pode ser séria em algumas circunstâncias, por exemplo, se a suspeita temerária (a opinião a fortiori) se refere a um pecado muito sério e que não é habitual da pessoa, ou se a pessoa é de reconhecida virtude. Nesses casos, há um pecado mortal na simples suspeita deliberadamente admitida e mantida, pela lesão séria que se comete ao próximo.
Santo Tomás explica as causas dessas suspeitas temerárias:
“Como diz Túlio, a suspeita implica a opinião do mal, fundada em leves indícios. E isto pode dar-se por três razões. -- Primeiro, porque, sendo maus, em nós mesmos, facilmente opinamos mal dos outros, por estarmos como que cônscios da nossa malícia, conforme aquilo da Escritura: O insensato que vai pelo caminho, sendo ele um insipiente, a todos reputa por insensatos. -- Segundo, porque somos mal afeiçoados para com outrem. Pois, odiando-o ou desprezando-o, ou tirando-nos contra ele e invejando-o, pensamos mal do mesmo, fundados em leves indícios. Porque cada um facilmente crê o que deseja. -- Terceiro, por causa da longa experiência; por isso, diz o Filósofo, que os velhos são suspeitosos, por excelência, porque muitas vezes experimentaram os defeitos dos outros. Ora, as duas primeiras causas da suspeita implicam manifestamente a perversidade do afeto. A terceira causa, porém, diminui a suspeita, na sua natureza mesma, porque a experiência nos conduz à certeza que é contra a natureza da referida suspeita. Por onde, a suspeita implica em certo vício e, quanto mais suspeita é, tanto mais é viciosa.” (II-II, q.60, a.3)
Um julgamento temerário é o assentimento firme da mente (não apenas uma simples dúvida, suspeita ou opinião), sem fundamento suficiente, acerca dos pecados ou intenções maliciosas do próximo.
É um pecado grave contra a justiça em razão da grave injúria que inflige sobre o próximo, que tem direito de preservar sua reputação até mesmo em nossos pensamentos internos, até que haja prova do contrário. Mas admite leveza da matéria e então, por exemplo, pode ser pecado venial julgar temerariamente que o próximo está mentindo para parecer melhor do que realmente é. A seriedade maior ou menor de um julgamento temerário depende não apenas da qualidade do crime que se presume, mas também da maior ou menor desproporção entre o julgamento e as razões que levaram a ele.
A Sagrada Escritura proíbe severamente esses julgamentos temerários, e Cristo nos avisa que seremos julgados da mesma maneira que julgamos os outros: “Não julgueis, para que não sjais julgados. Pois, segundo o juízo com que julgardes, sereis julgados; e com a medida com que medirdes vos medirão também a vós. Por que olhas tu para a aresta que está no olho de teu irmão e não notas a trave no teu olho? (Mt 7,1-3).
“Com efeito, o juízo será sem misericórdia para aquele que não usou de misericórdia; mas a misericórdia triunfa do juízo” (Tg 2,13). Essas palavras do Apóstolo São Tiago resolvem, por si mesmas, a objeção que frequentemente se faz ao salutar conselho cristão de sempre interpretar em um bom sentido as intenções do próximo até que o contrário seja certo. É verdade que, ao fazê-lo, corremos o risco de errar muitas vezes. Mas esse erro será para nosso maior benefício, porque, ao tempo de nosso julgamento, Deus usará da mesma misericórdia que usamos com o próximo.
Há, além disso, outra razão, que Santo Tomás explica admiravelmente:
“Pode acontecer que quem interprete no sentido mais favorável frequentemente, se engane. Mas, é melhor enganar-se mais frequentemente, formando opinião boa de um homem mau, do que enganar-se raras vezes, fazendo má opinião de um homem bom. Porque, o primeiro modo de proceder injuria a outrem e o segundo, não” (II-II, q.60, a.4, ad)
Pe. Juan Carlos Iscara, FSSPX
A Lei natural impõe a todos os homens a obrigação de adorar a Deus. E Ele mesmo definiu como os homens deveriam cumprir essa obrigação ao emitir Seu preceito divino no Antigo Testamento. O Terceiro Mandamento da Lei de Deus diz:
“Lembra-te de santificar o dia de sábado. Trabalharás durante seis dias e farás (neles) todas as tuas obras. O sétimo dia, porém, é o sábado (o dia de repouso), consagrado ao Senhor, teu Deus; não farás nele obra alguma, nem tu, nem teu filho, nem tua filha, nem o teu servo, nem a tua serva, nem o teu gado, nem o peregrino que está dentro das tuas portas. Porque o Senhor fez, em seis dias, o céu e a terra e o mar e tudo que neles há e descansou ao sétimo dia; por isso o Senhor abençoou o dia de sábado e o santificou” (Ex 20, 8-11)
Após a Ressurreição de Cristo, esse dia se tornou o Domingo, o “dia do Senhor” – “dies Domini”.
Consequentemente, a Igreja, em seu primeiro mandamento, determinou como os cristãos devem santificar o domingo e os dias de preceito prescrevendo certos atos e proibindo outros, como foi detalhado no Código de Direito Canônico de 1917:
“Nos dias de preceito, deve-se ir à Missa; deve-se abster de trabalho servil, atos jurídicos e, de modo semelhante, a não ser que haja um indulto especial ou que os costumes locais disponham de modo contrário, deve-se abster de comércio, compras e outros atos de compra e venda públicos” (Cânone 1248).
Enquanto o Sábado judaico era marcado principalmente pelo descanso, a Igreja, desde o princípio, deu ao Dia do Senhor um foco mais espiritual, dando primazia ao aspecto positivo, isto é, à obrigação de render a Deus o culto que Lhe é devido e de tomar conta das coisas que dizem respeito à alma da pessoa. A Lei da Igreja deu concretude a esses deveres com a obrigação de no mínimo ir à Missa.
Apesar disso, o dever de descanso também permanece sem sombra de dúvidas. Ele inclui abster-se de trabalhos servis [braçais], procedimentos judiciais e mercados públicos. Abstenção do trabalho e o descanso em decorrência dele, além de ter o propósito natural de restaurar nossas forças, tem a finalidade religiosa clara de nos ajudar a dar atenção a Deus e a desviá-la do mundo.
Em uma edição anterior de The Angelus (Maio-Junho de 2022), tratamos de como cumprir a primeira parte do preceito eclesiástico, a obrigação positiva de ir à Missa. Agora, vamos dar atenção ao aspecto negativo, abster-se do trabalho, um dever que, no mundo de hoje, costuma ser desprezado até por católicos.
Qual é a disciplina tradicional acerca do trabalho aos Domingos?
O Catecismo do Concílio de Trento explicou que o descanso sabático significa abster-se de trabalhos servis:
“Todos os trabalhos servis são proibidos, não porque sejam ruins em si mesmos, mas porque eles tiram atenção do culto de Deus, que é o fim último do mandamento”
Mas o que é “trabalho servil”? Embora o termo seja usado pela Igreja por séculos, ele nunca foi definido, e mesmo o Código de Direito Canônico de 1917 se absteve de defini-lo. A descrição do que constitui trabalho “servil” deve ser encontrada nos decretos de certos Concílios, no ensinamento dos teólogos e nos costumes locais que a Igreja aceitou.
A maioria dos manuais de Teologia moral o descrevem como um trabalho físico, manual, feito pelas necessidades e pelos ganhos do corpo; o tipo de trabalho que, no passado, era desempenhado por escravos ou, em tempos mais recentes, por empregos domésticos e lavradores contratados. Enquadram-se nessa categoria os trabalhos agriculturais (aragem, cavar, etc) e trabalhos mecânicos ou industriais (prensa, construção, engessamento, etc).
Ele se distingue dos trabalhos “liberais”, que são produto principalmente das faculdades mentais, imediatamente direcionados ao desenvolvimento da mente e que, no passado, eram realizados por pessoas que não eram escravos ou servos. Trabalhos desse tipo são os trabalhos intelectuais (ensinar, ler, escrever, estudar, etc), trabalhos artísticos (tocar música, cantar, desenhar, pintar, bordar etc) e também trabalhos de recreação (esportes moderados ou diversões, como futebol, baseball, tênis e xadrez).
Na disciplina tradicional, para discernir se uma atividade constitui trabalho servil ou liberal, o fator determinante é a natureza do trabalho em si (finis operis), sem levar em consideração nenhuma circunstância extrínseca, como o propósito do agente (finis operantis), ou o esforço físico despendido para o trabalho, ou sua duração. Portanto, se o trabalho for “servil” ele permanece proibido por qualquer motivo que seja.
A obrigação é grave, mas a contravenção do preceito pode ser consideravelmente reduzida se o trabalho não requerer esforço excessivo, não durar mais de 2 horas e não causar escândalo.
Como Nosso Senhor também disse que “o Sábado foi feito para o homem, e não o homem para o Sábado” (Mc 2, 27), a Igreja, distanciando-se de excessos farisaicos, reconhece diferentes razões que podem escusar a abstenção do trabalho no Sábado:
- Necessidade ou dever para com o próximo permite o trabalho no Domingo ao menos em alguma medida (por exemplo, aqueles que devem trabalhar no Domingo para sobreviver, ou para se manter fora de risco sério, ou para prestar serviços ou obras de caridade que não possam ser realizados facilmente em outro tempo);
- Piedade para com Deus, trabalhando naquilo que é imediatamente necessário para o culto divino;
- Costumes que permitem trabalhos necessários, como cozinhar, serviços domésticos ordinários, etc
- Dispensa pode ser dada sob certas condições pelo pároco para seus paroquianos. Um confessor não tem poder para dispensar nessa matéria, mas, em casos dúbios, ele pode interpretar a lei e permitir que seus penitentes façam trabalhos necessários.
É claro que nem toda razão escusa do preceito. Portanto, aqueles que, desnecessariamente, colocam-se em situação de impossibilidade de observar a lei cometem um pecado (por exemplo, aceitando um trabalho que peça que trabalhem o Domingo inteiro), ou aqueles cujas razões são frívolas (como aqueles que trabalham no Domingo só para ter algo para fazer).
Para evitar o autoengano, os fiéis devem consultar seu pastor ou confessor, se houver dúvida acerca da suficiência da escusa.
O que a legislação atual diz?
Através do Século XX, e especialmente após as duas grandes guerras, considerando as circunstâncias sociais e econômicas alteradas do mundo, houve muita discussão entre os teólogos acerca da definição de trabalho servil.
Um eco dessas discussões encontra-se na presente disciplina da Igreja, que está estabelecida no Cânone 1247 do Novo Código de Direito Canônico, promulgado em 1983:
“No domingo e nos outros dias de festa de preceito, os fiéis têm a obrigação de participar na missa; além disso, devem abster-se das atividades e negócios que impeçam o culto a ser prestado a Deus, a alegria própria do dia do Senhor e o devido descanso da mente e do Corpo”
O novo Código, em comparação com a legislação anterior, não menciona o trabalho “servil”, porém mantém a obrigação de abster-se de trabalho aos Domingos, ao mesmo tempo em que altera a ênfase de como deve ser feito, acrescentando a referência ao “descanso da mente e do corpo”.
O Catecismo da Igreja Católica (n. 2187) desenvolve o requisito canônico:
“Santificar os domingos e festas de guarda exige um esforço comum. Todo o cristão deve evitar impor a outrem, sem necessidade, o que possa impedi-lo de guardar o Dia do Senhor. Quando os costumes (desporto, restaurantes, etc) e as obrigações sociais (serviços públicos, etc) reclamam de alguns um trabalho dominical, cada um fica com a responsabilidade de um tempo suficiente de descanso. Os fiéis ficarão atentos, com moderação e caridade, para evitar os excessos e violências originados às vezes nas diversões de massa. Não obstante as pressões de ordem econômica, os poderes públicos preocupar-se-ão em assegurar aos cidadãos um tempo destinado ao repouso e ao culto divino. Os patrões têm obrigação análoga para com os seus empregados”
Então, o que devemos fazer?
Como podemos ver, a nova legislação não contradiz, nem rejeita o que a Igreja pedia antes, mas expressa-a em termos mais gerais. Ao mesmo tempo, realça o espírito no qual a lei deve ser observada, isto é, o objetivo que o legislador – Deus e a Igreja – desejava obter ao impor uma obrigação particular. Como São Paulo (2Cor 3, 6) já havia explicado, devemos evitar desprezar o espírito da lei ao cumprir sua letra.
Portanto, em geral, devemos submeter-nos à disciplina tradicional, mas sem perder de vista os critérios expandidos de discernimento que a nova lei trouxe.
A abstenção do trabalho servil visa permitir-nos livrar-nos de nossa labuta diária, deixando-nos livres para render a Deus o culto que Lhe é devido. Ela também nos permite cuidar do bem de nossas almas, dando-nos tempo e oportunidades de descanso e divertimentos honestos. De tempos em tempos, precisamos de uma pausa das preocupações e cansaços inerentes ao esforço diário. Sem recreações prudentes e bem administradas, nossas forças físicas e mentais logo ficariam exaustas, incapacitando-nos para qualquer tipo de trabalho.
Portanto, no Domingo, devemos, preferencialmente, dar tempo a Deus, às coisas espirituais e à elevação de nossas almas a Ele. Claro, ir à Missa é o mínimo que a Igreja requer, mas isso não significa que podemos esquecer Deus pelo resto do dia e apenas aproveitar o descanso.
Embora a Igreja não imponha uma observância excessiva, farisaica do descanso do Domingo, ela também não admite lassidão na observância do Dia do Senhor. Como um autor colocou, “o Domingo não precisa ser fúnebre, mas também não pode ser ateu”
Não podemos entregar-nos a coisas inapropriadas ou danosas para nós ou para outros, nem perder completamente nossa seriedade da alma, ou fazer algo em circunstâncias desonestas.
Portanto, nosso Domingo não pode ser tomado por jogos ou pela televisão, por conversas fúteis ou risadas sem propósito, ou ficarmos grudados no computador, olhando sem parar nossas redes sociais – ações que, em si mesmas, não são necessariamente más, mas que tiram nossas mentes e corações de Deus.
Alguns exemplos práticos
Às vezes, pessoas de boa fé se encontram em situações complicadas, porque gostam de relaxar com atividades aos Domingos como jardinagem, que, em sentido estrito, seriam um trabalho “servil” e, portanto, estariam proibidas.
Mas mesmo a legislação tradicional considerava que tal trabalho não seria uma violação séria do descanso do Domingo se não demandasse um esforço físico intenso, se fosse realizada por um breve período, sem causar escândalo e sem interferir com nossas obrigações para com Deus.
À luz do novo Código, o mesmo trabalho, realizado em tais circunstâncias, também seria permitido se com a intenção de relaxamento e recreação, como uma maneira simples de se afastar das preocupações que atingem nossas mentes pelo resto da semana. Se esse for o caso, essas almas não precisam se preocupar.
Por outro lado, a legislação tradicional permitia trabalho intelectual, “liberal”, tal como o de um advogado preparando um processo, um arquiteto desenhando planos de uma construção, um contabilista preparando declarações de impostos, etc.
Mas à luz da legislação recente, essas atividades – embora não constituam pecado, pois são autorizadas pela lei anterior – devem ser desencorajadas, ao menos como imperfeições, se desnecessariamente trouxerem para o Domingo as preocupações mundanas e as tarefas que nos absorvem nos demais dias da semana, pois, nesses casos, o espírito da lei, a intenção do legislador, não estaria adequadamente atingida.
Em conclusão
Todas essas explicações servem para nos ajudar a emitir um julgamento prudente quando se trata de decidir se devemos ou não realizar certo trabalho ou atividade.
Apesar disso, devemos não apenas evitar o pecado, mas também buscar uma perfeição maior em todas as nossas ações. Portanto, não devemos tentar tirar vantagem de qualquer brecha que encontrarmos ou procurar desculpas. O amor de Deus, fortalecendo nosso bom senso e guiando nosso discernimento prudencial, deve prevalecer em tudo e acima de todas as coisas.
Nesse tema de se abster do trabalho, devemos ter em mente o terrível aviso de Nossa Senhora de La Salette:
“Se meu povo não obedecer, eu soltarei o braço de meu Filho. Ele é muito pesado, tão pesado que não consigo mais segurá-lo... ‘Eu designei seis dias para o trabalho. O sétimo eu reservei para Mim. E ninguém quer Me dá-lo’... É isso que faz o peso do braço de meu Filho ser tão insuportável”
Conhecendo nossa própria fraqueza, dirijam-nos, portanto, a São José, pedindo sua ajuda e sua orientação na hora de guardar o Dia do Senhor:
“Ó gloriosíssimo Patriarca, São José, obtende, pedimos a Vós, de Nosso Senhor Jesus Cristo bênçãos abundantes sobre aqueles que mantêm santo os Domingos e os Dias de Preceito da Igreja e dai a todos aqueles que os profanam que possam perceber, enquanto ainda podem, o grande mal que cometem e o castigo que trazem para si mesmos tanto nesta vida quanto na próxima, e dai-lhes que se convertam. Ó fidelíssimo São José, Vós, que, durante vossa vida terrena, observastes tão lealmente as Leis de Deus, dai-nos que chegue o dia em que todos os Cristãos abster-se-ão de trabalhos proibidos nos Domingos e Dias de Preceito, preocupar-se-ão seriamente com a salvação de suas almas e darão glória a Deus, que vive e reina para sempre. Amém” (São Pio X, 20 de Maio de 1905).
Pe. Juan Carlos Iscara, FSSPX
Afabilidade é a simpatia, a virtude que nos compele a preencher nossas palavras e ações externas com aquilo que possa contribuir para tornar amigáveis e agradáveis as nossas relações com o próximo. É uma virtude eminentemente social, moralmente necessária para a existência humana, e um dos sinais mais delicados e inequívocos de um autêntico espírito cristão.
Suas manifestações são inúmeras, todas gerando a simpatia e a afeição daqueles ao nosso redor – bondade, elogios simples, indulgência, gratidão manifestada com entusiasmo, educação nas palavras e maneiras etc.
Ainda assim, como é uma virtude moral, a afabilidade sempre deve ser mantida em um meio termo justo, pois pode-se pecar contra ela por excesso (adulação) e por falta (litígio, espírito de contradição).
Adulação é o pecado daquele que tenta agradar alguém de modo desordenado ou exagerado para extrair dele alguma vantagem. No fundo, ela sempre vem acompanhada de hipocrisia e egoísmo. Ensina Santo Tomás: “Como dissemos, a amizade referida, ou afabilidade, embora tenha como fim principal causar prazer àqueles com quem convivemos, contudo, quando é necessário, para conseguir um bem ou evitar um mal, não teme contristar. Por onde, quem quer de todos os modos falar a outrem para lhe causar prazer, excede o modo devido de fazer e portanto peca por excesso. E se o fizer só com a intenção de causar prazer, chama-se complacente, segundo o Filósofo; se, porém, tirar algum proveito, chama-se lisonjeiro ou adulador. Mas, comumente, a palavra adulação costuma ser aplicada só àqueles que, excedendo o modo devido da virtude, querem agradar aos outros na convivência ordinária com palavras e obras” (IIa-IIae, 115, 1)
Ao responder à objeção de que louvar ou querer agradar a todos não é um pecado, pois São Paulo mesmo diz “eu tento agradar a todos em tudo” (1Cor 10,33), o Doutor Angélico escreve que louvar o próximo pode ser uma ação boa ou má, se certos requisitos foram observados ou negligenciados. Na verdade, se o louvor tem como intenção, observadas as circunstâncias corretas, de satisfazer a alguém e encorajá-lo em sua obra e encorajá-lo nos propósitos de suas boas obras, é o fruto da virtude da afabilidade. Ao invés, ela é adulação quando o louvor se direciona a algo que não deveria ser louvado, seja porque é uma coisa má ou pecaminosa, ou porque a fundação desse louvor não é clara, ou quando pode-se esperar que o louvor será ocasião de vanglória para o próximo. Também é bom querer agradar aos homens para os encorajá-los na caridade e para encorajar os outros no progresso na virtude. Ao contrário, é um pecado querer agradá-los por razões de vanglória, ou interesse pessoal, ou em coisas más.
Litígio, ou espírito de contradição, é um pecado que se opõe por falta à afabilidade e consiste em frequentemente e sistematicamente opor-se à opinião dos outros com a intenção de contradizê-los ou, ao menos, de não os agradar.
Se a contradição às palavras do próximo procede de falta de amor por ele, ela se opõe diretamente à caridade; se é feita com raiva, é contrária à mansidão, e se é feita com intuito de contristar o próximo ou de desagradá-lo, constitui propriamente o pecado do litígio (ou espírito de contradição), que é diretamente oposto à afabilidade.
Em si, o litígio é um pecado mais sério que a adulação, porque ele se opõe mais radicalmente à afabilidade, que, em si, tende a agradar ao invés de contristar. Porém, devemos levar em conta os motivos externos que nos impelem a cometer esses pecados. E, conforme eles, às vezes a adulação é mais grave, quando ela tenta, por exemplo, obter, por uma enganação, uma honra ou um proveito injusto. Às vezes, porém, o litígio é mais grave: por exemplo, quando a verdade é desafiada ou o próximo é desprezado ou ridicularizado (IIa-IIae, 116, 2).
Pe. Juan Carlos Iscara, FSSPX
O terceiro mandamento da Lei de Deus requer que “santifiquemos o Sábado” (Ex 20, 8). No Antigo Testamento, Deus definiu como cumprir essa obrigação, na Nova Lei, a Igreja determinou que o preceito divino deve ser cumprido pela presença na Missa aos domingos e dias santos. Isso é uma obrigação – sob pena de pecado mortal – para todo católico de sete anos ou mais, que tem o uso habitual da razão.
Para cumprir o preceito eclesiástico de assistir à Missa, a primeira condição é a presença física no lugar onde a Missa é celebrada, de modo que as ações do padre possam ser acompanhadas. Não se requer, porém, que se esteja dentro da Igreja, nem mesmo que se veja ou ouça o padre. Basta fazer parte daqueles que ouvem a Missa (p.ex., da sacristia ou de uma Capela lateral, ou atrás de uma coluna, ou fora da Igreja, se ela estiver lotada) e ser capaz de segui-la de algum modo, como pelo som dos sinos ou pelos gestos dos outros presentes. Portanto, mesmo fora da Igreja, é possível assistir à Missa, desde que se esteja unido ao grupo de fiéis que estão dentro.
Na falta dessa presença física, aquele que ouve a Missa pelo rádio ou pela televisão, ou via streaming online, ou que permanece tão longe do grupo de presentes que não pode ser considerado parte deles, este não cumpre o preceito.
Essa presença deve ser contínua durante toda a Missa. A Missa deve ser completa e inteira, isto é, deve-se estar fisicamente presente do começo ao fim, do primeiro sinal da Cruz até o último Evangelho. Se alguém voluntariamente, de propósito ou por negligência culpável, omite alguma parte notável dela, comete um pecado.
Para determinar qual parte é considerada notável e, portanto, a gravidade do pecado, é necessário levar em conta a dignidade das partes que se perdeu e a duração da ausência.
A essência do Sacrifício consiste na consagração dupla, completada pela comunhão do padre, quando a vítima é consumada. Portanto, quem chega na Missa após a dupla consagração ou vai embora antes da comunhão do celebrante, definitivamente faltou à Missa e deve ir a outra Missa para cumprir o preceito. Se não fizer isso, comete um pecado grave.
Por outro lado, é um pecado venial perder, de maneira culpável, uma parte não essencial da Missa (por exemplo, do começo até o princípio do Ofertório, ou tudo que se segue após a Comunhão, ou do prefácio até a consagração, ou da consagração até o Pater Noster). Aquele que chega atrasado na Missa deve suprir a parte que perdeu, a não ser que seja material ou moralmente impossível (por exemplo, porque é a última Missa, ou porque deve estar ausente por força maior).
O cumprimento do preceito também requer a atenção religiosa, devota da mente. Atenção é a aplicação da mente ao que está sendo feito. Pode ser interna ou externa, dependendo de onde a mente está fixada ou aplicada à ação sendo realizada, ou evita qualquer ação externa que possa atrapalhar a atenção interna.
Para ouvir validamente a Missa, ao menos uma atenção real externa é necessária. Portanto, não está prestando atenção aquele que não ouve a Missa porque está lendo um livro profano, ou porque conversa demais com o próximo, ou porque contempla atentamente as imagens ou a arquitetura do templo, ou porque dorme.
Uma certa atenção interior, ou presença da mente, é necessária para que isso seja um ato verdadeiramente humano e não apenas uma simples presença física. A atenção interior pode ser: a) material, isto é, às palavras e ações do Padre; b) literal, isto é, ao sentido dessas palavras e ações e c) espiritual ou mística, realizando atos de amor a Deus ou recitando orações piedosas (p.ex., o terço). Qualquer delas basta para cumprir o preceito piedosamente.
Os teólogos morais já debateram a questão de se aquele que se confessa cumpre o preceito. Alguns dizem que não, porque a confissão requer toda a atenção do penitente, até mesmo a atenção externa. Outros dizem que sim, desde que se tenha a intenção de assistir à Missa e participar dela o quanto seja possível. Na prática, essa segunda opinião pode ser seguida, especialmente se fosse muito penoso ao penitente esperar pelo fim da Missa, ou se houvesse um perigo de não poder receber a Comunhão, etc, pois, indubitavelmente, a intenção da Igreja é facilitar a frequência aos sacramentos para os fiéis, e não é totalmente impossível prestar alguma atenção à Santa Missa durante a confissão. Seria apropriado, porém, interromper a confissão durante a consagração das duas espécies, permanecendo recolhido e atento ao mesmo tempo.

Irmãs da Fraternidade Sacerdotal São Pio X
«Ó Mamãe, não posso dizer o quanto eu te amo!» Que mãe não se emocionaria ao ouvir essas palavras balbuciadas por sua filhinha de quatro anos? É assim que a criança mostra sua gratidão. É claro que a grandeza do sacrifício materno e do seu grande amor permanece parcialmente oculta. Mas a criança, mesmo pequenina, percebe o amor no coração de sua mamãe. Ele vê — antes, ele sabe — que sua mãe está sempre presente para ele. Se ele cai enquanto brinca: é para a mãe que corre. Se sua noite é interrompida por pesadelos: seu choro é pela mamãe. Se está com sede ou doente: não tem nem de pensar, ele sabe que sua mãe irá ajudá-lo.
Sim, mesmo aos olhos das criancinhas, o coração materno é necessário e sem limites. À sua maneira, procura retribuir demostrando o seu amor. Ela colhe flores com muito carinho para oferecê-las à mamãe! «Se o papai faz, eu também posso fazer isso pela mamãe». Se sua mãe está doente ou cansada, a criança se aproxima com um copo d'água, acompanhando seu gesto com um beijo. «Mamãe faz assim quando estou doente, também vou fazer»
Vocês sabem bem, queridas mães, que seu filho tem outra mãe, a do próprio Deus. O vosso grande desejo é que ele conheça esta Mãe por excelência que, sem estar visivelmente presente em casa, dá todo o seu carinho maternal a cada um dos seus filhos. Em face das inevitáveis separações aqui embaixo entre mãe e filho, que consolo saber que esta mesma Mãe lhes assistirá!
Como pôr em prática essa verdade, como tornar a nossa Mãe Celeste conhecida e amada pelas crianças? Ainda tão pequenino, é ele capaz de entender?
fotos e buquês
Desde cedo, os ouvidos do pequeno ouvem o que mamãe e papai falam. O bebê reconhece rapidamente a voz de seus pais e não demora muito para reconhecer os rostos ao seu redor. Não falamos com ele antes mesmo que saiba balbuciar “mamãe”...”papai”? Esses nomes lhe são repetidos muitas vezes antes do dia em que os pronunciará. Por que não adicionar os Santos Nomes de “Jesus” e de “Maria” à lista das primeiras palavras? Aproveite para mostrar-lhe imagens dos membros da sua família celestial: ele logo os reconhecerá.
Em cada etapa do despertar de sua alma, há ocasiões para apresentar canções, belas histórias ou livrinhos que lhe falem da Virgem Maria. Além disso, se as estátuas ou imagens da Santíssima Virgem ocuparem lugar de honra na sala de estar, a criança naturalmente dirigirá seus pensamentos para a rainha da família. Cada palavra, cada ação que procede do amor do papai e da mamãe pela Santíssima Virgem não será ignorada. Ao contrário, a criança batizada considera tudo isso normal e o imita.
São inúmeras as ocasiões para mover o coração dos pequeninos: mamãe coloca o buquê que papai ou que a criança lhe deu diante da imagem da Virgem; Papai vai rezar em frente da estátua de Maria depois da missa dominical; toda a família vai à procissão de 15 de agosto ou às cerimônias em honra da Virgem Peregrina.
E o terço... Com que idade pode ser introduzido? Como fazê-lo? É pedir demais para as crianças? Pensemos nisso.
O terço dos pequeninos
O terço consiste nas orações fundamentais que todo católico deve saber de cor. Que melhor maneira para uma criança aprender essas orações do que as repetir enquanto reza o Rosário?
A criança nunca é jovem demais para começar a fazer suas orações da manhã e da noite e para se habituar a voltar seus pensamentos para Deus muitas vezes ao longo do dia. O terço rezado em família só pode ajudá-la a fazê-lo.
Assim que percebermos que a criança é capaz de aprender a Ave Maria, podemos deixá-la rezar a primeira parte de uma dezena. Claro, é preciso ter muita paciência no início, para ela dizer cada palavra com mamãe ou papai. Em um clima de encorajamento, a criança aprenderá mais rapidamente e com mais vontade.
O terço! Que lição eficaz para o pequeno ter um livro no qual acompanha a vida de Jesus e de Maria ao ritmo dos mistérios do rosário! Depois da oração, que alegria para os pequeninos se revezarem apagando a vela acesa diante da imagem da Virgem, enquanto os mais velhos levam a sério o privilégio de acendê-la antes da oração em família!
Convenhamos, o terço em família exige muito esforço no início. É preciso escolher um horário conveniente, em que todos possam participar (sem escolher um horário em que todos estejam exaustos!). Deus dá a graça de ser fiel ao terço e, pouco a pouco, ele se torna um hábito. Vinte minutos por dia, é tanto tempo assim para passar com quem realmente amamos?
Nossa Senhora, ela mesma, pediu aos três pastorzinhos de Fátima que rezassem o Rosário, e os três videntes, ainda muito jovens, já tinham o hábito de o fazer.
Por fim, admiremos a educação religiosa dada pela Sra. Vianney aos seus filhos. Ainda pequeno, o santo Cura escutava sua mamãe lhe falar sobre o Céu, sobre a Santíssima Virgem antes de dar-lhe a boa noite. Tão logo o pequeno Jean-Marie foi capaz de fazê-lo – tinha três anos – aprendeu a rezar a Ave Maria, a oração, dizia ele, que jamais cansa a Deus. Anos mais tarde diria: “A Santa Virgem é a minha afeição mais antiga; eu a amei antes mesmo de conhecê-la... Depois de Deus, foi obra da minha mãe, quanta sabedoria ela tinha!”
Fideliter n° 191 – setembro-outubro, 2009
As considerações anteriores mostraram que a Mãe de Deus não apenas era virgem antes, durante e após o nascimento de seu Filho Jesus Cristo, mas que fez um voto de castidade por inspiração do Espírito Santo. Nessas condições, é natural indagar-se se deveria ter um marido.
Na verdade, o Arcanjo Gabriel foi enviado "a uma virgem desposada por um homem cujo nome era José, da Casa de Davi" (Lc 1,27). Esse detalhe, expressamente descrito na Sagrada Escritura, bem como nos relatos do Evangelho, mostra a vontade de Deus nesse ponto. Mas os Padres e teólogos questionaram o que motivou o plano divino. Santo Tomás resume a questão com sua clareza habitual.
Em consideração com a Encarnação do Filho de Deus
O Verbo assumiu a natureza humana em todos os seus aspectos, com exceção daquilo que seria contrário a Sua dignidade; ele, portanto, tinha vida social e, em primeiro lugar, vida familiar: por isso Ele nasceu em uma família.
Era igualmente importante que o Messias não fosse rejeitado como um filho ilegítimo: "Não é este Jesus, o filho de José, cujo pai e mãe conhecemos?" (Jo 6,42).
A filiação era essencial para os judeus do Antigo Testamento. Isso pode ser observado nas genealogias que a Sagrada Escritura faz até mesmo no Evangelho. Mas ela deve ser realizada, de acordo com o costume, pela linha paterna.
Finalmente, Deus quis que a divina criança tivesse um protetor e um pai. O papel de pai consiste, no plano especial da Redenção, dar ao Verbo Encarnado a possibilidade de levar uma vida oculta.
Em consideração com a Mãe de Deus
Uma jovem que falhasse no cumprimento de seus deveres era apenada com apedrejamento. O nascimento de Cristo na Sagrada Família fez essa ameaça desaparecer.
E, presumindo que essa pena não fosse aplicada, o nascimento de Jesus protegeu Maria da infâmia de ser uma mãe solteira. A desonra, ainda que aparente, teria passado, de alguma maneira, para o Filho de Deus.
Finalmente, esse casamento assegurou à Santíssima Virgem o auxílio de São José. E sabemos quão precioso esse auxílio foi depois.
Em consideração com os homens
Os costumes judeus não permitiriam que uma mulher não se casasse, devido às regras de transmissão da herança e ao dever de gerar o povo de Israel. De fato, para evitar a passagem de uma porção da herança a outra tribo, as mulheres se casavam dentro de sua tribo.
O testemunho de São José eloquentemente confirma a concepção virginal do Salvador. De fato, era incumbência dele denunciar o adultério. Essa hesitação de José mostra a virtude da Virgem Maria.
O testemunho de Maria afirmando sua virgindade, porém, tem maior autoridade. Se a Virgem diz que foi concebida sem perder sua virgindade, seu testemunho é digno de maior confiança sendo ela casada que solteira.
Também era necessário que a Mãe de Deus fosse um exemplo às jovens. Se ela tivesse concebido carnalmente sem ser casada, sua reputação poderia ser -- erroneamente -- maculada. A concepção virginal de uma mulher casada protege sua reputação e serve de exemplo a todas as mulheres.
Desse modo, a Virgem se torna uma maravilhosa imagem da Igreja Católica: ela é virgem, esposa e mãe.
Finalmente, em Maria, a virgindade e o casamento estão honrados na mesma pessoa: assim, a dignidade desses dois estados é garantida.
Nossa Senhora preservou sua virgindade por toda sua vida. Os Padres da Igreja se indagaram se Maria fez um voto de virgindade. Santo Tomás resume seus pensamentos sobre essa questão.
O ponto de partida dessa reflexão é a resposta de Maria ao Arcanjo Gabriel, que anunciou sua maternidade: "Como isso se dará, se não conheço homem?" (Lc 1,26). Para compreender adequadamente essa resposta, devemos lembrar que o verbo "conhecer" é empregado pela Sagrada Escritura para se referir a relações carnais.
Como a Virgem Maria estava noiva de São José -- noivado esse que, entre os judeus do Antigo Testamento, praticamente equivalia a um casamento -- essa pergunta significa que Nossa Senhora tinha a intenção de preservar sua virgindade em espírito de consagração a Deus.
É assim que Santo Agostinho compreende a passagem: "Na anunciação do Anjo, Maria responde: 'Como isso se dará, se não conheço homem?' Resposta essa que ela, certamente, não teria dado se ela não tivesse consagrado sua virgindade a Deus previamente" (De Sancta Virginitate, citada por Santo Tomás). Muitos Padres seguem Santo Agostinho.
A bela explicação do Doutor Comum
Ao expor a adequação desse voto, Santo Tomás aplica o princípio da atribuição de privilégios: é necessário presumir o mais perfeito possível na Santíssima Virgem; ora, a virgindade consagrada pelo voto é mais perfeita que a virgindade não consagrada. Então ela fez esse voto.
O Doutor Angélico, em outra passagem, explica que "o que é feito pelo voto se torna mais perfeito. Mas o principal fim do voto é fortalecer a vontade no bem". Ele também diz que a "uma vontade já santificada como a de Nossa Senhora, que goza de perfeita virtude, não é útil fazer muitos votos".
Portanto ele se indaga: "Por que o voto de virgindade, se a prática da castidade perfeita já era suficiente?" A resposta é clara e belíssima: "porque ele [o voto] fixa um estado de vida", para que, nesse voto, possa-se doar a própria vida.
Ele prossegue: "Se o comparamos [o voto de castidade] com os outros votos de religião, o de obediência é suficientemente substituído pelo casamento sob a autoridade de São José, e o voto de pobreza não é prudente para uma mãe de família"
Porém, ele observa que as regras sociais da época não aceitariam que uma mulher não se casasse, porque todos os membros do povo escolhido eram obrigados a participar da propagação da espécie. Então ele crê, com alguns Padres, que a Virgem, primeiramente, noivou com São José, e então, de mútuo acordo, ambos fizeram voto de castidade.
Mas também é possível, de acordo com outros autores, que o acordo de José e Maria aconteceu antes do noivado, e que eles fizeram o voto antes de se casarem.
O Cardeal Caetano -- um grande comentador de Santo Tomás -- acrescenta: "Não é natural que creiamos que esse Santo marido, ao aceitar que sua esposa dedicasse sua virgindade a Deus na constância do casamento, fez ele mesmo esse voto?"
É necessário levar em conta ainda, acima de tudo, a Divina Providência, que teria que inspirar José com essa resolução, para que a Santíssima Virgem tivesse, como companhia e guardião, um esposo que fosse também virgem. Além disso, Maria não seria "cheia de graça" se essa graça, que ela desejava acima de tudo em sua santidade, estivesse ausente em seu marido.
Portanto, a Virgem Maria, de acordo com a opinião comum, foi a primeira a fazer o voto de castidade de acordo com o tempo e de acordo com a perfeição do ato.